Alguns estudos já mostraram que diferentes tipos de cobertura do solo nas cidades têm desfechos diferentes na saúde mental. Mas qual é esse impacto na população da região metropolitana de São Paulo? Pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) buscaram avaliar como o ambiente urbano e a infraestrutura verde da cidade se relacionam com a presença de ansiedade e depressão na população. Segundo dados da pesquisa, a falta de espaços verdes diversificados em algumas áreas de São Paulo está associada com um maior número de pessoas ansiosas, em comparação a áreas de maior porcentagem de verde. Só que esse verde não pode ser somente um gramado ou algumas árvores em uma região cheia de prédios, é o conjunto que faz a diferença na saúde das pessoas.
Apesar da impressão de que pessoas que moram nos locais de maior renda e regiões aparentemente mais arborizadas manifestariam menos casos de ansiedade, a pesquisa apontou o contrário. “Existe o verde nas áreas mais ricas, mas é uma arborização urbana que, se você for comparar com outras regiões, mesmo sendo a área urbana mais arborizada da cidade de São Paulo, ainda não é tão arborizada assim”, explica Tiana Moreira, engenheira agrônoma e pesquisadora no Departamento de Patologia da FMUSP e uma das autoras do artigo Avaliando o impacto do ambiente urbano e da infraestrutura verde na saúde mental: resultados da Pesquisa de Saúde Mental da Megacity São Paulo, publicado na revista científica Journal of Exposure Science & Environmental Epidemiology, do grupo Nature.
As áreas de reserva florestal na região metropolitana de São Paulo têm muito crédito nisso. Um exemplo é a Serra da Cantareira, ao norte da cidade de São Paulo, que possui cobertura vegetal de mata atlântica. Segundo o estudo, pessoas que estão nessas áreas, geralmente mais afastadas dos centros da cidade, manifestam menos ansiedade. “Nós vimos que pessoas que moram em áreas mais periféricas [bordas da cidade] convivem com 80% de verde ao redor da residência, enquanto pessoas que moram no Alto de Pinheiros, por exemplo, podem ter 50% ou 60% de verde nas proximidades”, explica a pesquisadora.
Os pesquisadores utilizaram dados do São Paulo Megacity Mental Health Survey (SPMHS), segmento brasileiro do estudo World Mental Health Survey (WMH Survey), uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) que integra e analisa pesquisas epidemiológicas sobre abuso de substâncias e distúrbios mentais e comportamentais em várias partes do mundo. A pesquisa avaliou uma amostra de 5.037 pessoas maiores de 18 anos da Região Metropolitana de São Paulo, a partir de questionários. O relatório foi publicado em 2012.
Para relacionar os casos de ansiedade e depressão com a presença de área verde, Tiana explica que “por meio de regressões lineares, foi possível fazer a associação entre a ansiedade ou a depressão com as áreas verdes e outras ocupações de solo, como áreas construídas”. Com os mapas do Instituto Geológico de São Paulo foram feitas as classificações das regiões, entre buffer, que é um círculo ao redor da casa da pessoa, e distrito, que abrange áreas maiores. A partir disso, foram adicionados fatores de correção, ou seja, dados sociodemográficos, como idade e escolaridade.
A pesquisa não conseguiu relacionar o quadro clínico de depressão com a presença ou não de áreas verdes. Mas chegou a resultados conclusivos em relação a casos de ansiedade. Em regiões com uma diversidade de espaços verdes, principalmente áreas gramadas, a presença de pessoas ansiosas foi menor do que em regiões com a prevalência de telhados, asfalto e sombra.
A presença de parques, florestas, praças, hortas comunitárias e outras formas de paisagens naturais nas cidades tem um impacto direto na saúde mental, mas também tem desdobramentos indiretos. “Sem o verde, a temperatura do seu entorno aumenta, a ocorrência de enchentes aumenta, aparecem outros problemas, então a pessoa fica mais estressada porque está mais quente, porque a sua rua está alagando”, exemplifica Tiana. É um conjunto de fatores, além da visão do verde, que melhora a qualidade de vida da população.
No entanto, São Paulo caminha na direção contrária às recomendações dos cientistas. Um exemplo recente é a reforma do Vale do Anhangabaú, que suprimiu a cobertura verde do local por blocos de concreto, e que faz parte de uma série de políticas de desenvolvimento das grandes metrópoles que não consideram a infraestrutura verde.
Mais informações: e-mail tianacarla@usp.br, com Tiana Moreira