Historicamente mulheres e pessoas pretas são minoria nas casas legislativas brasileiras. As mulheres não passam de 15% entre nossos representantes, já pessoas pretas aparecem em último lugar dentre os vereadores e vereadoras eleitas em 2020. Esse cenário acontece mesmo com cotas para candidaturas por gênero, com normas de financiamento eleitoral e com o uso de redes sociais. Para falar sobre as falhas e soluções para minimizar essas desigualdades neste episódio da série Mulheres e Justiça a professora Fabiana Severi conversa com Luciana Ramos, doutora em Direito do Estado pela USP, professora na Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas.
Luciana, pesquisadora no Núcleo de Gênero e Direito de Justiça Racial na FGV, com vários estudos sobre mulheres e política nos últimos anos, afirma que, em termos numéricos, o Brasil está entre os piores colocados em relação à representação de mulheres nas casas legislativas. “A média da representação feminina, dentro desses espaços de poder político e tomada de decisão, varia em torno de 15%, embora as mulheres sejam a maioria do eleitorado.”
A pesquisadora diz que desse total de mulheres representantes apenas 17% são mulheres negras, mesmo sendo 25,4% da população, e 1% são mulheres indígenas. “Então há uma sub-representação, especialmente das mulheres não privilegiadas, que em geral são as negras.” Luciana lembra que as mulheres negras são as que mais buscam e utilizam os equipamentos públicos, particularmente políticas públicas locais, nos municípios. “Isso é muito importante, porque quando elas estão excluídas desses espaços elas dificilmente terão voz para efetivamente formular políticas públicas, por exemplo, nas áreas de educação, como creches, de saúde e transporte, questões que afetam o dia a dia dessas mulheres, de crianças e de famílias.
Representação feminina
O grupo liderado pela pesquisadora lançou nota técnica com análise sobre a representação de mulheres negras, baseada nas eleições municipais de 2020. Na nota são abordados temas sobre as medidas que o Brasil vem adotando para a inclusão desses grupos minorizados, que não são minorias do ponto de vista numérico, mas são, em geral, os excluídos desses espaços. Como exemplo de medidas adotadas no País, Luciana cita a Lei de cotas de candidaturas, que prevê o mínimo de 30% de mulheres nas listas dos partidos, “uma política pouco efetiva, tendo em vista que ela existe desde 1997 e em 2022 ainda são apenas 15% de mulheres representadas no Parlamento”.
Por outro lado, diz a pesquisadora, essa é uma legislação que serviu de base para a criação de outras regras eleitorais via judiciário. Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que, no mínimo, 30% dos recursos públicos destinados à campanha eleitoral deveriam ser aplicados em campanhas de mulheres. “Isso a gente chama de cotas de financiamento, a pesquisa ‘Candidaturas em Jogo’ de 2020, mostrou que, de fato, foram mais recursos para as campanhas de mulheres, tendo em vista essa regra eleitoral, porém as mulheres que foram mais beneficiadas por essa regra foram as brancas, de forma equivalente.”
Distribuição do fundo partidário
Luciana lembra que esse diagnóstico foi importante porque ele foi utilizado para uma decisão do Tribunal Superior Eleitora (TSE), no que diz respeito às cotas de candidaturas para pessoas negras. “O TSE em uma consulta feita pela Benedita da Silva votou pela distribuição dos recursos, tanto do fundo partidário quanto do fundo especial de financiamento de campanha e tempo de rádio e TV, na exata proporção de candidaturas de mulheres negras e brancas e também na proporção dos homens negros.” Com isso, diz a pesquisadora, “a partir de 2020 o gênero e a raça das candidaturas passaram a ter que ser considerados para distribuição dos recursos de campanha pelos partidos políticos”.
Luciana chama a atenção que não é só a quantidade de recursos de campanha destinados a determinadas candidaturas; é importante saber como esse dinheiro chega, se no início da campanha ou final e questiona: “As pessoas precisam se endividar primeiro para depois receber os recursos do partido, que tipos de recursos são esses, é dinheiro ou são aqueles recursos simbólicos?”
Para a pesquisadora isso tudo ainda precisa ser mais bem avaliado e dimensionado, mas afirma que “são passos importantes para que se tenha resultado efetivo na eleição e se encontre soluções para minimizar essas desigualdades”.
A série Mulheres e Justiça tem produção e apresentação da professora Fabiana Severi, da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da USP, e das jornalistas Rosemeire Talamone e Cinderela Caldeira - Apoio: Acadêmica Sabrina Sabrina Galvonas Leon - Faculdade de Direito (FD) da USP Apresentação, toda quinta-feira no Jornal da USP no ar 1ª edição, às 7h30, com reapresentação às 15h, na Rádio USP São Paulo 93,7Mhz e na Rádio USP Ribeirão Preto 107,9Mhz, a partir das 12h, ou pelo site www.jornal.usp.br
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