Produção sustentável do agronegócio: Brasil já avançou, mas ainda são necessárias mudanças

De acordo com o professor Arlindo Philippi Junior, apesar dos avanços associados à produção agrícola, alguns problemas são permanentes nesse setor e representam empecilhos tanto para o avanço produtivo como para o desenvolvimento sustentável

 21/11/2023 - Publicado há 7 meses
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Apesar dos avanços associados à produção agrícola, alguns problemas são permanentes nesse setor e representam empecilhos tanto para o avanço produtivo como para o desenvolvimento sustentável – Fotomontagem: Jornal da USP – Imagens: aleksandarlittlewolf/Freepik e studiogstock/Freepik

 

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Uma recente pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que o Brasil possui mais bois que pessoas. Enquanto a população nacional conta com cerca de 203 milhões de indivíduos, o estudo revelou que o País apresenta 234,4 milhões de cabeças de gado. Apesar da importância desse setor para a economia nacional é possível observar que o dado revela implicações diretas sobre os efeitos ambientais que esses valores podem representar. 

O Brasil, por dispor de cerca de 388 milhões de terras cultiváveis, um clima favorável e uma ampla quantidade de recursos hídricos e renováveis, conta, historicamente, com uma relevante participação econômica do agronegócio — que atualmente representa cerca de ⅓ do Produto Interno Bruto (PIB). Contudo, ainda hoje, a agropecuária é uma das maiores responsáveis pela emissão de gases do efeito estufa (GEE), sendo quase 70% dessas emissões originadas do setor pecuário, de acordo com o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG).  

Arlindo Philippi Junior, professor da Faculdade de Saúde Pública e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, avalia que, para o entendimento do tema, é também necessário compreender o significado do termo “agronegócio”, já que este representa a união das atividades agrícolas e pecuárias, que se movimentam de maneira interna ao mesmo tempo em que seus efeitos atuam em outros setores. 

Implicações

O Código Florestal de 2012 (Lei nº 12.651) é a legislação mais recente a tratar sobre a proteção da vegetação nativa e sobre a necessidade de aplicar a noção de sustentabilidade de forma ativa. Especialistas avaliam que, apesar de a lei ter colaborado com o retrocesso de alguns processos ambientais, a sua criação foi importante para o avanço de outros, como a necessidade de registro do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e a aplicação do Programa de Recuperação Ambiental (PRA). 

Arlindo Philippi Junior – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Assim, Philippi Junior também destaca que o Brasil apresenta algumas características únicas com relação à produção agropecuária, como a presença da reserva ambiental obrigatória — que define a necessidade de uma reserva legal de 20% em todas as propriedades rurais. 

Em conjunto a essa medida, nota-se também a presença de outras reservas, como as florestas nacionais e os parques, que estão diretamente ligados às diferentes pesquisas ambientais. Por esse motivo, o especialista avalia que o País apresenta um bom espaço destinado à proteção das questões ambientais, que se somam também ao avanço com relação ao uso de agrotóxicos, que vêm passando a ter um acompanhamento cada vez mais preciso em decorrência do avanço tecnológico. 

“A tecnologia e o conhecimento científico aplicado nessa tecnologia permitiram a multiplicação dos resultados da produção agrícola, com avanços e a melhoria dos processos de produção e um conjunto significativo de informações sobre cada uma das atividades e também de cuidados que se deve ter em relação à questão ambiental”, afirma o professor. 

Problemas

Apesar dos avanços associados à produção agrícola, alguns problemas são permanentes nesse setor e representam empecilhos tanto para o avanço produtivo como para o desenvolvimento sustentável. Entre eles, Philippi Junior destaca os desafios associados ao transporte, já que o escoamento dessa produção deve chegar aos diversos destinos finais, mas, para isso, é importante que os modais de transporte funcionem de maneira plena. 

Assim, enquanto em algumas regiões essa movimentação é feita de forma funcional, em outras uma série de dificuldades é enfrentada. “Quando você tem uma boa malha de transporte e um modal de transporte que permita essa movimentação, você tem uma redução das emissões. Nós temos regiões do País que têm problemas sérios de transporte e isso traz como consequência o aumento de índices, por exemplo, de emissão de carbono relacionado ao uso de mais caminhões”, explica o especialista. 

Assim, é possível observar que existem questões que atravessam outras áreas da atividade pública para o desenvolvimento sustentável. Atualmente, segundo Philippi Junior, o Brasil já conta com um número significativo de empresas que atuam no setor do agronegócio e que realizam boas práticas nos termos ambientais — muitas ligadas ao Enviroment Social Governance (EFS), termo que trata da aplicação de questões ambientais, sociais e governamentais de uma instituição. 

Futuro

Considerando esse contexto, é necessário avaliar a ação de diferentes segmentos e caracterizar a responsabilidade que cada um dos setores deve ter com relação à promoção da sustentabilidade. Uma questão que é destacada pelo professor, dessa forma, é a escala que cada tipo de empresa deve apresentar nesse debate, uma vez que as médias e grandes são capazes de contratar especialistas para realizar o seu planejamento ambiental.

Planejamento ambiental é um passo importante que pode ser adotado para garantir uma postura responsável das empresas do agronegócio – Foto: Freepik

 

Enquanto isso, os pequenos empresários não possuem as mesmas condições para oferecer esse tratamento, sendo dever do Estado fazer com que esses serviços cheguem às menores empresas, evitando que as ocorrências de práticas contrárias ao trabalho sustentável sejam fortalecidas. “O Estado deve ter o interesse em cada vez mais ter empresas, sejam elas pequenas ou médias, oferecendo produtos que tenham competitividade no preço, mas que, ao mesmo tempo, respeitem as normas que caracterizam as condições ambientais e de sustentabilidade exigidas pelo próprio mercado internacional”, adiciona o especialista. 

Para o avanço dessas medidas, também seria importante a formação de políticas públicas para o fornecimento de educação qualificada para as pessoas que trabalham nesse campo, já que, muitas vezes, indivíduos que não apresentam o conhecimento para atuar de forma correta nesses locais colaboram, sem saber, com o desperdício de produtos, materiais e produção. 

Além de capacitação, Philippi Junior comenta que é necessário olhar para a saúde dessas pessoas, ou seja, quais são as condições de serviços a serem prestados  às comunidades trabalhadoras na área da agricultura e da pecuária. Dessa forma, avalia-se que é obrigação do empregador fornecer esses serviços e é também papel estatal ter as condições de oferecer os serviços de saúde essenciais ligados à assistência básica. 

Por fim, outro ponto fundamental para essa discussão é o fornecimento de educação associada às famílias, já que é importante que esses indivíduos tenham condições para que seus filhos possam frequentar as escolas de forma regular — fator que diz respeito também à mobilidade associada ao local. 

*Estagiária sob a supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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