A Organização Mundial da Saúde anunciou que a mortalidade infantil global atingiu mínima histórica em 2022: 4,9 milhões de crianças abaixo de 5 anos morreram durante o ano, ou uma morte a cada seis segundos, e mais da metade dessas mortes foram de recém-nascidos, bebês de até um mês de vida. O levantamento foi realizado pelo Grupo Interinstitucional das Nações Unidas para Estimativa da Mortalidade Infantil. No Brasil, também é observada uma queda, mas a taxa ainda é alta: cerca de 13,8 para cada mil nascidos vivos, segundo dados do Observatório da Atenção Primária à Saúde.
Conforme explica a pesquisadora Zilda Pereira da Silva, doutora em Saúde Pública pela USP, os dados de 2022 demoraram um ano para serem divulgados, pois existe muito trabalho por trás de pesquisas globais desse porte:
“Além de coletar os dados em todos os países, a OMS precisa avaliar a qualidade desses dados. Em países que não têm os dados de mortalidade infantil com o detalhamento necessário ou com uma série histórica, é preciso realizar estimativas”, afirma a pesquisadora.
“Sem dúvida, países mais desenvolvidos possuem melhores sistemas de informação e a gente não pode esquecer que, no mundo de hoje, muitos países vivem guerras. Tudo isso afeta as políticas públicas e a produção das estatísticas também,” completa Zilda.
Neonatal e pós-neonatal
A professora explica que as mortes no período pós-neonatal, que acontece entre o 28º dia e o final do primeiro ano de vida do bebê, estão intimamente relacionadas com fatores sociais: “Esse componente está mais ligado às condições de vida e acesso aos serviços de saúde. Depois que a criança sai do hospital, contam muito as condições em que ela vive, o acesso à alimentação no seu primeiro ano de vida, se ela tem acesso aos serviços de saúde para ser acompanhada. Todas essas questões vão colaborar para o índice de mortalidade”.
Já nas mortes do período neonatal, que compreende os primeiros 28 dias do bebê, contam mais as condições antes e durante o parto. José Simon Camelo Júnior, professor de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina da USP, explica que os cuidados no pré-natal são fundamentais para evitar a morte de recém-nascidos:
“O obstetra tem que fazer uma busca ativa e uma abordagem correta para detectar infecções que possam ser tratadas durante a gravidez, detectar situações de risco para hemorragias no parto, controlar a hipertensão arterial na gestante. Fazer um pré-natal adequado” expõe o professor.
Outro fator que contribui negativamente para a mortalidade infantil é a ausência de equipamentos e leitos para tratar bebês prematuros ou que nascem com alguma complicação:
“Muitos locais no País não têm essa assistência. Mesmo no Estado de São Paulo, algumas cidades de porte médio não têm uma UTI adequada e precisam encaminhar para outra cidade. Por exemplo: São João da Boa Vista encaminha para Campinas e, quando não é possível, para Ribeirão Preto”, conta Camelo Júnior.
O professor explica que isso também mostra a importância da busca ativa no período pré-natal: “O transporte de uma criança recém-nascida é sempre problemático, a criança nem sempre chega numa condição adequada. O melhor transporte para o bebê é dentro da barriga da mãe. Se vai nascer prematuro e não tem como evitar, é melhor transferir a gestante do que transferir a criança”.
A importância da vacinação
Reduzir a mortalidade infantil fez parte das Metas de Desenvolvimento do Milênio, estabelecidas após a Cúpula do Milênio da Organização das Nações Unidas. As metas foram vigentes até 2015, quando passaram por uma revisão e passaram a se chamar Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Conforme explica Camelo Júnior, durante a revisão das metas, percebeu-se que o Brasil conseguiu reduzir significativamente a morte de infantes e que o perfil dessas mortes também se alterou: “O que se observou nessa revisão das Metas do Milênio é que houve uma inversão: houve uma queda na mortalidade infantil relacionada a problemas respiratórios e diarreias e essa mortalidade se concentrou no período neonatal”.
Essa inversão se deu por melhorias de infraestrutura, com ampliação do saneamento básico, bem como melhorias no acesso à alimentação de qualidade. Mas as grandes protagonistas dessa redução drástica no número de bebês mortos foram as vacinas: “Vacinas como as da poliomielite, sarampo, rotavírus, pneumocócica, coqueluche, difteria, influenza e, agora, a da covid-19 foram fundamentais para reduzir a mortalidade de lactentes, crianças de até 2 anos de idade, que são as que mais morrem por complicações respiratórias e gastrointestinais,”, conclui Camelo Júnior.
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
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