A preocupação com a relação entre corrupção e crimes ambientais tem ganhado destaque, especialmente após discussões em eventos como o G20. Atividades como desmatamento, mineração ilegal e tráfico de fauna silvestre compõem um mercado ilegal de milhões de dólares, prejudicando ecossistemas inteiros. O especialista e professor Sérgio Salomão Shecaira, do Departamento de Direito Penal da Faculdade de Direito (FD) da USP, explica que, embora essa relação entre corrupção e destruição ambiental não seja nova, ela tem despertado cada vez mais atenção e pressão internacional.
“Temos notado que grande parte das ofensas ambientais que ocorrem em países periféricos, como o Brasil, se relaciona ao enriquecimento empresarial”, afirma o professor. Ele destaca que a corrupção se associa a crimes ambientais em esquemas complexos que envolvem empresas e organizações, buscando explorar ao máximo os recursos naturais.
“Ecocídio”
A União Europeia deu um passo importante ao tipificar o chamado “ecocídio”, um crime que abrange destruição ambiental em massa. “A Bélgica é o país que saiu na frente na União Europeia. Ela já estabeleceu uma punição para isso. Inclusive, essa figura do ecocídio vai estar no plano interno dos países europeus, mas pretende se levar para o plano internacional, o que seria uma espécie de crime contra a humanidade”, explica. Ele acrescenta que essa diretiva exige que todos os países-membros da União Europeia adaptem suas legislações para incluir punições mais rigorosas contra crimes ambientais.
Segundo Shecaira, essa movimentação tem grande repercussão no Brasil, onde a questão ambiental está constantemente no foco de debates, especialmente devido à Amazônia. “A presidência do G20 coloca o Brasil em foco, ainda mais diante das queimadas recentes, que atingiram não só a Amazônia, mas também o Estado de São Paulo. É um cenário que reforça a necessidade de medidas mais rígidas”, comenta.
O Brasil já possui leis ambientais, como a Lei 9.605/98, mas elas são insuficientes para lidar com crimes de grande escala. O especialista discorre sobre como a inclusão do ecocídio na legislação brasileira seria um avanço importante, permitindo que o País acompanhe os padrões internacionais. “Portanto, a gente já tem uma estrutura normativa que permite uma resposta rápida. Claro que a gente tem que mudar a lei ambiental, precisa ter o ecocídio na nossa lei ambiental, o que seria, aí sim, um grande avanço”, afirma.
Culpar os responsáveis
Além disso, o professor ressalta a importância de responsabilizar empresas envolvidas nesses crimes. “Uma das primeiras diretivas ou normas obrigatórias, normas cogentes da União Europeia, foi aquela que mandava responsabilizar criminalmente as empresas por ofensas ambientais. E o Brasil só tem a responsabilidade penal das pessoas jurídicas”, explica.
O tráfico de fauna silvestre, por exemplo, é um dos crimes mais rentáveis do mundo e representa um problema ambiental e ético grave. “Milhões de animais são retirados ilegalmente do Brasil e vendidos por preços altos no exterior. Precisamos de punições mais severas para esses crimes”, defende o docente.
Shecaira ainda alerta sobre a necessidade de adaptar o sistema jurídico brasileiro para atuar com rigor. “Esses grandes fatos criminosos dependem de uma estrutura orgânica que só se tem com as pessoas jurídicas, com as grandes corporações. E é aí que a gente tem que atingir o bolso dessas corporações”, conclui. O fortalecimento das leis ambientais no Brasil, alinhado com iniciativas internacionais, pode ser o caminho para reduzir os danos ao meio ambiente e combater a corrupção verde. Essa é uma batalha que exige compromisso global, pois o que acontece no Brasil impacta o mundo inteiro.
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