Na mesma medida em que o ambiente virtual apresenta problemas para os pais, como os poucos filtros infantis de conteúdo eficazes nas redes, a tecnologia investe em soluções. Novos aplicativos de monitoramento possibilitam visualizar mensagens no celular dos filhos, verificar seus históricos de pesquisa, atividades em redes sociais e localização em tempo real, via GPS. Alguns permitem, também, ativar remotamente o microfone dos aparelhos para acompanhar as conversas de crianças ou adolescentes.
O uso de tais aplicativos, no entanto, é alvo de discussões. Críticos afirmam que a medida, supostamente efetiva para aumentar a segurança dos filhos, é apenas uma violação de privacidade. “O monitoramento deve ser pensado de acordo com a faixa etária do menor”, afirma Gustavo Monaco, professor da Faculdade de Direito da USP.
“Até os 16 anos de idade, o Código Civil determina que as crianças são absolutamente incapazes e representadas pelos pais, que se responsabilizam pelos atos dos filhos”, conta Monaco. A situação muda na adolescência: “A partir dos 16, o menor se torna relativamente incapaz. Ele passa a agir por si mesmo, mas, para que o ato seja válido, os pais devem assisti-lo e prestar anuência”. A condição, preparatória para a vida adulta, permite que os adolescentes tomem suas próprias decisões, mas ainda exige o consentimento dos pais.
Segundo o professor, em ambos os casos, a decisão dos pais se sobrepõe à privacidade dos filhos. “O menor precisa saber que, enquanto for incapaz, há quem zele por sua segurança, o vigie e acompanhe os seus atos, porque essa é a função que o sistema jurídico estabelece para os pais e responsáveis”, explica. “A partir dos 18 anos, já não há mais essa possibilidade, porque a pessoa se torna plenamente capaz.”
Transparência entre pais e filhos
Alguns aplicativos oferecem o serviço de monitoramento de forma “espiã”: a instalação no celular dos filhos é remota e esse opera sem o conhecimento da criança. Monaco afirma que, embora a legislação não aborde tal minúcia, não há necessariamente a obrigação de comunicar o menor. No entanto, a transparência é benéfica para estabelecer confiança, principalmente ao se tratar de adolescentes. “O pai e a mãe precisam ter consciência do papel importante que desempenham na formação dos filhos para a vida em sociedade”, diz o professor.
O diálogo com os menores, para Monaco, é também essencial para evitar conflitos e garantir sua segurança. “Todos nós fomos adolescentes um dia, e sabemos como essa fase é difícil. Nós queremos um grau de privacidade, queremos ter nossos próprios segredos nesse período. Mas é preciso saber que os pais são indivíduos que podem intervir, minimizar ou consertar eventuais situações mal resolvidas, e para isso é necessário muita confiança”, diz.
“Quando o filho completa 18 anos, ele se torna plenamente capaz de praticar os atos da vida civil e responde por eventuais crimes que venha a cometer. Se o novo adulto não souber como se comportar em sociedade, ele poderá ter muitas dificuldades”, completa o advogado. A novidade, para a atual geração de jovens, é que o aprendizado repassado pelos pais também deve abarcar o comportamento nos ambientes virtuais.
“A sociedade de hoje não é mais apenas aquela ‘real’, das ruas”, diz Monaco. Indicar as regras para o bom convívio em um mundo virtual, eletrônico e metaversado, no entanto, é um desafio para os pais, formados em épocas completamente diferentes. O diálogo com os filhos, nesse sentido, é benéfico para ambos os lados: “Hoje, os pais de filhos adolescentes têm entre 40 e 50 anos, e pensar nos perigos da internet não era algo que fazia parte do seu repertório de problemas durante a adolescência”.
Além disso, o professor aponta a necessidade de uma rede de apoio para estabelecer a segurança dos menores: “É preciso conversar, conversar e conversar, não apenas com os filhos, mas também com psicólogos e a escola”, finaliza.
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