Pode parecer estranho, mas é uma prática comum nos cursos de odontologia o treinamento de anestesia local pelos estudantes nos próprios colegas. Uma parceria entre pesquisadores da USP deu origem a um simulador que pode ser uma alternativa para este treino prático, pois permite que o aluno tenha as sensações táteis do procedimento odontológico. Trabalharam juntos especialistas da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), da Escola Politécnica (Poli) e da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB).
A comunidade da FOB sentia necessidade de trazer novas tecnologias para o preparo de seus futuros dentistas, e um simulador poderia ajudar a suprir essa demanda. O projeto foi desenvolvido ao longo do doutorado de Cléber Gimenez Corrêa, que foi co-orientado pela professora Fátima de Lourdes dos Santos Nunes Marques, da EACH, e o professor Romero Tori, da Poli.
O trabalho foi iniciado no Laboratório de Tecnologias Interativas (Interlab), da Poli, e continuado em conjunto com o Laboratório de Aplicação de Informática na Saúde (LApIS), da EACH, unindo, assim, a experiência em simulação na área de engenharia, da Poli, à experiência em treinamento virtual na área da saúde, da EACH. A professora Maria Aparecida Andrade Moreira Machado, diretora da FOB, colaborou, junto ao Laboratório de Simulação e Treinamento (LaSiT) da mesma faculdade, fornecendo especificações e dados para a construção de um “paciente virtual” realista.
A EACH ficou responsável por implementar e avaliar a interação háptica (sensação tátil) no simulador quando o estudante manipula a seringa e sente as estruturas anatômicas – língua, mucosa, mandíbula e pele – no contato com a agulha, bem como o comportamento do anestésico e do sangue. A unidade do campus USP Leste também contribuiu gerando testes automáticos que verificam o funcionamento do programa, economizam tempo e aumentam a produtividade comparativamente aos testes manuais.
Fátima Marques afirma que o maior desafio do projeto foi tornar a simulação suficientemente realista, pois ela tem que responder de imediato à ação do aprendiz. “A aparência do paciente virtual também deve ser realista. Essas obstáculos são difíceis de superar, mas técnicas avançadas de processamento gráfico permitiram contorná-los”, conta a professora.
A pesquisa foi dividida em duas partes. A primeira foi iniciada em 2012, com criação de um primeiro protótipo do simulador de realidade virtual para treinamento, finalizado em 2014. Em 2016, deu-se início à segunda parte, que incluiu a implementação e avaliação da interação háptica em uma segunda versão do simulador de realidade virtual, a simulação do comportamento de anestésico e sangue, e a automatização da atividade de teste de software para sistemas com interfaces hápticas.
A finalidade do dispositivo baseado em sistema computacional é auxiliar no treinamento de dentistas, especialmente na aplicação de anestesia. Há poucas ferramentas disponíveis para esse tipo de treinamento, e os estudantes normalmente treinam nos próprios colegas. Além disso, o bloqueio do nervo alveolar inferior, que está ligado aos dentes incisivos, caninos, pré-molares e molares inferiores, apresenta uma alta taxa de insucesso por parte dos estudantes. Com a aplicação de técnicas computacionais e a utilização de dispositivos de realidade virtual, é possível construir ambientes virtuais para treinamento, com modelos para representar instrumentos, como agulhas e seringas, e estruturas anatômicas, como crânio, língua, mucosa e pele.
Fátima afirma que a simulação já é suficientemente realista e que foi aprovada por profissionais da odontologia, tanto que a FOB já está preparando um laboratório e adquirindo dispositivos hápticos, que fornecem a sensação tátil, para inserir o simulador no curso de graduação em Odontologia. Os testes de software continuam e os respectivos laboratórios da Poli e da EACH ainda estão trabalhando para melhorar o simulador. Para isso, estão buscando implementar visão estereoscópica para proporcionar visualização tridimensional e maior imersão do estudante, simulação do fluido anestésico dentro da seringa e elementos lúdicos, como pontuação e trilha sonora. Ainda pretende-se adicionar outras situações de simulação, uma vez que o atual permite apenas simular o bloqueio do nervo alveolar inferior.
Créditos
O projeto tem a participação da professora Fátima Marques, do professor Hélton Hideraldo Bíscaro e do aluno Matheus A. Ribeiro, da EACH; dos professores Romero Tori, da Poli, e Maria Aparecida Andrade Moreira Machado, da FOB. Também fazem parte do grupo o pós-doutorando Cléber Gimenez e a doutoranda Elen Collaço de Oliveira, da Poli. O trabalho conta ainda com o auxílio dos alunos da graduação realizando iniciação científica Lucas B. Capalbo, da EACH, e Gustavo Wang, da Poli, além do estagiário Lucas Sallaberry, também da Poli.
O Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Medicina Assistida por Computação Científica (INCT-Macc) apoiaram a pesquisa.
Com informações da Assessoria de Comunicação da EACH
Mais informações: e-mail fatima.nunes@usp.br