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Um momento de retomada
USP Pensa Brasil é um convite à reflexão sobre questões fundamentais do País

Debate no primeiro dia do evento reuniu André Singer, Danilo Santos de Miranda, Ailton Krenak e Alexandre Saes – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
“Vivemos um momento de retomada. Se o trauma da crise do coronavírus teve algum papel positivo, toda a crise o tem; no caso da Universidade teve o condão de nos mobilizar na medida em que aprofundou a nossa consciência sobre o papel civilizatório da instituição, do compromisso particular da USP com a sociedade brasileira, com o Brasil.”
Na frase da vice-reitora da USP, Maria Arminda do Nascimento Arruda, na abertura do seminário USP Pensa Brasil, nesta segunda-feira, 29 de agosto, a palavra retomada significa que, depois de colaborar ativamente com o Brasil para a superação da tenebrosa crise do coronavírus, a Universidade de São Paulo pretende, mais do que nunca, colaborar com a sociedade a superar as crises, políticas, econômicas, sociais, em que o País patina longamente.

Maria Arminda do Nascimento Arruda – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

“Uma forma da USP dialogar sobre as questões centrais brasileiras”
Este é o objetivo do seminário “USP Pensa Brasil” que acontece a partir deste 29/8
“O aprofundamento dos problemas deste país, que parece ter perdido o rumo, passou a exigir que as nossas portas sejam integralmente abertas para encaminharmos soluções para os nossos impasses”, acrescentou. “USP Pensa Brasil é um convite à reflexão sobre questões fundamentais de nosso país, dos nossos dilemas, articulando a nossa voz autoral, somando-se a outras vozes que, na mesma sintonia, têm buscado encaminhar saídas”, apontou. E definiu: “USP Pensa Brasil afirma o papel inexcedível da USP como interlocutora, porta a esperança de mudança em direção a um país com outra envergadura”. Na sua concepção, a proposta é aprofundar o exercício “de pensar o Brasil e pensar com o Brasil”.
“Essa é uma tarefa que não cabe exclusivamente à Universidade. Não acreditamos que a complexa sociedade contemporânea pode ser captada em sua complexidade pela Universidade. Mas a USP deve se posicionar, mantendo seu compromisso com o bem-estar e com a justiça social, com a democracia e a sustentabilidade, com um projeto civilizatório”, acrescentou o professor Alexandre Macchione Saes, diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin e coordenador curatorial do USP Pensa Brasil.

Alexandre Macchione Saes – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
O Brasil do século 21
Lastreada em uma apresentação rica em telas com quadros e desenhos que expressam diversas interpretações de momentos da Independência brasileira, a professora Lilia Schwarcz ilustrou sua palestra Como Pensar o Brasil do Século 21?.
Demonstrou como há vários quadros que ilustram o momento em que d. Pedro I proclamou a Independência no Riacho do Ipiranga, em São Paulo, sendo o mais célebre o de Pedro Américo, pintado no fim do século 19, bem como as celebrações do ato de libertação junto à corte do Rio de Janeiro. Baseada na interpretação do historiador Hobsbawn de que o século 20 só começou a partir de 1918, simultaneamente à Primeira Guerra Mundial e à gripe espanhola, abriu as portas à interpretação de que, pelo menos para o Brasil, o século 21 começaria a contar a partir de agora, 2022, em função das efemérides que este ano reúne.

Lilia Schwarcz – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
“Vivemos um grave, imenso, desagradável quadro de desigualdades dentro da sociedade brasileira”, afirmou Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc, em São Paulo, ao abrir a sessão de debatedores na abertura do seminário. “Para tentar resolvê-lo, o papel da educação é fundamental; educação e cultura são direitos de todos”, acrescentou.
Mas, na interpretação do escritor, líder indígena e ambientalista Ailton Krenak, um dos mais aplaudidos entre os palestrantes, a sociedade deveria pensar em termos de florestania, não apenas de cidadania, que só leva em consideração a experiência urbana e não a de todos os membros da sociedade.
Krenak manifestou estranheza com o distanciamento que os brasileiros mantêm dos “hermanos” latino-americanos, dentre eles especialmente os indígenas. “Limitam-se a viver dentro das estruturas que os colonizadores portugueses nos deixaram, ao invés de procurar criar estruturas mais permeáveis. Por que não parar de reproduzir o colonialismo como se fosse o nosso destino? Temos a possibilidade de inventar tudo de novo.”
Falando para os jovens de 20, 30 anos no auditório, Krenak colocou: “Que tal a experiência de vivermos como sujeitos coletivos? Nos constituirmos numa vasta rede com experiência coletiva?”. Recomendou um olhar para “as instituições que não conseguem acolher todo mundo.” E ressaltou que a “experiência da vida não é a poupança”, no sentido de acumular bens e riquezas. “É fruição.”

Ailton Krenak – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Singer crê que essa pergunta continua atual. “Tal como ocorreu em 1964”, lembra, “quando Raízes do Brasil, publicado trinta anos antes, ganhou grande atualidade, a questão democrática que conclui o volume volta a estar no centro do debate.”
“Mais do que isso”, ressalta ele, “a crise política dos últimos sete anos atualizou uma relação entre desigualdade e democracia assinalada no texto”.
E qual é a atualização?

André Singer – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
Singer a explicitou citando como Antonio Candido traduziu em suas palavras, no prefácio, o raciocínio de Sérgio Buarque de Holanda: “Para a democracia vingar é preciso das camadas oprimidas da população, únicas com capacidade para revitalizar a sociedade e dar um novo sentido à vida política”.
Abertura do seminário USP Pensa Brasil

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