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Os distúrbios da fala são um dos principais comprometimentos em pessoas com fissura labiopalatina. Nascida com essa condição, Letícia Nascimento Campagna, de Vitória, no Espírito Santo, viveu uma trajetória de 19 anos no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC) da USP até chegar a ser estudante do curso de Medicina.
Vinda de Vitória, no Espírito Santo, a família Campagna iniciou o tratamento quando Letícia tinha apenas três meses de vida. A garota foi submetida a duas cirurgias no palato, mas permaneceu com alteração de fala mesmo após operada. Mediante o problema, ela recebeu, aos 6 anos de idade, a prótese de palato, um tipo de prótese intrabucal removível que tem a função de atuar dinâmica e funcionalmente em interação com a musculatura do palato e da faringe com o objetivo de melhora na função da fala.
A alteração de fala fez com que a capixaba conseguisse falar “mamãe” e “papai” corretamente somente aos 6 anos de idade, após um longo e intenso processo de reabilitação. “Ela tinha extrema dificuldade com os sons que necessitam de pressão na boca, apresentando muitos ‘soquinhos’ e ‘raspadinhas’ durante a fala, além de hipernasalidade, popularmente conhecida como fala fanhosa”, explica Giovana Rinalde Brandão, uma das fonoaudiólogas que atenderam Letícia durante o processo de reabilitação.
A partir das cirurgias no palato, Letícia passou a realizar fonoterapia intensiva no HRAC. Entre os anos de 2008 e 2011, a garota foi submetida a cinco módulos de fonoterapia intensiva, uma vez por semestre, e permanecia com o pai ou a mãe por cerca de 30 dias em Bauru, para sessões diárias de fonoterapia.
“Eu e minha mulher nos revezávamos para trazer nossa filha, durante nossas férias. Nos meses que passávamos em Bauru, além das sessões diárias e exercícios extras, a Letícia também estudava o conteúdo da escola, e nunca repetiu de ano. Em Vitória, ela também fez fonoterapia quatro vezes por semana, durante dois anos”, recorda o técnico em química Edmar Augusto Campagna Filho, de 59 anos, pai de Letícia.
“Era impressionante ver a determinação desse casal em busca da melhora da fala da filha, sendo fundamental o envolvimento da família nessa reabilitação”, ressalta a fonoaudióloga Giovana Brandão.

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Esse tratamento possibilitou que Letícia realizasse, aos 9 anos de idade, uma cirurgia para a correção da insuficiência velofaríngea, chamada faringoplastia, que substituiu a função da prótese de palato, a qual a garota utilizou durante todo o processo de fonoterapia intensiva no HRAC. “Essa cirurgia também mudou a minha vida, fiquei com o céu da boca e a fala perfeita. Os novos professores nem imaginavam que eu tive problemas na fala”, relata Letícia.
A relação próxima e frequente com profissionais da saúde e com o ambiente hospitalar também influenciou a escolha da carreira da jovem. “Após a graduação, quero me especializar e atuar em área relacionada ao desenvolvimento da fala”, afirma Letícia, que está prestes a iniciar o primeiro período de Medicina em Vitória.
“Certa vez, em Bauru, ela chegou triste perto de mim, talvez cansada com toda essa rotina e sacrifício, e me perguntou: ‘Papai, por que esse problema comigo?’. E então respondi: ‘Quem sabe papai do céu quer te mostrar algo, uma profissão para você seguir quando for adulta’. E a Letícia reagiu de forma muito positiva”, relembra o pai da jovem.
A visita surpresa de Letícia ao HRAC no último mês de junho – com o intuito de rever suas fonoaudiólogas e agradecer a toda a equipe – mostrou, mais uma vez, o grande diferencial do trabalho interdisciplinar e humanizado realizado pelos profissionais do hospital. A vitória de Letícia evidencia, ainda, a importância do apoio e empenho da família para bons resultados no tratamento, o que pode ser inspiração para muitos.
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Texto adaptado de Tiago Rodella, da Assessoria de Imprensa do HRAC
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