A Paralimpíada de 2024 — evento multiesportivo dirigido a atletas com deficiência — está acontecendo em Paris, mesmo palco da última Olimpíada, encerrada recentemente. Diferentemente do desempenho olímpico, em que o Brasil nunca conseguiu passar de 21 medalhas, os atletas paralímpicos brasileiros já ultrapassaram a marca de 400 medalhas totais em toda a história da competição, superando a marca das 50 medalhas nesta edição — feito que também ocorreu nas duas últimas, no Rio de Janeiro e em Tóquio.
De acordo com Michele Carbinatto, professora da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da Universidade de São Paulo, as mudanças estruturais dos paradesportos em relação aos esportes praticados nas Olimpíadas giram mais no entorno da acessibilidade. Por exemplo, esportes como o judô e o tênis não possuem diferenças em suas estruturas — mesmo tatame ou quadra —, mas outros esportes possuem pequenas adaptações, principalmente visando a uma maior acessibilidade — questão sonora para a saída dos atletas em provas de natação, estruturas de encaixe para cadeira de rodas no tênis de mesa, diminuição da altura da rede de vôlei, bolas de guizo para o futebol, plataformas para manter a coluna ereta de pessoas com deficiência no tônus muscular em provas de atletismo, entre diversos outros exemplos.
“A adaptação em relação ao olímpico é muito pouca, é muito mais no entorno, o processo, a acessibilidade, os bastidores, os vestiários. E a modalidade daí vai mudar menos nessa estrutura maior e muito mais em um ou outro equipamento. A maioria dos esportes do paradesporto diz respeito à reorganização desse esporte convencional para a pessoa com deficiência”, complementa. Uma exceção é o goalball, que não tem versão praticada por atletas sem deficiência e foi criado apenas para essa forma de modalidade — inclusive, possui um gol diferente daqueles utilizados em esportes convencionais.
Formulação das modalidades paralímpicas
Conforme Michele, cada esporte e cada categoria vai ter o seu critério de elegibilidade, que vai depender de um conjunto de testes, na intenção de aumentar o fair play e trazer um nível de competitividade. Com avaliações das habilidades físico-esportivas dentro de cada esporte, além de avaliações motoras e sensoriais, cada atleta vai possuir pontuações específicas e constantes. Esses testes, juntamente com o código do acometimento da pessoa com deficiência, vão dizer do que cada atleta é capaz e vão ajudar a dividir cada modalidade em diferentes categorias, deixando o ambiente mais justo.
“Um dos assuntos que são muito comentados na filosofia e pedagogia do esporte são esses critérios de elegibilidade, que estão sempre sendo estudados e melhorados, mas ainda assim algumas pessoas falam que isso exclui. No entanto, nada impede que, na base e na massificação, você proponha aquela prática para o maior número de pessoas e de tipos de deficiência. Tem algumas decisões para tentar dar um nível de competitividade, por isso que têm muitas categorias, é bem dividido. Você não consegue colocar na mesma prova o deficiente físico membro inferior com deficiente visual, com deficiente intelectual, enfim, cada qual vai tendo as suas particularidades”, explica. A docente explica que com equipes dentro do comitê paralímpico, federações nacionais, associações de paradesporto, todas essas características de elegibilidade dos atletas paralímpicos são analisadas.
Dificuldades de adaptação e acessibilidade
Apesar de esportes paralímpicos como a bocha, no qual se permite que pessoas mais acometidas também consigam competir, outros esportes como o rugby e o basquete, por exemplo, não permitem a prática de qualquer deficiência. Contudo, ela afirma: “Com as tecnologias que a gente tem e as empresas, eu duvido que exista algum esporte que não possa ser adaptado para a pessoa com deficiência. Claro, sempre vai depender de tipos de deficiências, mas hoje em dia todo esporte pode ser adaptado. Nós vemos o skate sendo adaptado para a pessoa com deficiência, o surf, a escalada, enfim, é só querer. Usar o trabalho da ciência e da tecnologia a nosso favor”.
Michele entende que, com auxílios tecnológicos para resolver problemas relacionados à adaptação, a grande dificuldade é a ampliação de políticas públicas, principalmente voltadas à acessibilidade como um todo, buscando infraestruturas que respeitem o direito de ir e vir da pessoa com deficiência — piso e placas táteis, rampas e bons vestiários são alguns dos exemplos ditos pela especialista.
A professora ainda cita a importância de políticas públicas de incentivo para grandes empresas e grandes redes que desenvolvem suas tecnologias. “Talvez essas questões relacionadas a imposto, importação e exportação de material sejam facilitadores para que possam desenvolver esses equipamentos dentro de cada país. Hoje, o Brasil enfrenta um grande problema que é a importação desses materiais, que os deixam mais caros. Então, nós precisávamos muito de um estímulo de empresas nacionais construindo esses materiais”, conclui.
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
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