O que acontece com os refugiados climáticos?

Pesquisadores explicam o movimento das pessoas desalojadas e como isso impacta o planejamento urbano

 Publicado: 11/07/2024
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Alagamentos são um dos desastres naturais que mais atingem a população – Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

 

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Nos últimos dez anos, de 2013 a 2022, mais de 2,2 milhões de moradias foram danificadas no Brasil por causa de desastres naturais, afetando 4,2 milhões de pessoas. Isso sem contar as enchentes recentes no Rio Grande do Sul, que por si só somaram mais meio milhão de desalojados. A questão é para onde as pessoas vão quando não têm como permanecer no lugar de origem, e como isso impacta o País. Pedro Jacobi, do Instituto de Estudos Avançados da USP (IEA), explica que o certo seria “modificar a lógica de planejamento urbano e, a médio/longo prazo, trazer a discussão da mudança climática para o contexto do plano diretor”. Ele afirma, no entanto, que nada disso está sendo feito por hora.

Pedro Roberto Jacobi, pesquisador do IEA USP e coordenador da série Agenda Política Pública – Foto: Reprodução/IEA- USP

O deslocamento

Enquanto guerras e perseguições políticas tendem a tornar um país inteiro inabitável, os desastres ambientais são mais localizados. A consequência disso é que as pessoas desalojadas pelo clima, diferentemente dos primeiros, tendem a não ir para muito longe. É isso que comenta Zenaida Lauda Rodriguez, também do IEA: “Geralmente o deslocamento acontece de forma interna e nas cidades mais próximas”.

A tendência é que os refugiados busquem os grandes centros urbanos, onde há a expectativa de encontrarem os recursos básicos que precisam – moradia, emprego, assistência médica e afins. A chegada dessas pessoas, segundo Zenaida comenta, acelera ainda mais a favelização e precarização das periferias.

De acordo com a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o déficit habitacional brasileiro está estimado em 5,9 milhões de domicílios. A larga maioria está localizada em áreas urbanas (5,044 milhões), representando 85%. A precarização das periferias urbanas não se deve exclusivamente ao processo dos refugiados climáticos, mas não deixa de impactar: considerando que no Brasil ainda não existem propostas de integração dessas pessoas, os efeitos negativos tendem a ser absolutos.

 

Desigualdade social

Zenaida ressalta que os refugiados têm renda e classe bem determinadas. Durante os desastres no RS, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), recomendou que as pessoas que tivessem casa no litoral passassem um tempo lá. Os que podem se dar esse benefício, é claro, são a minoria.

A pesquisadora afirma que o foco da discussão deve ser em como evitar que mais pessoas sejam obrigadas a se deslocar. “É necessário garantir os meios de vida das populações nos territórios. Isso parte das medidas de mitigação, de adaptação, para que elas não se vejam obrigadas a migrar.” Ela diz que a discussão sobre desigualdade social e planejamento urbano são inevitáveis nesse quesito.

Proposta de mudança

Mas quando o desastre está feito e as moradias destruídas, falar em prevenção já é tarde demais. Uma proposta no Congresso prevê a adoção de estratégias de apoio e reconstrução das condições de vida das pessoas afetadas, inclusive reconhecendo os “refugiados climáticos” como um grupo que existe. O projeto é da deputada Erika Hilton (PSOL) e busca estruturar medidas com relação à moradia, educação e empregabilidade.

Zenaida comenta que o Brasil “inovaria muito tendo um instrumento que formalmente reconhece dar nome a essas pessoas e cria uma política para elas”, complementando que, como uma pesquisadora da área, isso seria um “passo muito grande”. A falta de reconhecimento é o primeiro empecilho para traçar políticas públicas e planejamentos do espaço para essa população, e segundo ela, atravessar esse obstáculo é o primeiro passo no caminho certo.

*Estagiário sob a supervisão de Marcia Avanza e Cinderela Caldeira


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