O cenário político nacional assiste ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomar as práticas do que se convencionou chamar, no Brasil, de “presidencialismo de coalizão”. A iniciativa tem por objetivo conquistar o apoio parlamentar necessário para que as propostas do novo governo sejam aprovadas no Congresso Nacional. Mas essa modalidade de estrutura do sistema político brasileiro se mostrou crítica em vários mandatos presidenciais do País. E é sobre esse tema que o professor e cientista político José Álvaro Moisés dedica esta sua coluna.
De acordo com ele, a principal característica desse sistema é o fato de que, em países onde existe o multipartidarismo, como no caso do Brasil, os presidentes e o seu partido não conseguem obter a maioria necessária para governar nas eleições legislativas e passam a depender do apoio de outras siglas para assegurar a governabilidade. “O presidente, eleito sem maioria, oferece, então, participação em Ministérios e postos oficiais aos partidos em troca de seu apoio nas votações de projetos de interesse do governo. O problema é que esse esquema dá aos parlamentares, que em tese apoiam o governo, um enorme poder de veto que tende a estimular o abuso de poder, como a corrupção. Os apoiadores podem cobrar um preço pela manutenção de sua lealdade”.
Na visão de Álvaro Moisés, o presidencialismo de coalizão, apesar de ser visto como fiador da governabilidade e elemento central do sistema político brasileiro, tem sido palco permanente de crises políticas e institucionais. “A experiência reatualiza uma observação do cientista político espanhol Juan Linz sobre a rigidez do sistema presidencialista, pois, diferente do sistema parlamentarista, em situações de crise política disruptiva, o presidencialismo brasileiro tem apenas duas portas de saída: eleição ou os processos de impeachment […] a primeira alternativa só está à disposição dos eleitores de quatro em quatro anos, quando se renovam os mandatos presidenciais; e a segunda, além de ser demorada e de paralisar as atividades de governo, tem o potencial de detonar efeitos como descritos […] embora seja o remédio constitucional previsto para situações-limite, em ambos os casos a qualidade da democracia fica comprometida.”
Álvaro Moisés finaliza sua coluna lembrando que “Lula ainda não tem uma base de apoio consolidada. Por causa da sua dependência de apoio político, o presidente não demitiu o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, apesar das denúncias e acusações de que foi vitima, ligadas ao uso de recursos em benefícios à sua fazenda e de diárias em deslocamento feito para atender a uma agenda privada. Está aí a base de uma possível crise, mas será necessário esperar para saber como o governo vai proceder nesse caso”.
Qualidade da Democracia
A coluna A Qualidade da Democracia, com o professor José Álvaro Moisés, vai ao ar quinzenalmente, quarta-feira às 8h30, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9 ) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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