Por Natália Milena/LAC-ECA
Reconhecido pelo seu trabalho com a viola caipira no Brasil, uma pesquisa revelou como o compositor, músico e ator Almir Sater modernizou a música de viola no País. A dissertação apresentada na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP analisou a obra de Sater identificando e descrevendo os recursos composicionais presentes em cinco músicas do artista: Corumbá, Doma, Luzeiro, Viola de Buriti e Cristal. A autoria da pesquisa em musicologia A diversidade composicional na obra instrumental de Almir Sater é de Max Junior Sales, com orientação do professor Ivan Vilela.
Em 2018, as violas foram reconhecidas como patrimônio cultural do Estado de Minas Gerais. O Registro dos Saberes, Linguagens e Expressões Musicais da Viola foi realizado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG), destacando a importância do instrumento musical na cultura do Brasil e sua ligação com as tradições mineiras.
A viola tem origem portuguesa e chegou ao Brasil junto com os colonizadores. À medida que se espalhou pelo território nacional, o instrumento assumiu expressões culturais de cada região e foi incorporando diferentes materiais e formas à sua construção.
Sales chama a atenção para o fato de haver “uma carência significativa de estudos dedicados às obras dos instrumentistas de viola”, assim como de pesquisas científicas que se dediquem às composições de Almir Sater, ainda que elas sejam incorporadas com frequência ao repertório de músicos Brasil afora.
Viola instrumental: diferentes possibilidades de abordagem
As composições de Almir Sater recebem influências de gêneros musicais como o rock e o blues. O disco Instrumental, de 1985, apresenta possibilidades musicais até então inexploradas com a viola. As obras do violeiro apontam para uma modernização da música instrumental de viola, uma vez que a sonoridade delas se assemelha à sonoridade da música instrumental contemporânea e da MPB. Segundo a pesquisa, “alguns músicos e pesquisadores se referem à produção musical de Almir Sater como uma obra que apresentou novas possibilidades musicais e instrumentais ao universo da viola de dez cordas”.
Em Corumbá, “Almir Sater faz uso de um recurso técnico característico da técnica guitarrística na execução do blues”, denominado bend. Nessa técnica, se eleva a altura de uma nota sem que haja interrupção do som, “por meio de uma distensão da corda com o dedo que a pressiona”.
A inserção de elementos do blues, assim como a relação entre modalismo e tonalismo e a elaboração complexa da instrumentação em Luzeiro, entre outros recursos identificados no trabalho, revelam a diversidade presente nos processos criativos do compositor. Para o pesquisador, “foi surpreendente constatar como um recorte tão pequeno da obra [de Almir Sater] pôde gerar um estudo tão extenso. Ainda assim, há um sem-número de possibilidades de estudos para abordar a obra por diferentes perspectivas.”
Através de sua pesquisa, Junior Sales tinha como objetivo criar uma base para que mais estudos explorem o universo da música instrumental de viola, além de contribuir para um “entendimento mais sólido da história desse instrumento como um importante elemento da cultura brasileira”, que não se limita a uma única região e pode ser utilizado em diversas linguagens musicais, como o rock, o choro e a música clássica.
Do violão para a viola: um percurso acadêmico e artístico
Sales conta que, antes de iniciar o mestrado em 2017, se deparou com a dissertação A Viola Caipira de Tião Carreiro, realizada pelo também violeiro João Paulo Amaral, na Universidade de Campinas (Unicamp). “Achei a pesquisa incrível e comecei a procurar outros trabalhos semelhantes dedicados a outros violeiros. Encontrei pouca coisa. Nesse momento, me ocorreu de eu mesmo desenvolver um estudo dedicado à obra do violeiro sul-mato-grossense [Almir Sater], uma referência musical pessoal desde o período em que eu ainda não tinha contato com a viola.”
A música instrumental faz parte da vida de Max Junior Sales desde muito cedo. Ele relata que o interesse pela música teve início em sua adolescência e conta dois eventos marcantes da época. O primeiro diz respeito à lembrança de momentos em que observava seu pai “tocar alguns acordes e assoviar algumas melodias” no violão. O segundo evento remete a uma experiência da época em que o pesquisador começou a frequentar um grupo de capoeira, no bairro vizinho ao que morava. Logo no primeiro encontro, o que lhe chamou a atenção não foram os movimentos da prática, mas o som que saía do aparelho usado para reproduzir uma fita cassete. “Aquela sonoridade das vozes, berimbau, atabaque e caxixi foi muito impactante para mim”, ele diz e destaca que, desde o início, o aspecto instrumental – como timbres, dinâmicas e melodias – foi o que mais chamou sua atenção.
Nascido em Lavras, Minas Gerais, Max Junior Sales se mudou para cursar graduação em Música pela Universidade Federal de São João del-Rei. Lá ele se formou em violão em 2010. Foi também nessa época que o interesse pela viola “foi se tornando cada vez maior a ponto de começar a substituir o violão como meu instrumento principal de trabalho”. Ele afirma ter encontrado no mestrado a possibilidade de fazer essa transição e se aprofundar no universo da viola caipira.
Mais informações: (11) 3091-1646/4068 ou e-mail lac-eca@usp.br