Revista explora o universo de Guimarães Rosa

Nova edição da “Revista do IEB” analisa diferentes temas e aspectos da obra do escritor mineiro

 06/05/2020 - Publicado há 4 anos
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Datalhe da capa da nova Revista do IEB, que está disponível na íntegra, gratuitamente, na internet (foto da primeira viagem etnográfica promovida por Mário de Andrade, feita na Paraíba em 1927) – Foto: Arquivo IEB/USP – Fundo Mário de Andrade

No editorial De Rosa aos Rolês: Itinerários Críticos, os professores Fernando Paixão, Luiz Armando Bagolin e Monica Duarte Dantas apresentam a nova edição – de número 75 – da Revista do IEB, publicação do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, que acaba de ser lançada. Eles afirmam que o novo número reúne um conjunto “impressionante” de artigos, não só pela qualidade dos textos, como também pela diversidade de abordagens, inovadoras tanto no sentido dos temas como de leituras e interpretações de diferentes autores. O destaque é o universo do escritor mineiro Guimarães Rosa (1908-1967), que, no sentido mais amplo possível, é recuperado e revisto a partir de diferentes olhares e saberes, como afirmam.

A revista abre com o texto Receitas para o Amor, por Aracy e João Guimarães Rosa, de Tânia Biazioli, doutora em Psicologia Social pela USP. No artigo, Tânia analisa os cadernos de receitas culinárias da esposa do escritor, Aracy,  mantidos no acervo de Rosa no IEB, e o romance Noites do Sertão, de Rosa, entremeados pela relação do casal. “Descobrimos um convite das receitas para o amor, que aparece tanto nos nomes de doces quanto nos romances de Noites do Sertão”, comenta a autora.

Do acervo de Mário de Andrade do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP: Santarém (PA), em 31 maio de 1927 – Foto: Arquivo IEB/USP – Fundo Mário de Andrade

No artigo Ambivalências Humanas e Não Humanas em Meu tio o Iauaretê, de Guimarães Rosa, Gustavo de Castro e Silva, professor da Universidade de Brasília (UnB), e Vanessa Daniele de Moraes, doutora em Estética da Comunicação por aquela universidade, exploram a noção de limite e análise de mitologias que abordam o humano e o animal. A análise, segundo escrevem, pretende circunscrever a presença da cultura indígena latino-americana e dessa mitologia no conto de Guimarães Rosa.

A obra máxima de Rosa, Grande Sertão: Veredas, é tema do artigo de Klaus Eggensperger, professor de Estudos Culturais e Literários da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e Willian Dolberth, mestrando do Programa de Pós-Graduação em Letras da mesma universidade. O trabalho se propõe a inventariar as aves citadas no romance, classificando seus usos e traçando um panorama do processo criativo que as levou até as páginas do livro. “Para um observador de aves, a leitura de Grande Sertão: Veredas representa uma experiência análoga ao caminhar num território silvestre. Em meio a um diálogo ou no devaneio de uma travessia, é possível que uma vocalização furtiva arrebate completamente a atenção”, escrevem os autores. Entre as muitas aves que aparecem na obra estão acauã, anu-branco, araraúna, caboré, codorniz, garnizé, galinha-d’angola, garça-rosada, gavião-andorim, joão-de-barro, macuco, mergulhão e perdiz.

 

Clarice e Suassuna

Maloca no Peru, em 1927 – Foto: Arquivo IEB/USP – Fundo Mário de Andrade

A nova edição da Revista do IEB trata ainda de outros escritores. Sereias: Sedução e Saber, de Adelia Bezerra de Meneses, professora do Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, é uma instigante releitura do romance Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, de Clarice Lispector (1993), em contraponto com a Odisseia, de Homero, mas também com textos bíblicos, em particular do Gênesis. Já em No Lugar dos Pastores: Sobre Algumas Obras Esparsas de Ariano Suassuna, o professor Fábio José Santos de Oliveira, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), recupera uma faceta menos conhecida do escritor paraibano, a de artista plástico, com destaque para suas iluminogravuras, inspiradas nas iluminuras medievais.

A música é assunto de Um Oásis num Sistema Poluído: Rock e Mediações Cosmopolitas no Recife dos Anos 1970 e 1980, de Amilcar Almeida Bezerra e Daniela Maria Ferreira, professores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Os autores se valem de depoimentos de agentes pioneiros na criação de festivais e lojas especializadas em rock em Pernambuco para reconstruir uma rede de sociabilidade em torno desse gênero musical nos anos 1970, destacando a figura de Humberto Brito, distribuidor informal de lançamentos importados raros na cidade.

Mercado de Ver-o-Peso, Belém (PA), 1927 – Foto: Mário Raul de Moraes Andrade – Foto: Arquivo IEB/USP – Fundo Mário de Andrade

A Crítica Engajada de Paulo Emílio: Cinema, Subdesenvolvimento e seus Impasses, de Mauricio Cardoso, do Departamento de História da FFLCH, e Leandro Rocha Saraiva, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), propõe uma análise dos debates em torno da noção de subdesenvolvimento no campo cultural brasileiro, nos anos 1960 e 1970, a partir do ensaio Cinema: Trajetória no Subdesenvolvimento (1973), de Paulo Emílio Sales Gomes. Segundo os autores, enquanto Paulo Emílio via o subdesenvolvimento como estrutura a ser superada pelo campo cinematográfico, o cineasta Glauber Rocha, o crítico literário Antonio Candido e o poeta Ferreira Gullar recorriam ao conceito para expressar as precariedades estéticas da produção cultural do País.

Ainda na nova edição da Revista do IEB estão os artigos Tradição e Revolução: Mário de Andrade e o Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, resultado do pós-doutorado de Pedro Fragelli no IEB, e Os “Rolês” do Movimento Negro Brasileiro na Atualidade, nas “Pegadas” da Educação, de Amilcar Araujo Pereira, Jorge Lucas Maia e Thayara Cristine Silva de Lima, a partir da pesquisa Movimento negro na atualidade. Há ainda duas resenhas de Aspectos do Folclore Brasileiro, de Mário de Andrade (Global Editora, 2019), obra inédita, com a coordenação de Telê Ancona Lopez e estabelecimento do texto, apresentação e notas de Angela Teodoro Grillo.

A Revista do IEB, número 75, pode ser acessada neste link.


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