Cota para mulheres nas eleições combate candidaturas laranjas

Irregularidade eleitoral é fruto do mau emprego da lei e da improbidade de partidos, afirma cientista política

 17/04/2019 - Publicado há 5 anos
Por

jorusp

Senado propõe projeto de lei que pode pôr fim à exigência de que os partidos tenham ao menos 30% de candidaturas para mulheres. O autor do projeto, senador Angelo Coronel (PSD-BA), justifica que a cota limita a “autonomia partidária” e que a medida dá brecha para candidaturas laranjas. As cotas já existiam, desde 1997, mas foi só em 2009 que os partidos passaram a ser punidos por não cumpri-las. A discussão vem em meio a uma polêmica envolvendo o uso de dinheiro do fundo partidário (que é público) para financiar candidatas laranjas do PSL nas eleições de 2018. O relator da proposta na CCJ, Fabiano Contarato (Rede-ES), deu parecer contrário e afirma que homens também são usados em candidaturas laranjas, e defende não só a permanência das cotas como um aumento do porcentual de candidaturas para 50%.

“Vemos com bons olhos a proposta do relator, e achamos que poderia ser mais. Aumentar o número de nomes nas listas dos partidos é uma medida tímida, não significa eleição dessas candidatas. A intervenção poderia se dar diretamente sobre as cadeiras”, argumenta a pesquisadora Gabriela Rodrigues Rosa, do Grupo de Estudos de Gênero e Política da USP (Gepô) da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), ao Jornal da USP no Ar. O projeto de lei foi discutido ontem (16), no Senado. O relator defendeu que a cota foi a mais importante conquista das mulheres desde o direito ao voto. Hoje, elas têm 15% de representatividade no Congresso, embora sejam 51% da população.

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Gabriela lembra que a lei de ação afirmativa existe desde 1997; porém, somente depois de 2009 foram sancionadas punições aos partidos que não a cumprissem. “As candidaturas laranjas são um meio das estruturas partidárias burlarem a cota. A inversão dessa lógica ao colocá-la como culpada pelas infrações é uma confusão. Deveria existir, na verdade, um esforço para aplicar melhor a legislação e ampliar a inclusão de mulheres na política, na medida do possível”, esclarece.

A medida, ao contrário do que propõe o autor do projeto, seria uma ferramenta para inibir a inscrição de candidatos de fachada. “Essas medidas, quando bem executadas, têm uma capacidade transformadora sobre as estruturas partidárias. Elas seriam obrigadas a dar mais financiamento, tempo de televisão e suporte humano às mulheres. Hoje, essa falta de representatividade é um dos maiores gargalos da política. Os partidos já percebem esse problema, mas sua adaptação é muito lenta”, conta a cientista política.

A pesquisadora aponta que a baixa quantidade delas no Poder Legislativo, a principal porta de entrada feminina na política, não acontece por falta de iniciativa. “Os presidentes e caciques dos partidos são quase todos homens. Então, os grupos tendem a dar mais atenção aos representantes masculinos. Por isso, se vê mulheres incisivas, pois querem ser ouvidas. Deve existir um incentivo para as mulheres conquistarem seus lugares nos espaços políticos”, diz Gabriela. “As eleições de 2018, sobretudo com o fenômeno Bolsonaro, indicam que parte do eleitorado feminino não está mais satisfeita com seu apagamento político”, completa.

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