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Você sabia que o campus da USP em Ribeirão Preto tem um espaço destinado à recuperação de obras acadêmicas e literárias? Esse espaço, chamado Seção de Encadernação, reúne, atualmente, somente dois funcionários, que encadernam cerca de 2 mil livros por ano, e já recuperaram em média 70 mil obras, a maioria da Biblioteca Central do Campus.
Criada em 1964 por Joaquim Teófilo de Morais, a Seção de Encadernação está vinculada à Prefeitura do Campus da USP em Ribeirão Preto (PUSP-RP) e na função de artesãos do tempo e guardiões dos segredos e testemunhas das histórias estão Jésus Hélio Mazzucatto e José Paulo Tirado.
No setor, já foi encadernada, por exemplo, a primeira edição de Os Sertões, do escritor pré-modernista Euclides da Cunha (1866-1909), publicada em 1902, obra consagrada da literatura brasileira. Mas Mazzucatto reconhece que, em retrospecto, talvez devesse ter optado pela restauração, levando em consideração o valor e a importância da edição em questão. Por isso destaca a diferença entre restauração e encadernação: “Enquanto a restauração busca recuperar obras desgastadas pelo tempo, a encadernação confere uma nova identidade às páginas”.
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Mazzucatto e Tirado contam que a cada encadernação, cuidadosamente trabalhada, eternizam os sussurros dos autores e os suspiros dos leitores que vieram antes e deixam um legado que atravessa o tempo e as eras, preservando o conhecimento e as quimeras, por meio de uma nova identidade para as obras antigas.
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Recrutas da história
A arte de encadernar é milenar, teve origem nos mosteiros da Idade Média, antes mesmo da descoberta da imprensa e consiste em uma operação que une, ordenadamente, por meio de costura sólida e cola de artesão, os cadernos de um obra, para formar um volume compacto, cobrindo-o com capa dura e recompondo um livro.
No campus, os funcionários iniciaram as atividades nessa arte por meio de um chamado peculiar, quando Joaquim Teófilo, na época chefe do setor, procurava meninos interessados na arte manual e recrutou jovens que moravam dentro do campus USP, para esse universo, e foi assim que Jésus Hélio Mazzucatto se tornou parte da equipe em 1972. José Paulo Tirado, hoje chefe do setor, uniu-se a essa história em 1983 e, atualmente, eles são os únicos remanescentes de uma equipe que costumava contar com até cinco membros.
Mazzucatto ainda declara que permanecerá até que seja compelido a deixar o cargo, um prazo de cinco anos a partir de agora, “é um testemunho de minha paixão pelo que faço, pois se tornou parte essencial de minha identidade”.
Ao longo de suas trajetórias, esses profissionais acompanharam de perto as mudanças no processo de encadernação. Da técnica manual ao advento das prensas mecânicas, a tecnologia trouxe praticidade e rapidez para o trabalho árduo de suas mãos habilidosas. No entanto, Mazzucatto enfatiza que a “tecnologia pouco importa, porque a verdadeira satisfação está na visão gratificante de um livro abraçado novamente por uma encadernação de qualidade, um resultado final que reflete no trabalho meticuloso e que ressoa em cada página”.