![Detalhe do cravo italiano doado à USP - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/20160610_cravos_int_1.jpg)
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Ouvir os prelúdios e fugas de O Cravo Bem Temperado, de Johann Sebastian Bach, e a Sonata Número 3 de George F. Händel, entre outras composições executadas à moda do século 18, é a harmonia que a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin propõe em uma série especial de concertos que se estende ao longo do ano. A programação será apresentada duas vezes por mês, sempre às quintas-feiras ao meio dia. Oportunidade gratuita para sentir a leveza do som do cravo de Sérgio Carvalho, da viola da gamba de Abel Vargas e da flauta transversal de Shen Ribeiro, que integram o Trio Sonare. A proposta desses e de outros músicos é resgatar o barroco em sua estética, composição e essência musical.
![Trio Sonare, Sergio Carvalho (cravista), Shen Ribeiro (flautista) e Abel Vargas (viola de gamba) - Foto: Cecília Bastos/USP Imagem](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/20160610_cravos_int_4.jpg)
“A programação, com uma série de 12 concertos, foi aberta em maio e segue até o final do ano na sala de música da Biblioteca Brasiliana”, convida o pianista Sérgio Carvalho, cravista colaborador do Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e professor do Coral da USP (Coralusp). “Faremos duas apresentações mensais, com intérpretes que se dedicam à música antiga”, informa Carvalho, que é o curador da programação.
A dedicação, no entanto, não traz de volta apenas o som. O movimento do dedilhar ágil das teclas de um cravo exige destreza e leveza. O braço e as mãos não pesam como no dedilhar de um piano. São as mãos sensíveis do músico e luthier Abel Vargas que fabricam artesanalmente os cravos brasileiros. Há, no País, poucos artesãos especializados como ele. “Entre os seis que existem na USP, dois foram confeccionados por ele.”
Artesãos e músicos
O primeiro construtor de cravos no Brasil foi o regente carioca Roberto de Regina. Hoje, com 89 anos, é considerado um dos precursores do cravo no Brasil e alia o trabalho de artesão, músico e médico. Formou o primeiro grupo de música antiga e tem 26 álbuns e cinco DVDs gravados. Além dele e de Vargas, destacam-se Hidetoshi Arakawa, William Takahashi, Manuel Inácio Valcacer, Agostinho Rodrigues Leite, César Ghidini e Maren Machado. Todas as peças são construídas a partir dos modelos históricos europeus, especialmente os alemães e italianos.
![](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/20160610_cravos_int_3.jpg)
Vargas conta que leva três meses para fazer um cravo. É um autodidata que começou o ofício no final da década de 1970, montando o instrumento com um kit comprado nos Estados Unidos “É preciso escolher as madeiras apropriadas e o projeto de um desenho certo. Importante estar afinado na sua construção. Há quem diga que as madeiras brasileiras não são boas no tampo sonoro. Mas eu acho que é preconceito. Trabalho com a madeira chamada caixeta ou marupá, utilizada já nos instrumentos feitos pelos índios. É macia, leve e resistente.”
Vargas lembra que Bach só usava os cravos construídos pelo alemão Mietke. O artesão desenvolve pesquisas para escolher o projeto que se aproxima ao dos cravos originais do século 18. Um rigor que resulta na perfeição sonora.
Incentivo aos alunos
Em 2014, na tentativa de propiciar o ensino da música antiga, sob a organização da professora Mônica Lucas, o Departamento de Música da ECA adquiriu três novos cravos. “Essa aquisição está permitindo a formação de um grupo de música antiga e despertando o interesse de muitos alunos”, esclarece Carvalho. “Quando falo em música antiga, eu me refiro às composições dos séculos 17 e 18, que vem despertando adeptos e têm uma pesquisa muito avançada em toda a Europa. Creio que o Brasil, nesse sentido, não pode ficar de fora.”
Um dos instrumentos dessa aquisição é de autoria de Abel Vargas. O artesão e músico confeccionou um cravo modelo alemão com dois teclados e três grupos de cordas. Foi elaborado a partir do modelo do alemão Christian Zell, da década de 1730, artesão que, por sua vez, aprendeu o ofício com Mietke, luthier preferido de Bach. “Assim podemos nos aproximar do compositor e de outros barrocos com precisão”, observa Vargas.
![Fortepiano adquirido pela ECA-USP - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/20160610_cravos_int_2.jpg)
Outra aquisição é o fortepiano criado por César Guidini a partir de uma cópia de 1780 e 1800, criado em Viena por Anton Walter. “Esse instrumento é muito semelhante ao que Mozart tocava”, conta Sérgio Carvalho. A sua característica é um toque mais leve, parece mais com o cravo do que com um piano, porém suas cordas geram uma percussão.” A expectativa do professor é a possibilidade de um concerto específico do final do século 18, passando por Carl Philipp Emanuel Bach, Mozart e Haydn.
Esses três instrumentos de aquisição recente dividem o espaço da sala 11 do Departamento de Música com outros dois igualmente importantes. Tem a espineta triangular, também construída por Vargas e adquirida pela ECA nos anos 1990, para acompanhamento de coro. Curioso pelo desenho moderno, possui uma única fileira com 54 teclas. E o outro é um órgão portativo construído por Georg Jann, berlinense que vive em Santa Catarina desde 2006 e que já fabricou mais de 200 órgãos. Comprado há cinco anos, tem três fileiras de tubos. Apesar de aparentemente pequeno, é um instrumento com muitas possibilidades e vai se adequando aos sons fortes e suaves da música antiga.
Os cravos, o pianoforte e o órgão portativo, com o talento e conhecimento de Sérgio Carvalho e Mônica Lucas, estão no Departamento de Música na expectativa do interesse de novos músicos. Uma geração para pesquisar e resgatar a perfeição das composições de Bach, Händel, Mozart e tantos outros mestres.
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Confira as imagens dos cravos e outros instrumentos para os concertos de música antiga
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Ouça o som do cravo
Instrumento exige destreza e leveza no dedilhar das teclas
No vídeo abaixo, é possível ouvir a apresentação do professor Sérgio Carvalho ao cravo da Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, em São Paulo, realizada em 15 de maio de 2012.
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