Lei que proíbe uso de celular em sala de aula deve melhorar o processo de aprendizagem

O celular tira a atenção do estudante em relação à aula, faz com que fique imerso num mundo que é mediado por ele e pelo aparelho, avalia Daniel Cara

 22/11/2024 - Publicado há 4 meses
Por
Um homem, vestindo roupa escura, de costas para a câmera e escrevendo num quadro negro, enuanto em primeiro plano pode ser visto a mão de uma criança segurando um celular
Foto: Giovanna Cornelio via Pixabay – CC
Logo da Rádio USP

A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aprovou, por unanimidade, projeto de lei da deputada estadual Marina Helou, com coautoria de outros 42 parlamentares, que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos em escolas públicas e privadas no Estado de São Paulo. Nos países europeus, essa medida já existe há muito tempo. A Itália foi uma das pioneiras nessa experiência de proibir seu uso em 2007. Segundo a Unesco, quase 25% dos países proibiram o uso de celulares nas escolas.

Homem branco, de barba e bigode, usando óculos, vestindo paletó escuro sobre camisa de cor azul, semblante sério
Daniel Tojeira Cara – Foto: Jane de Araújo/Agência Senado via Flickr

Enquanto aguarda sanção do governador Tarcísio de Freitas, o uso de celulares está com os dias contados nas escolas de São Paulo. Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da USP, lembra que a mudança será implementada – caso o projeto seja plenamente sancionado – a partir de 2025, mas destaca que há exceções para o seu uso quando existirem necessidades pedagógicas. O controle do uso das unidades computacionais vai ser feito efetivamente pela unidade escolar. Vai ter que ser estabelecido um processo de acordo entre os estudantes, os pais, a comunidade escolar como um todo e a própria escola.

“A reação dos alunos vai ser diversa, é mais provável que crianças da educação infantil, que absurdamente têm unidades computacionais, celulares, tablets e smartwatch, vão aceitar mais facilmente essa regra, assim como as crianças dos anos iniciais do ensino fundamental.  Mas, para os anos finais do ensino fundamental, especialmente para o 8º e o 9º ano e para os três anos do ensino médio, esse acordo vai ser muito mais difícil de ser efetivado. Nesse sentido, existe, sim, uma faixa etária mais propícia a aceitar essa mudança.”

Prejuízos

Não é de hoje que sabemos que o uso excessivo das unidades computacionais, em especial celular, causa inúmeros prejuízos aos estudantes, um deles é a sociabilidade. Por esse motivo, a lei veda a utilização nos intervalos e nas salas de aula. O processo de aprendizagem também é prejudicado. “O celular tira a atenção do estudante em relação à aula. Faz com que o estudante fique imerso num mundo que é mediado por ele e pelo aparelho, aliás, é um mundo mediado pelo aparelho, é importante frisar isso, significa que ele não interage diretamente com outras crianças. Também dificulta o processo de aprendizagem, que é efetivamente um processo coletivo.”

O educador destaca que cada unidade escolar e cada sala de aula é uma comunidade de aprendizagem, os estudantes assimilam o conhecimento juntos. Cara explica ainda que essa lei busca aumentar o desempenho dos alunos e o celular dificulta a interação humana direta. Ele destaca que, assim “como ocorreu com a lei do bullying de 2015, que é uma lei correta, brasileira, mas que não tem aplicabilidade concreta, ao longo do tempo ela vai perder força. Então, é importante frisar que é uma lei frágil”.

Outro prejuízo que o uso de aparelhos causou foi a redução na leitura de livros no ensino dos estudantes. “É quase um consenso acadêmico que a leitura do livro tem mais efetividade do que a leitura do aparelho pela tela, por vários motivos, desde o tamanho da tela, à dispersão que o aparelho causa por conta do acesso à internet.” O pedagogo acredita que o uso do celular poderia ser utilizado em questões pontuais, quando houvesse um incentivo ao uso regulado para não desperdiçar as possibilidades que ele traz, mas sem deixar de lado o uso do livro didático em sala de aula.

“Na minha opinião, até pela maneira como foi construída a lei, em que o controle cabe à escola, melhor seria não ter uma lei e a gente de fato investir num processo pedagógico de educação digital, para que os estudantes saibam lidar com a tecnologia, algo que é muito mais efetivo do que simplesmente proibir, conforme a lei determina. No início, a lei vai ter uma aplicabilidade, vai ser utilizada pelos professores para controlar o uso obsessivo pelos alunos, mas, com o passar do tempo, o que vai funcionar é a negociação da escola e da sala de aula. No fundo, essa vai ser mais uma norma que é criada, que no início tem um efeito, mas depois se perde pela própria realidade concreta das escolas.”


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar no ar veiculado pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 14h, 15h, 16h40 e às 18h. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.