Criada em maio de 2022, a Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) da USP é a única pró-reitoria da Universidade que não trabalha diretamente com ensino, pesquisa ou extensão. As chamadas atividades-fim da Universidade, no entanto, são permeadas por singularidades e relações sociais complexas. No atual momento de reconhecimento público das diferenças, a Universidade se depara com situações de desigualdade expressas na comunidade universitária. “Estamos falando de um contexto de convivência que vai me permitir desenvolver as minhas atividades, gerando inclusive alterações na produção e na agenda de pesquisas”, afirma Ana Elisa Liberatore Silva Bechara, diretora de Mulheres, Relações Étnico-Raciais e Diversidades da PRIP. Bechara diz que o estabelecimento de uma política de inclusão deve passar por planos concretos de equidade étnico-racial e de gênero.
No cargo há menos de uma semana, a penalista é professora titular da Faculdade de Direito (FD) da USP, no Largo de São Francisco, onde também cumpre a função de vice-diretora. “Temos um importante papel. Quando conseguirmos criar políticas e mudar uma cultura, seremos referência e isso se refletirá em outras instituições”, afirma. Para cumprir este ideal de ser um farol para a sociedade, porém, ainda são necessárias muitas mudanças internas. Apenas 15% de todos os docentes da FD são mulheres. O número é ainda menor quando se fala em topo de carreira. “De 40 professores titulares, nós somos quatro mulheres, só. E este ano, duas das quatro titulares se aposentarão. É um problema histórico da Faculdade de Direito e eu me vi na obrigação de carregar essa bandeira”, conta.
Ela afirma que, embora seja uma penalista e não uma pesquisadora das questões de gênero, passou a se dedicar ao tema também a pedido da comunidade, que não se via representada em espaços de tomada de decisão. Com ouvidos atentos ao que chega, ela afirma não querer apenas receber e devolver demandas, mas levar a discussão às reuniões de Congregação e rumo a uma política acadêmica estendida a todos os campi. A professora se diz otimista com o momento de visibilidade de condições e problemas que sempre existiram, mas antes eram invisíveis. “Se você, por exemplo, é mulher ou transexual e tem uma situação na Universidade, era uma questão pessoal sua. Um problema seu. Se você é deficiente, se você é negra e é tratada de outra forma, até pouquíssimo tempo atrás, era visto assim: não era uma questão institucional. Não era uma preocupação da instituição”, diz.
Ciente de que não reúne toda a representatividade que o cargo exige em si mesma, a nova diretora da área de Diversidades da PRIP se reuniu com coletivos da Universidade para desenhar, coletivamente, o que sua função exige: “Muita capacidade de interlocução e organização, saber ouvir mas fazer a costura política, para trazer essas pessoas para dentro da atuação”. Para isto, ao Jornal da USP, ela explica que pretende trabalhar com grupos de trabalhos representativos das diversidades. “Nada que é personificado funciona bem. Ainda que tenha uma pessoa extraordinária na função, sozinha ela não terá uma visão apropriada do problema.”
O resultado do desenho coletivo foi a criação de um plano de atuação: o primeiro braço é o que a diretora chama de “cuidar das pessoas e responder a demandas específicas”; o segundo é conhecer a realidade. “E não se trata só de coletar dados, mas envolver as pessoas mais interessadas nas soluções. Ouvir a realidade e trabalhar junto com ela.” Por fim, o terceiro e último braço é o desenvolvimento de políticas estratégicas para induzir a uma mudança cultural. “Nós vamos lançar, no próximo mês, um edital com todo o apoio do reitor e da vice-reitora, de 50 bolsas de pós-doutorado só para pesquisadoras e pesquisadores negros. Isto significa que estes serão os futuros docentes negros da Universidade”, comemora.