Sociedade em Foco #163: Plano de déficit zero pode gerar confusões no planejamento orçamentário e na formulação de políticas públicas

Segundo José Luiz Portella, o novo projeto gera incertezas e atrapalha a demanda efetiva nacional

 05/09/2023 - Publicado há 11 meses
Momento Sociedade - USP
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Sociedade em Foco #163: Plano de déficit zero pode gerar confusões no planejamento orçamentário e na formulação de políticas públicas
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O governo  precisa de R$ 168 bilhões para zerar o déficit público em 2024, segundo Simone Tebet, ministra do Planejamento e Orçamento. Fernando Haddad, atual ministro da Fazenda, admitiu que a meta é difícil de ser alcançada e que a proposta do orçamento para o próximo ano será enviada ao Congresso sem essa previsão.  

José Luiz Portella, doutor em História Econômica pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, explica que o orçamento é o pai de todas as políticas públicas, assim, para que haja uma possibilidade de fechamento, o Estado deveria realizar duas ações. 

A primeira delas seria a arrecadação governamental extra por meio do aumento de impostos temporários ou com a alteração de algum setor fora do padrão. “De uma certa forma, ele vai dar um drible no arcabouço fiscal, um drible na questão tributária ou vai ter que inventar alguma coisa para gastar menos, o que é muito difícil”, analisa o especialista. 

Assim, Portella relata que isso gera um grau de incerteza muito grande, fator que atrapalha a demanda efetiva, pois os setores privados ficam com medo de investir o seu dinheiro nesses ambientes. “Eu acho que isso vai levar a uma insegurança das políticas públicas, em um primeiro momento, ou depois algum tipo de ativação dessas políticas através de um drible. Então você passa a ter não a insegurança, mas a desconfiança no governo”, adiciona. 

O mesmo posicionamento já foi tomado em governos anteriores, como na política econômica de Paulo Guedes, em que a mesma promessa foi realizada, resultando em uma complicação ainda maior. Dessa forma, essa ação será repercutida nas políticas públicas e o projeto constitui-se como uma meta fantasma — uma vez que não aparece no orçamento. 

É importante destacar o fato de que, para que grande parte dessas questões seja realizada, é necessária a aprovação do Congresso e o aumento da arrecadação nacional. Portella destaca ainda a possibilidade de um novo caminho para esse debate, que poderia ser alcançado com o ajuste no lado da despesa pública. 

“Nós temos R$ 640 bilhões de isenções fiscais, então a gente poderia cancelar essa parte, mas, como elas têm um lobby muito grande, o governo fica com medo”, comenta o professor. Nota-se ainda que essa é uma questão não só dessa gestão, sendo possível notar sua presença em governos anteriores; por esse motivo, um corte nesse segmento seria necessário para racionalizar despesas. 

O outro caminho que para o professor não parece fazer tanto sentido, considerando o cenário brasileiro, seria o de aumentar a arrecadação — que vai em uma linha contrária ao que é desejado pelo Congresso. Por esse motivo, o especialista destaca que essa é uma medida que contribui com a confusão não só no orçamento, mas também em todas as políticas públicas.


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