
A Lei Antidesmatamento, aprovada pela União Europeia, estabelece regras rigorosas para a importação de produtos agropecuários, como a que proíbe a entrada de mercadorias provenientes de áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. Embora a medida seja celebrada por ambientalistas, setores do agronegócio e autoridades brasileiras alertam para possíveis impactos econômicos e desafios comerciais. O lobby brasileiro teve efeito. A lei entraria em vigor em janeiro de 2025 e foi adiada sua implementação para janeiro de 2026.

Segundo o professor Umberto Celli Junior, especialista em Direito Internacional da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da USP, a legislação apresenta um duplo impacto. “Do ponto de vista da Organização Mundial do Comércio (OMC), a lei apresenta características que violariam acordos internacionais, mesmo que venha embasada por justificativas ambientais. É importante lembrar que a lei vai além de medidas de proteção ao meio ambiente e pode ser interpretada como uma barreira comercial disfarçada. Isso exige atenção redobrada do Brasil, pois pode abrir precedentes para outras ações restritivas”, explica. Para Celli Junior, a “Lei Antidesmatamento começa pela violação do princípio discriminatório e de acordos importantes como os de medidas sanitárias e fitossanitárias”. Ele diz que a resposta inicial do Brasil foi adequada, mas é necessário um planejamento estratégico para lidar com futuras medidas protecionistas que possam surgir. O adiamento por um ano da entrada em vigor da lei é importante, segundo Celli Junior, porque vai permitir negociações entre brasileiros e europeus em questões que, a princípio, seriam tratadas judicialmente no âmbito da OMC.
Já o professor Eliezer Martins Diniz, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, ressalta que a lei reflete uma tendência inevitável diante das mudanças climáticas. “A União Europeia está claramente alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, buscando mitigar a degradação florestal e a perda de biodiversidade. Essas questões são fundamentais, especialmente porque a mudança do uso da terra é uma das principais causas das alterações climáticas”, afirma. Ele destaca que, embora as normas representem desafios adicionais para exportadores brasileiros, elas reforçam a necessidade de um posicionamento claro e proativo do País. “O Brasil precisa não apenas reagir, mas também se antecipar, criando medidas que demonstrem compromisso com a sustentabilidade global. Isso será crucial para o País assumir um papel de liderança, especialmente com a COP30 se aproximando.”
Impactos no agronegócio brasileiro
A União Europeia é destino de cerca de 15% das exportações agropecuárias do Brasil e, desse total, 34% podem ser afetados. São produtos como soja, carne bovina e café não torrado que estariam entre os mais atingidos. Diniz acredita que o Brasil possui vantagens competitivas importantes, como sistemas avançados de rastreabilidade, mas alerta para os desafios das novas exigências. “A demanda pelo georreferenciamento das áreas de produção é uma resposta às preocupações ambientais europeias, mas também pode ser vista como uma burocracia que dificulta a entrada de produtos no mercado europeu. É fundamental que o Brasil amplie a conformidade de seus produtos para evitar prejuízos no comércio exterior”, explica.

Celli Junior complementa que as medidas exigem um olhar cuidadoso sobre os interesses em jogo. “A agricultura europeia, historicamente subsidiada, pode ser beneficiada indiretamente por essas exigências. É uma mistura de interesses: ao mesmo tempo em que promovem sustentabilidade, essas normas criam barreiras comerciais significativas para países exportadores como o Brasil. Precisamos estar atentos para evitar que essas medidas fragilizem nossa competitividade”, avalia.
Os dois especialistas concordam que o Brasil deve adotar uma postura proativa e estratégica. “Essa é uma oportunidade para o País reafirmar seu compromisso ambiental. Com a COP30 em 2025, o Brasil terá um palco privilegiado para demonstrar liderança e propor soluções que equilibrem crescimento econômico e preservação ambiental. Isso será essencial para que o País mantenha sua relevância internacional”, afirma Diniz.
Celli Junior enfatiza a importância do equilíbrio entre sustentabilidade e competitividade econômica. “O desafio é alinhar práticas ambientais com as demandas internacionais sem comprometer nossas exportações. Precisamos construir estratégias que valorizem a sustentabilidade, mas que também fortaleçam o agronegócio brasileiro no mercado global”, conclui.
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