Hormônio masculino trata alguns casos de anemia aplástica, cirrose hepática e fibrose pulmonar

Novo tratamento a caminho dos consultórios médicos: o pesquisador Rodrigo Calado, do Centro de Terapia Celular de Ribeirão Preto, conta as vantagens e os riscos de combater a cirrose hepática, a fibrose pulmonar e a anemia aplástica com hormônios masculinos. Em experimento, Calado e outros colegas conseguiram obter resultados inesperadamente positivos em doenças causadas pelo encurtamento dos telômeros.

 06/06/2016 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 18/10/2019 às 11:34
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Pessoas com cirrose no fígado, fibrose no pulmão ou um defeito na medula óssea que diminui a produção de células do sangue melhoraram os sintomas das doenças ao tomar o anabolizante Danazol. O hormônio preservou e até alongou os telômeros – partes finais do cromossomo que protegem o DNA dentro das células.

O tratamento funcionou nos casos em que o encurtamento dos telômeros era a causa das doenças.

Quem conta essa história promissora é Rodrigo Calado, médico hematologista do Centro de Terapia Celular (CTC) da USP em Ribeirão Preto, em entrevista a Ana Paula Chinelli e Mônica Teixeira. A pesquisa foi publicada por Calado e colegas no The New England Journal of Medicine.

Calado explica que, à medida que envelhecemos, os telômeros encurtam gradativamente. Como consequência, perdemos aos poucos essa proteção do material genético.

Em algumas pessoas, a perda dos telômeros acontece de forma mais rápida. Em muitas delas são constatadas doenças como fibrose pulmonar, cirrose hepática e anemia aplástica.

De acordo com o artigo, hormônios masculinos têm sido utilizados para tratar a insuficiência da medula óssea desde a metade do século 20. Os pesquisadores resolveram expandir a abordagem para outras “doenças dos telômeros”.

Os pacientes receberam o tratamento com Danazol por dois anos. Calado esperava que os telômeros encurtassem em um ritmo mais lento e, assim, a progressão das doenças ficasse mais lenta também. Mas os resultados surpreenderam em pelo menos metade dos casos: os telômetros cresceram!

“A gente conseguiu demonstrar, pela primeira vez em seres humanos, que conseguimos modular o comprimento do telômero farmacologicamente, in vivo“, comenta.

Este vídeo – disponível na versão online do artigo, em inglês – mostra como foi feita e quais os resultados da pesquisa.

 

O que o vídeo conta

Telômeros são sequências repetidas de nucleotídeos ao fim de cada cromossomo. Com o tempo e as sucessivas replicações do DNA, os telômeros encurtam. Telômeros encurtados estão ligados a várias doenças, incluindo falência da medula óssea. Hormônios masculinos são úteis para tratar síndromes que envolvem a falência da medula óssea. Em culturas de tecidos e modelos animais, hormônios masculinos regulam a expressão do gene da telomerase. Danazol é um hormônio sintético que aumenta o nível de testosterona e estimula os receptores de hormônios sexuais. Os autores do novo estudo questionaram se pessoas que tomassem Danazol teriam o ritmo do encurtamento dos telômeros diminuído. Em um ensaio de fase 1 e 2, 27 pacientes com telômeros encurtados e pancitopenia (deficiência de glóbulos brancos, vermelhos e plaquetas) receberam 800 mg de Danozol, por via oral, diariamente, durante 24 meses. A primeira meta do estudo era reduzir em 20% a taxa de desgaste dos telômeros nesses dois anos. O estudo foi parado antes, quando todos os 12 pacientes que começaram primeiro atingiram a meta. Em seguida, os 27 pacientes foram analisados e, surpreendentemente, quase todos tiveram crescimento dos telômeros. A média da maioria dos aumentos foi de 386 pares de bases. Respostas imunológicas ocorreram em 10 dos 12 pacientes que foram seguidos por 24 meses, incluindo aumento de hemácias, neutrófilos e plaquetas – em parte dos casos levando o paciente a se tornar independente de transfusões de sangue. Os efeitos adversos conhecidos do Danazol foram frequentes, mas de baixo grau, e incluíram a elevação do nível de enzimas do fígado e cãibras musculares. Os autores concluíram que foi conseguida a preservação farmacológica do comprimento dos telômeros em pacientes com doenças dos telômeros. Os dados estão disponíveis em NEJM.org


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