Como a Igreja Católica lidou com a questão da escravatura? Este será um dos principais temas de discussão no seminário Escravidão do Corpo e Escravidão da Alma: Igreja, Poder Político e Escravidão entre Atlântico e Mediterrâneo, que acontece nesta quinta e sexta-feira, dias 11 e 12, das 9 às 17 horas, no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP. A entrada é grátis, mas é preciso fazer inscrição.
A ideia é pensar como a Igreja nasce em um contexto em que já havia a escravidão, e como ela acabou por aceitá-la e integrá-la em sua doutrina e instituições, conta o professor Carlos Zeron, diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP, que fará palestra no evento. “A Igreja se acomodou à escravidão e acabou legitimando-a. A nossa interrogação, nesse seminário, é sobre como esse processo se deu”, complementa Zeron.
Escravidão do corpo e da alma
Zeron explica que para compreender o ponto de partida da discussão, tematizado no título do evento, é necessário relembrar o teólogo e filósofo cristão Santo Agostinho (354-430). Em Cidade de Deus – uma de suas principais obras -, ele faz uma dissociação quando diz que “a escravidão do corpo não implica a escravidão da alma”. Ou seja, a Igreja podia se preocupar com a salvação da alma das pessoas independentemente da sua condição, livre ou escrava.
“Essa dissociação permite que a religião conviva com a escravidão sem que isso cause um problema do ponto de vista da doutrina e da finalidade da Igreja, que é a salvação da alma dos homens”, complementa Zeron. A proposta do simpósio, diz, é analisar como essa questão evoluiu historicamente e quais suas consequências no mundo moderno.
Segundo a professora Marina Massimi, coordenadora do Grupo de Pesquisa Tempo, Memória e Pertencimento do IEA, que organiza o evento, o objetivo é resgatar a memória e patrimônio documental e monumental da cultura brasileira e da sociedade no geral. “A nossa atenção é ajudar para que a consciência dessa história possa formar o presente e, é claro, as futuras gerações, a partir da avaliação de que há um descaso e sucateamento dessa memória e patrimônio”, conta Marina.
A dinâmica do colóquio se dará através de exposições por parte de professores especialistas de diversas áreas, seguidas de debates. A primeira exposição ficará por conta do professor Carlos Zeron, intitulada Os Tratados Teológico-Jurídicos nos Contextos Coloniais. Nela, ele pretende analisar alguns textos do padre Antônio Vieira (1608-1697) que discorrem sobre o que sucedeu na Serra de Ibiapaba, na atual fronteira entre Piauí e Ceará, onde os portugueses não conseguiram submeter a população indígena que ali vivia.
Já a professora Marina Massimi apresentará a exposição Léxico sobre a Escravidão Sermonística Brasileira entre os séculos 16 e 17, baseado em sua linha de pesquisa. “Muitos anos atrás eu fiz um levantamento dos pregadores e dos sermões pregados no Brasil, reuni todas as expressões e termos que se referiam à questão da escravatura, e analisei como eles eram usados pelos pregadores. A busca era entender se havia uma coerência entre a posição teológica sobre essa questão e a prática da ordem religiosa”, explica Marina.
O evento contará ainda com a participação dos professores Alcir Pécora e Camila Dias, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Caio César Boschi, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Minas Gerais, e Emanuele Colombo, da Universidade DePaul, de Chicago, nos Estados Unidos.
O seminário Escravidão do Corpo e Escravidão da Alma: Igreja, Poder Político e Escravidão entre Atlântico e Mediterrâneo acontece nesta quinta e sexta-feira, dias 11 e 12 de abril, das 9 às 17 horas, na Sala Alfredo Bosi do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP (Rua da Praça do Relógio, 109, Cidade Universitária, em São Paulo). Entrada grátis. As inscrições devem ser feitas neste link. Haverá transmissão ao vivo. Mais informações aqui.