Governo deve enxergar reforma agrária como investimento

“Pesquisas apontam produtividade equivalente entre agricultura convencional e agroecológica”, diz Luiz Ramos Filho

 11/09/2019 - Publicado há 5 anos
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O ritmo de assentamento de famílias caiu nos últimos anos, depois de registrar um pico em 2006 de mais de 136 mil famílias assentadas. No primeiro semestre deste ano, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) assentou 1.374 famílias. Durante todo o ano passado, 8.872 famílias foram regularizadas em unidades agrícolas.

Luiz Octávio Ramos Filho, pesquisador da Embrapa Meio Ambiente em Jaguariúna, São Paulo, ressalta que é difícil falar de reforma agrária no Brasil, já que nunca houve um processo vigoroso e consolidado de redistribuição de terras. Ele aponta ao Jornal da USP no Ar que, em 2019, foi cortado cerca de 70% do orçamento destinado ao Programa Nacional de Reforma Agrária. “Não é possível redistribuir terras e fazer assentamentos sem recurso. O governo tem de enxergar a pauta como investimento”, aponta.

O pesquisador fala de duas formas de agricultura. A agricultura convencional, que é baseada em insumos químico-sintéticos, com foco na exportação. A outra é a perspectiva agroecológica, uma abordagem orgânica. “Chamamos de agricultura ecológica”, diz ele. O engenheiro agrônomo, formado na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, defende que é um modelo mais sustentável. “As duas categorias são importantes”, argumenta.

Dados da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário, de 2018, apontam a existência de 4,4 milhões de agricultores familiares. Eles seriam responsáveis por 38% da produção agropecuária brasileira e empregariam 74% da força de trabalho. Conforme informações da ONG Oxfam, menos de 1% dos proprietários de terra no Brasil detém, aproximadamente, 45% da área.“Nos últimos 15, talvez 20 anos, a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso, houve uma redistribuição de terras”, analisa o entrevistado.

Por isso, ele defende que o debate não pode ficar apenas na produtividade. “Hoje, existem vários exemplos de agricultura em pequena escala, que chamamos de familiar, voltada ao modelo orgânico”, expõe. O pesquisador explica que é familiar no sentido de modelo de negócios. A família gere o empreendimento e trabalha naquela terra ao mesmo tempo. São poucos empregados e os produtos podem ser a fonte de renda exclusiva desse grupo. Assim, existe uma vulnerabilidade financeira frente a grandes produtores.

“Há, inclusive hoje, dados apontando uma produtividade equivalente entre a agricultura convencional e agroecológica”, discorre Ramos Filho. Segundo o engenheiro, à medida que o ambiente da plantação se equilibra, o sistema de produção apresenta melhores resultados. Os insumos orgânicos podem ser feitos e manipulados na própria fazenda. Agrotóxicos frequentemente são caros e industriais. “Ao longo do tempo, os modelos se equivalem, ou podem ser até mais econômicos”, alega.

Em vista disso, as diferenças de resultados seriam provenientes do modelo empresarial de gestão das grandes fazendas. O agrônomo defende que o governo deve proteger esse pequeno produtor. “Além das pressões financeiras, a plantação de um vizinho tratada com insumos sintéticos pode contaminar a produção agroecológica”, esclarece. Logo, há a necessidade de garantias para quem investe no modelo.

“A sociedade quer o meio ambiente mais equilibrado, alimentos mais saudáveis à mesa, cidades menos inchadas”, conta Ramos Filho. Para tanto, é necessário enviar parte da população ao campo e dar condições para que vivam lá. “Não adianta só distribuir terra, sem dar condições de infraestrutura, água, estrada, habitação, energia elétrica e assistência técnica. Desta maneira, se fomenta um novo modelo de agricultura”, pondera.


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