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Imagine transformar seu celular em uma poderosa ferramenta para mapear pontos de transmissão de doenças como zika, malária ou dengue. É exatamente esse o objetivo de um projeto desenvolvido por um dos pesquisadores principais do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (Crid) e professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP, Helder Nakaya.
A ideia, que foi contemplada com US$ 100 mil pela Fundação Bill & Melinda Gates, é utilizar o arquivo que armazena as informações do GPS do celular para identificar os locais em que os pacientes estiveram e, após o cruzamento desses dados, encontrar os pontos em que pode haver criadouros. “Atualmente, para identificar o local em que a pessoa se contaminou, os profissionais de saúde perguntam para os próprios pacientes por que lugares passaram. Mas é muito difícil lembrar todos os lugares por onde passamos em um período de 14 dias”, explica o autor principal do projeto, que também conta com colaboradores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP e da Fundação de Medicina Tropical de Manaus.
Segundo Nakaya, o arquivo que armazena o histórico de localização nos celulares guarda apenas coordenadas, não havendo o risco de expor outras informações confidenciais, como contatos ou fotos. “A privacidade é um fator extremamente importante. Ninguém gosta de compartilhar seu histórico de localização porque tem informações íntimas, indiscretas ou até ilegais. Mas a gente deixa claro que a pesquisa é completamente anônima e voluntária. O único dado extra que vamos precisar é que o hospital informe qual doença a pessoa tem. Dependendo da doença, teremos que considerar um determinado prazo de dias ou um raio de localização diferente para analisar esse arquivo.”
Além da malária, que é o foco do apoio oferecido pela Fundação Bill & Melinda Gates, os pesquisadores querem expandir a ideia para outros tipos de doenças, como zika, dengue e chikungunya. Para isso, estão criando uma rede com profissionais de várias regiões do País. “Temos a colaboração de pesquisadores do Nordeste, de Rondônia, do Mato Grosso e de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo”, conta Nakaya.
Para testar a eficácia do uso das informações do GPS, os pesquisadores iniciaram um projeto piloto com alunos e funcionários da USP. Usando o site Sipos, eles podem colaborar, especificando o local em que estudam ou trabalham e enviando o arquivo com o histórico de localização. “Com essas informações, vamos testar o algoritmo de busca para ver se ele encontra como local de transmissão justamente o local em que essa pessoa trabalha ou estuda. Parece trivial, mas a matemática por trás disso não é tão simples quanto a gente pensa. É preciso fazer diversos testes e o projeto piloto tem essa função”, diz o pesquisador.
Das cerca de 1.500 propostas, a Fundação Bill & Melinda Gates só financiou 28 projetos no mundo inteiro. Porém, essa verba é apenas um pontapé inicial. Se o projeto tiver sucesso, a instituição pode destinar mais US$ 1 milhão para desenvolver a ideia. “Um dos desdobramentos desse projeto é a criação de um aplicativo que mapeie em tempo real onde estão os possíveis locais de transmissão das doenças. Assim, uma prefeitura pode, por exemplo, enviar agentes públicos para acabar com o foco. Ou pessoas comuns podem usá-lo para evitar transitar por essas áreas”, explica Nakaya.
Thais Cardoso, de Ribeirão Preto
Mais informações: e-mail lucas.cardozo@usp.br e hnakaya@usp.br