Despoluição de rios urbanos passa pela identificação da principal fonte poluidora

José Rodolfo Scarati Martins identifica dois tipos de poluição: a causada pelo esgoto e a chamada poluição difusa, que é gerada pelo transporte de resíduos e outros contaminantes pela força das chuvas que atingem os rios

 02/09/2024 - Publicado há 6 meses
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Vista do rio Tietê, que banha a cidade paulista de Pirapora do Bom Jesus, que também aparece em segundo plano na imagem
Para realizar o tratamento das águas urbanas é fundamental identificar qual a principal fonte poluente do local – Foto: Marcos Santos
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A despoluição de rios é um processo custoso, mas pode gerar uma série de benefícios para a população urbana e para os ecossistemas aquáticos. Para a realização da Olimpíada de Paris estima-se que mais de US$1 bilhão foi gasto na despoluição do rio Sena, de modo que ele ficasse apto a receber os esportes aquáticos da competição. A Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, passou por processo semelhante para os Jogos Olímpicos de 2016, mas a qualidade da água voltou a piorar após a realização do evento. José Rodolfo Scarati Martins, professor do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental (PHA) da Escola Politécnica (Poli) da USP, discorre sobre a importância do monitoramento das águas urbanas.

José Rodolfo Scarati Martins – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Segundo o especialista, o primeiro vilão da poluição de águas urbanas são os sistemas de esgoto, que em muitas cidades são misturados com as galerias de drenagem fluvial, resultando em um sistema de tratamento inadequado no qual os dejetos não são devidamente separados e tratados antes de serem lançados nos corpos d’água. Além disso, em algumas regiões, o esgoto pode não ser coletado corretamente ou, quando é, pode não chegar às estações de tratamento devido a falhas na infraestrutura.

O outro problema destacado pelo docente é a poluição difusa, que consiste no transporte de uma mistura de poluentes atmosféricos, resíduos sólidos e outros contaminantes presentes nas cidades para os rios, através da lavagem pela força das chuvas. Ele explica que esses poluentes incluem detritos da construção civil e poluição veicular, que são arrastados para os corpos d’água, agravando a poluição e prejudicando a qualidade da água.

Tratamento

De acordo com Scarati, para realizar o tratamento das águas urbanas é fundamental identificar qual a principal fonte poluente do local. Quando trata-se apenas do esgoto, o especialista destaca que é um processo mais simples de ser executado, basta aperfeiçoar os sistemas de coleta e tratamento, através de identificação de ligações clandestinas, expansão dos sistemas de saneamento básico e transporte adequado dos dejetos.

Em relação à poluição difusa, o professor afirma que é um sistema muito mais difícil de ser monitorado e que precisa ser realizado por diversos setores, já que não é responsabilidade das companhias de saneamento. Ele destaca a importância de serem desenvolvidos sistemas de manejo dos resíduos sólidos descartados pelas cidades, pois muitos destes são lavados pela água da chuva e chegam até as águas fluviais.

“É preciso evitar, por exemplo, aqueles pontos de descarte irregular de lixo, no qual as pessoas observam aquela quantidade de lixo acumulada e acabam deixando o saco de lixo da casa delas também. Têm outras fontes também, como a varrição de ruas e a emissão de particulados da frota de veículos. A implementação de sistemas de coleta de lixo em recipientes herméticos e a realização de inspeções periódicas nos veículos para controlar a emissão de poluentes também são importantes”, analisa.

Biodiversidade

Conforme o especialista, os rios urbanos possuem um papel crucial para as cidades e atuam como restauradores dos ecossistemas aquáticos. Ele afirma que a água e as margens possuem a capacidade de atenuar as variações de umidade, reduzir as ilhas de calor produzidas pela concentração de edifícios, aumentar a circulação de ar e restaurar a fauna e a flora local.

Conforme Scarati, o rio Pinheiros, em São Paulo, é um grande exemplo de processo de recuperação de rios. Segundo ele, com as melhorias implementadas no ambiente, os níveis de oxigênio na água aumentaram e foi possível o retorno de peixes e outras plantas aquáticas no local. O docente conta que a presença desses seres vivos no rio diminui a proliferação e o espaço para desenvolvimento de vetores de transmissão de doenças, além da propagação de larvas de outros organismos que transmitem enfermidade.

Para que seja permitida a recreação de contato, ou seja, a entrada de humanos na água para natação ou outros esportes aquáticos, o professor explica que é preciso haver controle da parte biológica. Ele explica que o grande indicador da contaminação de uma água é a presença da Escherichia coli, bactéria presente em coliformes fecais. “Quando os níveis dessa bactéria estão muito baixos, até é possível a recreação de contato. Mas, se não é feito um controle da poluição difusa, em poucas semanas de chuva os níveis da água voltam a ficar ruins”, analisa.

Divisão de tarefas

De acordo com José Scarati, as táticas de despoluição podem ser aplicadas em qualquer tipo de rio, independentemente de seu nível de poluição, já que os responsáveis pelas contaminações são os mesmos em todos eles. Contudo, ele ressalta que alguns casos exigem uma maior complexidade, como o Tietê, por exemplo, cujo curso d’água estende-se por vários municípios paulistanos. Devido a isso, o professor afirma que nem sempre é a mesma concessionária responsável pela descontaminação em cada uma das estações de tratamento.

Além disso, o professor afirma que o Tietê recebe a descarga de estações de tratamento da Região Metropolitana de São Paulo. Para o docente, é fundamental que os municípios e as empresas de saneamento trabalhem conjuntamente para atingir cada um dos agentes poluentes. “Os problemas estão escancarados, a questão do esgoto é mais simples porque é só investir o dinheiro e acompanhar, mas o segundo vilão é um pouco mais complicado, mas é preciso praticar a estratégia de dividir e conquistar, ou seja, cada especialista fica responsável pelo problema de sua respectiva área, e dessa forma todos encontram alternativas para essa questão da poluição dos rios”, finaliza.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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