O novo número da Revista USP que acaba de sair em sua versão on-line trata de um aspecto da sociedade brasileira que, por mais, que se discuta, nunca é o suficiente em um País tão carente de soluções: a educação pública. Em seu dossiê “Ensino Público”, o número 127 da revista traz sete artigos que, de várias formas, apontam desafios e possíveis saídas para a questão educacional brasileira. “No momento em que a sociedade, de modo geral, se vê acuada diante de uma pandemia de proporções bem acima daquilo que a promessa de uma civilização altamente tecnológica e avançada parecia poder controlar num passe de mágica, só a educação é capaz de minimizar os efeitos, já tão devastadores, seja na saúde ou na economia, e evitar que a situação se torne – como já aconteceu – um caso de polícia”, afirma o editor da Revista USP Jurandir Renovato em seu editorial. E continua ele, relembrando o pensador francês Edgar Morin — próximo de seus 100 anos de vida –, afirmando que a educação é ferramenta não só de transmissão de conhecimento mas, sobretudo, de “transformação da nossa forma de pensar”.
É justamente sobre esses caminhos para transformar a forma de pensar e de se relacionar com o mundo que tratam os textos do novo dossiê da revista, na verdade o primeiro de uma trilogia: depois de “Ensino Público”, organizado pelo professor Evaldo Piolli, da Faculdade de Educação da Unicamp, a publicação apresentará, em seus dois próximos números, os dossiês “Saúde Pública” — organizado por professores da Faculdade de Saúde Pública da USP — e “Segurança Pública”, organizado pelo sociólogo e jornalista Bruno Paes Manso, do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV-USP). “Os trabalhos aqui reunidos apresentam resultados de pesquisas e ensaios, bem como análises sobre a luta histórica pela escola e universidade públicas no Brasil e sobre o contexto atual marcado por uma agenda conservadora e ultraneoliberal, que coloca o ensino público sob ameaça desde a educação básica ao ensino superior”, afirma Piolli na apresentação aos artigos. “Os autores não se furtaram de analisar o momento atual marcado pela pandemia da covid-19 e os efeitos à escola e à universidade, pois a pandemia aprofundou e explicitou ainda mais as já conhecidas desigualdades sociais e educacionais no Brasil. Nas escolas de educação básica de todos os níveis e modalidades, as condições precárias pré-pandemia foram agravadas, na atual crise, em termos de oferta e de trabalho aos professores, de modo a colocar novos problemas a serem enfrentados daqui em diante”, escreve ele.
Escola pública e trabalho docente
Esses antigos e novos problemas da educação brasileira são analisados em textos que tratam dos desafios da escola pública frente ao projeto civilizatório burguês, a condição de trabalho dos professores e sua consequente e inaceitável desvalorização, o empreendedorismo e a privatização no ensino, a reforma no Ensino Médio, um balanço sobre o Fundeb — o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação — e o trabalho remoto na Educação Superior. Os autores — oriundos de instituições como Unicamp, USP, Uerj, UFMG e Unesp — traçam um retrato preciso da atual situação educacional no Brasil em seus mais diversos matizes e apresentam caminhos para uma reflexão aprofundada e necessária.
“Na história da educação brasileira a desvalorização entendida como destituição dos professores de participação nas políticas educacionais decorre da tradição conservadora constituída desde o Brasil Colônia e reincide impondo à categoria, no ensino público e privado, o papel de agente executor da educação escolar, alijado das elaborações, deliberações e implantação das legislações”, escrevem os professores Áurea de Carvalho Costa e Robson da Silva Rodrigues, do Departamento de Educação da Unesp em Rio Claro, em seu artigo “Imprescindíveis e silenciados: desvalorização dos professores e destituição da participação nas decisões políticas”.
Já os professores e pesquisadores José Claudinei Lombardi, da Unicamp, e Anselmo Alencar Colares, da Universidade Federal do Oeste do Pará, escrevem no artigo “Escola pública, projeto civilizatório burguês versus práxis emancipadora”: “A escola pública, portanto, corresponde às lutas que marcaram a sua produção histórica e seus diferentes contextos. da multiplicidade de escolas concretas, buscamos uma definição suficientemente ampla para representar as diversas formas de escolas que nos desafiam a pensar sua complexidade e a afirmar que não há uma escola idealizada, perfeita, imutável. Há escolas de vários tipos e correspondentes a diferentes projetos societários”.
Além do dossiê — carro-chefe da Revista USP –, a publicação ainda traz as seções “Textos”, “Livros” e “Artes” — esta última, com uma particularidade. Coordenada por Alecsandra Matias de Oliveira professora do Celacc (ECA/USP) e pesquisadora do Centro Mario Schenberg de Documentação da Pesquisa em Artes, essa seção da revista — intitulada “Gaiola e asas” — apresenta trabalhos de artistas como Anita Malfatti e Wagner Leite Viana que têm a educação como tema. As duas próximas edições da revista, que completam a trilogia, também terão a seção “Artes” coordenada por Alecsandra e com temáticas artísticas relacionadas à saúde pública e à segurança pública.
Revistas da USP
A seção Revistas da USP é uma parceria entre o Jornal da USP e a Agência USP de Gestão da Informação Acadêmica (Águia) que apresenta artigos de autores de diversas instituições publicados nos periódicos do Portal de Revistas USP.
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