Guerras e meio ambiente, uma combinação que não se ajusta aos interesses da humanidade

Wagner Costa Ribeiro diz que os conflitos armados causam vários impactos ambientais onde ocorrem e trazem grandes prejuízos à biodiversidade em sua cruzada de destruição

 Publicado: 18/11/2024 às 9:04
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Visão geral de um campo de guerra, em que se pode ver uma grande infinidade de tanques de guerra e outros veículos blindados conduzidos por tropas, que também podem ser vistas perfiladas nas margens da estrada
O uso massivo de combustíveis fósseis para transporte de tropas, veículos militares e aviões de combate gera uma quantidade substancial de emissões de dióxido de carbono – Foto: Пресс-служба Президента Российской Федерации – wikimedia.
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Guerras e o meio ambiente estão interligados de maneira profunda e complexa. Desde os primeiros conflitos humanos até os conflitos modernos, a natureza sofre impactos devastadores causados pelas ações bélicas. Nos últimos séculos, o uso intensivo de recursos naturais, a destruição de ecossistemas e a poluição gerada pelos conflitos intensificaram-se, criando um rastro de degradação ambiental com efeitos que podem durar décadas para recuperação. A esse respeito, o professor Wagner Costa Ribeiro, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, comenta os impactos desses conflitos na natureza.

Utilização de recursos naturais

As guerras exigem grandes quantidades de recursos naturais, como petróleo, madeira e água. A extração descontrolada desses recursos para abastecer a maquinaria de guerra resulta em desmatamento, escassez de água e degradação do solo. Esses processos reduzem a capacidade de regeneração do ambiente, especialmente em áreas que dependem desses recursos para sustentar sua biodiversidade e fornecer meios de subsistência para as comunidades locais.

Homem branco, de meia idade, um tanto calvo, de terno cor creme, olhando para um ponto inespecífico
Wagner Costa Ribeiro – Foto: IEA USP

“As guerras causam vários impactos ambientais nas áreas onde elas ocorrem. O chamado teatro de guerra é duramente afetado pela destruição, seja de um patrimônio edificado, muitas vezes pontos estratégicos, infraestrutura como rodovias, ferrovias, às vezes fontes de geração de energia, outras vezes partes importantes de cidades ou até de mais de uma parte de uma cidade. Evidentemente que isso traz sérios impactos ambientais, mas também afeta a chamada zona rural. Muitas vezes com contaminações químicas que acabam chegando ao solo ou aos corpos d’água”, afirma Ribeiro.

A contaminação de solo e água é outro problema ambiental significativo durante os conflitos. Explosivos, munições e armamentos químicos e nucleares liberam resíduos tóxicos que se infiltram na terra e nas fontes de água, causando danos de longo prazo. Em regiões de conflito, os moradores daquela região são frequentemente expostos a solos contaminados, água potável envenenada e ecossistemas devastados, o que compromete a saúde pública e a biodiversidade.

Conflitos e aquecimento global

As guerras também têm um impacto significativo sobre o clima. O uso massivo de combustíveis fósseis para transporte de tropas, veículos militares e aviões de combate gera uma quantidade substancial de emissões de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa. As emissões liberadas durante períodos de conflito contribuem diretamente para a mudança climática, exacerbando eventos climáticos extremos e ameaçando ainda mais a estabilidade ambiental global.

“Se você pensar em toda a logística, que não é pequena, de deslocamento de tropas ou mesmo para lançamento de foguetes – seja por meio de terra-ar, por exemplo, com sistemas de lançamento de mísseis que estão em um determinado ponto e vão lançar esses foguetes até outro ponto; e se for, no caso, um dispositivo ar-terra, ou seja, mísseis lançados a partir de aeronaves, e mesmo mísseis que são lançados a partir de navios, tanto para afetar outros navios no mar como também, muitas vezes, alguns que chegam até a afetar as áreas continentais -, tudo isso é movido a propulsão e esses foguetes em si, além dos aviões, dos navios e todo o efetivo militar que é deslocado, consomem combustíveis fósseis. Essa em si já é uma grande fonte de emissão”, discorre Wagner Ribeiro.

Impacto na fauna e flora

A biodiversidade também sofre com as guerras. O som alto dos aviões de caça, de bombas ou de tropas, pode afugentar a fauna. Wagner Ribeiro, exemplifica: “Você pensar um avião, um caça, um jato, um supersônico, que tem aí uma capacidade de se deslocar a alta velocidade, isso também gera impactos, porque o som é muito alto, às vezes sobrevoando determinadas áreas, isso afugenta a fauna. Outro impacto muito grande, não é raro, nós temos posteriormente a uma explosão, incêndios, e às vezes esses incêndios extrapolam as áreas urbanas, chegam, inclusive, às áreas rurais, ou mesmo às áreas de reserva, e isso também acaba impactando diretamente a biodiversidade, e, como eu dizia há pouco, se você tiver contaminação nos corpos hídricos, evidentemente isso vai afetar toda a fauna de um lago, de um rio, com consequências bastante dramáticas”, acrescenta.

A contaminação nuclear e o uso de armas químicas representam algumas das ameaças mais graves ao ambiente em zonas de guerra. Locais onde ocorreram explosões nucleares, como Hiroshima e Nagasaki, e áreas de testes nucleares ainda hoje apresentam níveis de radiação perigosos. Armas químicas como o agente laranja, usado na guerra do Vietnã, deixaram um legado de solo infértil e afetaram gravemente a saúde humana e a fauna local. A preservação do meio ambiente durante e após conflitos é essencial para garantir que as futuras gerações herdem um planeta habitável. Embora seja um desafio complexo, integrar a sustentabilidade ambiental na dinâmica da guerra e da paz é um passo importante para alcançar um futuro mais equilibrado, em que o desenvolvimento humano e a proteção do meio ambiente andem lado a lado.

O professor conclui ressaltando que a guerra nunca é boa e que devemos seguir a premissa de paz. “Então, em suma, a guerra nunca é boa, ela acaba trazendo impactos enormes, impactos muito grandes, não apenas para a população diretamente afetada, mas também em uma escala mais ampla, envolvendo, por exemplo, a dinâmica da atmosfera, ao enviar mais gás de efeito estufa, às vezes por razões puramente estratégicas, sem pensar em questões como direitos humanos, a confraternização e a organização pela paz, que deveria ser a premissa fundamental”, finaliza.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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