Criminalizar falta de recolhimento de ICMS é retrocesso

Especialista em Direito Tributário discorda que o não pagamento do tributo seja apropriação indébita

 28/08/2018 - Publicado há 6 anos     Atualizado: 14/09/2018 as 18:01

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As duas turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram, por seis votos a três, que declarar ICMS e não recolher o tributo é crime. Apesar de a resolução não ter efeitos para toda a sociedade brasileira, ela uniformiza a jurisprudência do STJ sobre esses casos, que deixam de ser considerados inadimplência fiscal. Para comentar o tema, o Jornal da da USP no Ar contou com a opinião do professor Paulo Ayres Barreto, do Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP.

Foto: Nattanan Kanchanaprat via Pixabay/CC

Apesar do relator do caso considerar a prática como apropriação indébita, Barreto não concorda. O professor define a decisão como um retrocesso, pois criminaliza uma conduta do empresário que normalmente não é dolosa, já que carecem, muitas vezes, de recursos para efetuarem todos os pagamentos necessários, inclusive do ICMS. Ainda afirma que a decisão julga as relações comerciais entre empresa e consumidor de maneira utópica, pois o cliente nem sempre paga e, mesmo sem o valor devido, o empresário não é exonerado de realizar o pagamento dos tributos. Além disso, a oferta e demanda da sociedade e o cenário econômico brasileiro foram outros fatores não levados em consideração.

Segundo o especialista, a resolução do STJ vai contra a não admissão de prisão por dívidas no Brasil – exceto por pensão alimentícia. Também ressalta que a decisão contradiz súmula do Superior Tribunal Federal (STF), em que consta ser inadmissível a apreensão de mercadorias do empresário para forçar o pagamento de tributos. “Não pode apreender a mercadoria, mas pode prender o dono da mercadoria. É um absurdo”, comenta.

Barreto explica que não é bom negócio deixar de pagar tributos, pois a correção dessas dívidas é alta, e completa ao dizer que o empresário opta por uma decisão racional. Como ele não pode deixar de realizar o pagamento dos funcionários e fornecedores, sem os quais a empresa não produz, o proprietário escolhe pagar aos bancos, que possuem aplicação de juros mais alta que os tributos cobrados. Por conta da decisão do STJ, o professor ainda alerta sobre a possibilidade de aumento de sonegações de impostos por empresas, que podem preferir se arriscar e não declarar os tributos do que reconhecer a dívida do ICMS e ser processado criminalmente.

Mesmo com esse cenário, Barreto acredita que o STF possa se debruçar sobre o recurso e superar a decisão tomada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Jornal da USP no Ar, uma parceria do Instituto de Estudos Avançados, Faculdade de Medicina e Rádio USP, busca aprofundar temas nacionais e internacionais de maior repercussão e é veiculado de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 9h30, com apresentação de Roxane Ré.

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