![Foto: Marcos Santos / USP Imagens](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/olimpiadas_01_denis-altorendimento.jpg)
Em 2016, o Brasil participa dos jogos olímpicos figurando em todas as 42 modalidades da competição internacional. Por ser a sede da Olimpíada, pela primeira vez, o País terá a chance de disputar medalhas em esportes em que tem pouca ou nenhuma tradição. Contudo, pela previsão do próprio Comitê Olímpico Brasileiro (COB), não é esperado dos atletas locais um número que supere as grandes nações recordistas de pódio.
Parte das expectativas moderadas advém do fato de que a estrutura e o conjunto de políticas públicas que dão suporte aos atletas brasileiros estão abaixo das de diversos outros países. Lançado este ano, o ebook Análise das políticas e do clima/ambiente para o esporte de alto rendimento nos diferentes níveis de organização governamental e não governamental brasileiros expõe um panorama das políticas para o esporte de alto rendimento em nove Estados brasileiros, nove capitais e no Distrito Federal, contemplando as cinco regiões do País.
Entre as diversas conclusões da pesquisa que deu origem ao livro está a constatação de que faltam no País, de uma maneira generalizada, dados sobre políticas públicas e orçamento, e isso tem um nítido reflexo na área dos esportes. Além disso, é consenso que o papel das escolas deve ser repensado, e que não pode haver a falta de continuidade que se percebe após os picos de investimento público no esporte, como acontece próximo aos grandes eventos.
Conduzido entre 2014 e 2016 por membros do Laboratório de Treinamento e Esporte para Crianças e Adolescentes (Lateca) da EEFE, com coordenação da professora Maria Tereza Silveira Bohme e financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o trabalho se originou a partir de uma pesquisa ainda maior, de abrangência internacional, iniciada em 2009.
Nove pilares
![A professora Maria Tereza Silveira Böhme no II Simpósio Internacional Sobre Políticas para o Esporte de Alto Rendimento - Foto: Divulgação](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/olimpiadas_02_denis-altorendimento.jpg)
“Fomos contatados pelo consórcio SPLISS (Sports Policies Factors Leading to International Sport Success) que nos convidou para representar o Brasil em um grande projeto de pesquisa internacional sobre políticas para o esporte de alto rendimento”, relembra a professora Tereza. O objetivo principal do projeto era comparar as diferentes políticas de incentivo aos atletas nos países membros do grupo — entre eles, Bélgica, Reino Unido, Holanda e Austrália —, além de entrevistar pesquisadores, dirigentes e os próprios esportistas por meio de uma metodologia própria.
Desenvolvido pela professora Veerle De Bosscher, da Vrije Universiteit Brussel, na Bélgica, e coordenadora do consórcio SPLISS, o modelo de análise propôs nove pilares que determinariam a eficiência das políticas para o esporte: 1 – suporte financeiro; 2 – organização e estrutura de políticas para o esporte; 3 – participação e esporte de base; 4 – identificação de talentos e sistema de desenvolvimento, 5 – suporte para atletas e pós-carreira; 6 – instalações esportivas; 7 – desenvolvimento e suporte para técnicos; 8 – competições nacionais e internacionais e 9 – pesquisa científica. Cada um dos pilares foi composto dos chamados Fatores Críticos de Sucesso (FCS), que são pontuados recebendo um escore para avaliar seu desempenho.
Para os pesquisadores do Lateca, o trabalho se concentrou em duas frentes: políticas para esporte de alto rendimento e clima para o esporte de alto rendimento. Sem financiamento externo para a primeira parte do projeto, os especialistas dependeram exclusivamente da estrutura do laboratório e de sua equipe. “São 16 pessoas que trabalham juntas há mais de dez anos”, revela Tereza.
Conforme a professora, uma das grandes dificuldades no decorrer da pesquisa foi justamente obter acesso a informação por meio de fontes oficiais. “Utilizamos o portal de transparência e acessamos sites oficiais, mas notamos uma deficiência na área”, aponta. Para ela, a carência de dados sobre políticas públicas e orçamento é geral e tem um nítido reflexo na área dos esportes. “A Lei de Transparência estava sendo efetivada entre 2010 e 2011, e alguns dos entrevistados não tinham condição de validar informações por falta de conhecimento”, explica ela.
Apesar das dificuldades, a pesquisa inicial foi finalizada no final de 2013 e apresentada em um simpósio na Antuérpia, na Bélgica. Em 2015, foi lançado um livro com todas as comparações e resultados.
Etapa nacional
![II Simpósio Internacional Sobre Políticas para o Esporte de Alto Rendimento - Foto: Divulgação](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/olimpiadas_03_denis-altorendimento.jpg)
Em junho de 2013, os membros do Lateca trouxeram quatro professores do consórcio para a realização de um simpósio na EEFE, divulgando os resultados brasileiros e debatendo comparações. Na ocasião, membros do Ministério do Esporte e dos comitês olímpico e paralímpico brasileiro participaram dando sua visão sobre a prática na área dos esportes de alto rendimento.
No final daquele ano, após serem aprovados por um edital lançado pelo CNPq, o grupo iniciou uma nova fase da pesquisa, cujos principais focos eram investigar como acontecia a iniciação esportiva e qual o papel da escola durante essa fase.
A pesquisa envolveu levantamentos bibliográficos, entrevistas com gestores de secretarias municipais e estaduais de Esporte e de Educação e aplicação de questionários a atletas, técnicos e gestores da área.
Subdividido em dois temas, o trabalho enfatizou a educação física, o esporte escolar, o desenvolvimento de talentos e o desenvolvimento da carreira do atleta. O primeiro tema focou na efetividade das políticas de esporte nas diferentes regiões brasileiras. Já segundo buscou analisar o clima/ambiente geral para o esporte de alto rendimento na visão dos profissionais da área, como atletas, gestores e técnicos esportivos.
Entraram na amostra os seguintes Estados e suas respectivas capitais, além do Distrito Federal: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia, Pernambuco e Amazonas.
“O que percebemos é que a comunicação entre as esferas públicas é praticamente inexistente”, revela Tereza. “Nas diferentes instâncias, os poderes têm grande autonomia, mas não conversam entre si” reforça.
O futuro está nas escolas
![Foto: Wikimedia Commons](https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/olimpiadas_04_denis-altorendimento.jpg)
Com relação ao papel dos Estados e dos municípios, os especialistas atestaram que as regiões de maior investimento em atletas ainda são a Sul e a Sudeste. Para Tereza, “São Paulo é um dos Estados que têm trabalhos mais específicos voltados para políticas do desenvolvimento do esporte”. Citando projetos como o programa Centro de Excelência Esportiva e o Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa, em atividade desde os anos 1970, São Paulo permanece uma das regiões mais ativas e interessadas em formar atletas.
Um dos diagnósticos da pesquisa foi comprovar que, em especial no nível municipal, muito pouco é feito em prol do esporte de rendimento. “Falta para nós uma definição de competências. O que compete ao nível federal, estadual e municipal”, salienta a professora. “Tivemos um pico de investimentos em 2007 – por causa dos Jogos Panamericanos -, mas a aplicabilidade dos outros pilares ficou a desejar”, analisa. A falta de continuidade nas políticas públicas foi o fenômeno mais comum observado durante os anos de estudo.
Além disso, Tereza entende que as escolas precisam refletir sobre sua atuação. “Nos anos 1960 e 1970, as escolas tinham papel muito importante. Dos anos 1980 pra cá, houve uma mudança”, afirma. “Paramos de trabalhar com o esporte na escola, a criança parou de ter uma vivência das modalidades esportivas”, conclui ela, indicando que uma das possíveis soluções para a melhoria do desempenho esportivo dos brasileiros esteja justamente dentro das escolas.
Desenvolvido em 2014 e 2015, o projeto foi finalizado em janeiro de 2016. Um novo simpósio foi organizado para divulgar os resultados da pesquisa, contando com a presença da professora De Bosscher e rendendo a primeira dupla titulação de doutorado da EEFE para Leandro Carlos Mazzei pelo trabalho Judô de alto rendimento: determinantes organizacionais para o sucesso esportivo internacional.
Além do ebook lançado em janeiro, no final de junho um novo trabalho foi publicado pelo grupo, focando em resultados do Brasil no nível nacional. O livro Esporte de Alto Rendimento: Fatores Críticos de Sucesso, Gestão e Identificação de Talentos foi lançado pela Editora Phorte e pode ser encontrado neste link.
Mais informações: site http://www.eefe.usp.br/lateca/sipear2016, email terbohme@usp.br, com a professora Maria Tereza Silveira Bohme