A partir de experiências conhecidas na Argentina e no Nordeste brasileiro, foi elaborado um mapa de possibilidades no território paulista, envolvendo o possível encontro entre universidades públicas e unidades prisionais – Foto: Acervo DEP / SUAPI
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Pesquisa realizada na Faculdade de Educação (FE) da USP questiona a responsabilidade das universidades públicas quanto a ações educativas nas unidades prisionais. As experiências no Brasil são pontuais, mas alguns trabalhos implementados com sucesso em universidades da Argentina e do Nordeste brasileiro servem de inspiração para instituições de ensino de São Paulo, que possui a maior população carcerária do País – cerca de 240 mil pessoas privadas de sua liberdade.
A presença da universidade pública na prisão é um compromisso com a sociedade e um posicionamento político no enfrentamento quanto à questão do encarceramento, relata Carolina Bessa Ferreira de Oliveira, autora do estudo. Em busca de argumentos para defender sua tese, entre os anos de 2014 e 2016, a pesquisadora visitou instituições para levantar informações sobre eventuais práticas educacionais, envolvendo o tripé de ensino, pesquisa e de extensão, que fossem realizadas com pessoas que estivessem encarceradas. Na Argentina – Universidade Nacional de Córdoba (UNC) e Universidade de Buenos Aires (UBA) – e no Nordeste brasileiro – Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) –, conheceu algumas iniciativas que julgou que poderiam contribuir para a atuação das universidades públicas em território paulista – como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp).
Na UBA – Argentina, por exemplo, um programa formalizado há cerca de 30 anos entre a universidade e o Serviço Penitenciário Federal oferecia, entre outras atividades, formação superior aos presos condenados e/ou provisórios. As ações aconteciam em prédio instalado dentro de um complexo penitenciário e com infraestrutura própria. Eram cursos de graduação em Letras, Filosofia, Direito, Sociologia, Psicologia, Contabilidade e Administração de Empresas. De extensão, eram oferecidos cursos livres, atividades culturais, de formação livre, recreativas ou artísticas, seminários, grupos de estudos e conferências, além de monitorias por parte de estudantes.
No Brasil, a UEPB, que está situada em Campina Grande, na Paraíba, também conta com uma experiência pioneira nessa área. Por iniciativa de uma ex-reitora, Marlene Alves de Sousa Luna, em 2011, foi construído um campus dentro do complexo prisional conhecido como “Serrotão”. Inicialmente, foram oferecidos cursos de cabeleireira, para mulheres, e de garçom, para homens, além de oficinas de extensão (música, leitura e educação física), aulas de pré-Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) e atendimentos jurídicos. Segundo Carolina, a estrutura física deste campus é ampla: conta com oito salas de aulas, fábrica de pré-moldados, bibliotecas, berçário para os filhos, salão multiuso, oficinas de aprendizagem e salas de informática, leitura e vídeo.
Das experiências conhecidas, Carolina de Oliveira pontuou que o engajamento dos professores e dos alunos foi fator primordial na consecução e manutenção das atividades por parte da universidade, para além de seus muros. Porém, ressalta que a regulamentação institucional em âmbito de Reitoria também se faz necessária porque garante espaço legitimado dentro da própria universidade, avalia.
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Levantamento feito, na ocasião da pesquisa, junto à Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU) da USP, não identificou nenhum trabalho institucionalizado nesta pró-reitoria relacionado à educação em contexto de privação de liberdade, com exceção de pesquisas ou de projetos vinculados a faculdades, como a de Direito, do Largo São Francisco, e iniciativas pela Faculdade de Educação (FE).
A partir deste contexto, Carolina elaborou um mapa de possibilidades no território paulista, envolvendo o possível encontro entre universidades públicas, e seus campi, e unidades prisionais. O objetivo seria problematizar a questão do encarceramento em massa e, de outra parte, considerar o papel privilegiado e educativo da universidade pública – “sobretudo a partir da extensão como elo com a sociedade”, explica. Desta forma, recomenda maior envolvimento das universidades públicas com a questão. Segundo a pesquisadora, “o acesso à educação, escolar ou não escolar, no sistema prisional potencializa outros direitos sociais dos presos – aumento das possibilidades de empregabilidade, continuidade dos estudos e a maior participação social”, conclui.
A tese A educação nas prisões brasileiras: a responsabilidade da universidade pública foi defendida em agosto de 2017 na Faculdade de Educação (FE) da USP sob orientação do professor Roberto da Silva.
Mais informações: e-mail carolbessa@usp.br ou cbessafo@gmail.com, com Carolina Bessa Ferreira de Oliveira.
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