
Segundo dados do painel Corte Aberta, as reclamações trabalhistas no Supremo Tribunal Federal (STF) aumentaram em 65% durante o ano de 2024, representando 42% do total de ações recebidas pelo órgão, porcentual que, pela primeira vez, ultrapassou as ações processuais civis. Segundo o professor Otávio Pinto e Silva, docente do Departamento de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP, a terceirização e a pejotização estão entre a grande maioria desses processos.
Para o professor, o debate sobre as duas formas de contratação têm crescido exponencialmente no País, mesmo tratando-se de duas alternativas absolutamente diferentes. A terceirização, segundo Silva, é mais “correta” que a pejotização em termos éticos, pois “significa que eu vou contratar uma pessoa para trabalhar para mim, porque eu não contratarei como empregado, não contratarei como celetista, e sim por meio de um contrato de prestação de serviços. Quer dizer, essa pessoa pode ser, por exemplo, uma MEI, uma microempresa individual que vai prestar serviços para mim num contrato de natureza civil e não trabalhista”, explica o professor, ao contrário da pejotização, um estilo de contratação direta do prestador de serviços como uma pessoa jurídica.
E, dessa forma, a origem do problema encontra-se principalmente na segunda opção, pois, segundo Silva, ao julgar a questão da terceirização à luz da Reforma Trabalhista de 2017, o STF abriu margem para questionamentos sobre as decisões da Justiça do Trabalho. E, além disso, a Constituição Federal, através do artigo 105, permite ao Supremo julgar a reclamação para preservação da sua competência e garantia da autoridade das suas decisões.

Entretanto, para o professor, o único prejudicado seria o trabalhador: “São casos em que a Justiça do Trabalho reconhece um vínculo de emprego, dizendo que houve uma fraude, que houve uma violação da legislação trabalhista na utilização da terceirização ou da pejotização e que a empresa, insatisfeita com a decisão da Justiça do Trabalho, recorre ao Supremo com o uso da tal da reclamação. Quem está perdendo, de um jeito ou de outro, é o trabalhador”.
Consequências
Após a vitória do caso e do trabalhador ter seu direito reconhecido pela Justiça do Trabalho, poderá acabar perdendo a causa após uma intervenção do STF, que, segundo Silva, é, por vezes, desnecessária. “O problema que eu vejo aí é o Supremo, muitas vezes, se debruçar sobre fatos e provas que foram extensamente analisados pelo juiz do Trabalho. Ora, não seria o papel do Supremo ler o processo para ver o que a testemunha disse, o documento, se o documento era falso ou se não era, quer dizer, não seria esse o papel do Supremo. E isso é que tem gerado muito questionamento (…) trazendo aí uma diminuição na competência da própria Justiça do Trabalho”, detalha o professor.
Sobre os usuais resultados do processo envolvendo pejotização, o professor destaca duas possibilidades. A primeira na qual a Justiça reconhece a validade da contratação como pessoa jurídica e o trabalhador recebe um valor devido pelo serviço. Já em relação à segunda opção, Silva a define como mais complexa, por formar maioria dos casos transferidos para o STF. “São situações em que o trabalhador foi contratado como PJ, mas ele consegue demonstrar, por meio de provas, como documentos, como depoimentos de testemunhas, perícias, que, na verdade, ele era um empregado que precisaria ter tido seu contrato de trabalho registrado como CLT e que a empresa não aceitou fazer isso, mascarando a relação jurídica na forma de um contrato de prestação de serviços. Quer dizer, nesses casos, a Justiça é implacável, assim afastando a validade daquele contrato de prestação de serviços e reconhecendo o vínculo empregatício com todos os direitos previstos na CLT.”
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