
Apartamentos “tamanho família” ficaram no passado. A moda agora é um quarto, um banheiro, cozinha integrada com a sala e, com sorte, uma varanda para duas cadeiras e uma mesinha pequena. Para quem tem família grande, encontrar um lugar que comporte todo mundo pode estar sendo uma tarefa bem mais complicada do que outrora. Um levantamento da equipe de redação do jornal Valor Econômico, com dados do Banco Central cruzados com a Caixa Econômica Federal, aponta um encolhimento de 12,75% na metragem da média dos imóveis financiados desde 2018. Não só a procura, mas a oferta de imóveis menores aumentou nos últimos anos.
O gráfico acima mostra, em porcentagens, a quantidade de imóveis vendidos nos últimos anos em São Paulo, por tamanho. A mancha verde escura representa os empreendimentos abaixo dos 45 metros quadrados, que, em 2024, representavam cerca de 80% dos imóveis.
O professor João Meyer, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, explica que existe uma série de fatores que estão relacionados a essa tendência. Dentre eles, o especialista destaca a diminuição do tamanho da estrutura familiar, o financiamento público para habitação social, a procura de imóveis para fazer renda e a relação dos juros com o mercado imobiliário.
“Somente o primeiro ponto nos daria uma conversa inteira”, afirma Meyer. “O tamanho da família está diminuindo. O número de pessoas por domicílio, entre 2006 e 2010, diminuiu meia pessoa por domicílio. Alteração da estrutura da família, menos filhos, pessoas que são mais idosas, pessoas que não se casam, vivem sozinhas, representam uma mudança grande no perfil demográfico do País”, explica.
Segundo a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), em 2012, os chamados domicílios unipessoais eram 12,2% e, em 2023, passaram a representar 18% do total, quase um a cada cinco lares do País. Paralelamente, os domicílios compartilhados por famílias diminuíram, passando de 68,3% para 65,9% no mesmo período.
O incentivo governamental para moradias voltadas à população de baixa renda também é um fator importante nessa transformação. Meyer destaca que o programa Minha Casa Minha Vida possibilitou a entrada de um público que antes não tinha acesso ao mercado formal de habitação. Isso gerou um aumento na oferta de unidades menores, especialmente em regiões periféricas. Além disso, a Lei de Habitação de Interesse Social (HIS), implementada em São Paulo a partir de 2017, incentivou a construção de moradias menores ao permitir que esses empreendimentos tivessem uma área 50% maior do que outras construções, atraindo o interesse de incorporadoras.

Outro fator determinante para o encolhimento dos imóveis é a relação entre juros e mercado imobiliário. “Quando os juros estão altos, a produção para a classe média é inviabilizada, pois o financiamento fica muito caro. No entanto, o Minha Casa Minha Vida não sofre tanto impacto, pois utiliza recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que não são diretamente influenciados pelo mercado financeiro”, detalha Meyer.
Ele também aponta que a busca por imóveis como forma de investimento tem impulsionado a construção de apartamentos pequenos. Durante a pandemia, por exemplo, a taxa de juros caiu para 2%, tornando aplicações financeiras pouco atrativas. Como resultado, muitos investidores recorreram ao mercado imobiliário, adquirindo unidades compactas em regiões bem localizadas, especialmente próximas a estações de metrô, para alugar posteriormente.
Essa tendência também se reflete em cidades como Recife, onde Meyer observa que apartamentos pequenos são comuns em áreas nobres, seja para atender turistas ou um público de alta renda que busca localização privilegiada. “Famílias unipessoais cresceram muito nos últimos anos. Quem tem poder aquisitivo prefere um apartamento menor, mas bem localizado”, conclui o professor.
Atualmente, mais de 80% dos empreendimentos lançados em São Paulo possuem menos de 42 metros quadrados, evidenciando uma nova realidade no mercado imobiliário brasileiro. O cenário aponta para um futuro onde os espaços compactos, otimizados e bem localizados serão cada vez mais a norma.
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
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