A peça Verdade, dirigida por Alexandre Dal Farra e encenada pelo grupo Tablado, está em cartaz no Teatro da USP (Tusp) até 18 de junho, agora na terceira temporada. A peça retrata a ascensão do Exército brasileiro no cenário político da história recente do País. Apesar de retratar personagens e fatos históricos, a peça não se propõe a ser documental. As situações mais internas dos fatos são ficcionais, já que não há como saber o que se passou nessas ocasiões, como explica o diretor.
O início da peça se situa em 2005, no Haiti, um dia antes de uma operação do Exército brasileiro – enviado àquele país para chefiar uma missão de paz da ONU – que resultou na morte de dezenas de civis, em Porto Príncipe, a capital haitiana. O comandante da operação era o general Augusto Heleno. Os diálogos tentam reproduzir as conversas entre os chefes militares na véspera da operação. “Não é uma tentativa de fazer uma reconstituição realista do que realmente ocorreu”, diz Dal Farra. “As cenas buscam imaginar a verdade que nem sequer os militares sabiam sobre aquilo.”
A relação paradoxal entre dois momentos da história política recente do Brasil é destacada na peça: a assinatura, pela então presidente Dilma Rousseff, da Lei 12.850/2013, que conceituou organização criminosa e regulamentou a delação premiada, e a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2018, viabilizada por aquela lei. Dal Farra enxerga no ato de Dilma uma concessão para tornar o Exército favorável ao governo petista. Entretanto, o resultado foi o contrário. “Sobre os militares brasileiros, todos os teóricos concordam em que, no Exército atual, não existe mais espaço para divergência política. Todo o Exército converge para uma perspectiva política de direita”, afirma Dal Farra.
Para caracterizar os personagens, são utilizadas máscaras de látex. As vestimentas são colocadas sobrepostas ao rosto dos atores, que as retiram conforme a cena. “Nas duas primeiras temporadas usávamos todos os clichês do militarismo, as fardas e o tom de verde militar”, explica o diretor. “Agora utilizamos as máscaras. Elas dão uma característica fundamental aos personagens, que é a estranheza. Você reconhece que é uma pessoa, mas também tem a sensação de ser uma não pessoa, meio mórbido.”
Além do general Heleno e de Dilma, o enredo inclui personagens que representam personalidades como Hamilton Mourão, Eduardo Villas-Boas, Sérgio Etchegoyen, Carlos Alberto Santos Cruz, Edson Pujol, o coronel Paulo Malhães e Aloizio Mercadante. A história se encerra em 6 de setembro de 2018, dia em que o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro leva uma facada em Juiz de Fora (MG).
Nesta terceira temporada, Verdade se faz ainda mais importante para refletir sobre as decisões a serem tomadas após o fim do governo Bolsonaro, considera Dal Farra. Lembrando a Leia da Anistia, de 1979, que ignorou os crimes cometidos pela ditadura militar (1964-1985), Dal Farra questiona: “O lema ‘Sem Anistia’ vai ficar restrito só aos civis e aos militares de patente baixa com o governo Lula? Ninguém da alta patente será punido para o PT negociar o poder com o Exército? Estamos correndo ainda mais riscos ao não olhar para o problema agora”.
A peça Verdade, do grupo Tablado, com direção de Alexandre Dal Farra, está em cartaz até 18 de junho, de quinta-feira a sábado, às 20 horas, e domingos, às 18 horas, no Teatro da USP, o Tusp (Rua Maria Antonia, 294, Vila Buarque, região central de São Paulo, próximo às estações Santa Cecília e Higienópolis-Mackenzie do Metrô). O ingresso custa R$ 40,00 (inteira) e pode ser adquirido na plataforma Sympla e na bilheteria do Tusp. Mais informações estão disponíveis no site do Tusp.