“Série Energia”: Acesso à energia elétrica revela desigualdade social no Brasil

Índice Gini, que mede desigualdade de renda, passa a medir consumo de eletricidade e de fontes de energia moderna

 Publicado: 05/07/2024
Por
De carvão a energia solar, a desigualdade social no Brasil também aparece no consumo de eletricidade – Foto: Joe / Pixabay
Logo da Rádio USP

O Atlas de Eficiência Energética de 2023, da Empresa de Pesquisa Energética, um instituto de pesquisa científica localizado no Rio de Janeiro, foi divulgado recentemente e teve, como sempre, um capítulo especial dedicado ao setor residencial. Os índices de Gini de eletricidade e de energia moderna são métricas importantes para medir a desigualdade no acesso e consumo de energia entre diferentes classes de renda dentro de um país. Assim como o índice de Gini tradicional, utilizado para medir a desigualdade de renda, esses índices variam de 0 a 1, onde 0 representa igualdade perfeita e 1 representa desigualdade máxima. No contexto do consumo de energia, esses índices ajudam a identificar quanto do consumo de eletricidade e de fontes de energia modernas está concentrado em determinados segmentos da população.

No Brasil, a análise dos índices de Gini de eletricidade e de energia moderna no setor residencial revela uma desigualdade significativa. Energia moderna é aquela energia que atende às necessidades atuais sem comprometer as futuras gerações, considerando principalmente aspectos ambientais, econômicos e sociais. De acordo com os dados apresentados, tanto o índice de Gini de eletricidade quanto o de energia moderna diminuíram entre 2005 e 2014, indicando uma redução na desigualdade. No entanto, a partir de 2015, essa tendência se inverteu, e os índices voltaram a aumentar, sugerindo uma maior concentração de consumo de energia nas classes de renda mais altas​.

Essa desigualdade pode ser atribuída a vários fatores. Primeiramente, as classes de renda mais baixas no Brasil tendem a depender mais de fontes de energia convencionais, como lenha e carvão vegetal, enquanto as classes mais altas utilizam predominantemente eletricidade e outras fontes modernas de energia. Essa diferença de consumo está intimamente ligada ao acesso e à capacidade de pagamento por serviços energéticos mais eficientes e menos poluentes. Além disso, políticas de universalização da eletricidade, como o programa Luz para Todos, do governo federal, tiveram sucesso em aumentar o acesso à eletricidade, mas não eliminaram totalmente a desigualdade no consumo de energia.

Quando comparamos o Brasil com outros países, observamos que o consumo de energia per capita no setor residencial brasileiro é significativamente menor do que em países desenvolvidos. Por exemplo, o Canadá e os EUA têm um consumo de energia per capita no setor residencial muito superior ao do Brasil. Essa diferença pode ser atribuída ao maior desenvolvimento econômico desses países, que permite um acesso mais amplo e equitativo a serviços energéticos modernos​. Países desenvolvidos geralmente apresentam menores índices de Gini para consumo de energia devido a políticas mais eficazes de distribuição de renda e acesso a serviços energéticos.

No entanto, a comparação internacional também revela que o Brasil não está sozinho nessa situação. Outros países em desenvolvimento, como Colômbia e Marrocos, apresentam padrões de consumo de energia residencial semelhantes ao do Brasil, com baixo consumo per capita e alta desigualdade. Isso destaca um padrão global onde países em desenvolvimento enfrentam desafios semelhantes em termos de acesso equitativo a serviços energéticos.

Para enfrentar esses desafios é crucial implementar políticas públicas eficazes que promovam a eficiência energética e o acesso equitativo a fontes modernas de energia. Iniciativas como o Programa de Eficiência Energética (PEE) no Brasil têm sido importantes para reduzir o consumo de energia em residências de baixa renda através da substituição de equipamentos obsoletos por alternativas mais eficientes. No entanto, mais esforços são necessários para ampliar essas iniciativas e garantir que todas as famílias tenham acesso a serviços energéticos modernos e sustentáveis.

Em conclusão, os índices de Gini de eletricidade e de energia moderna são ferramentas essenciais para entender a desigualdade no consumo de energia no Brasil e no mundo. A posição do Brasil, comparada a outros países, revela a necessidade de políticas mais robustas para promover a igualdade no acesso à energia, um passo crucial para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e garantir um futuro energético mais justo e sustentável para todos.

A Série Energia tem apresentação do professor Fernando de Lima Caneppele (FZEA), que produziu este episódio com Murilo Miceno Frigo, discente de doutorado e professor do Instituto Federal do Mato Grosso do Sul (IFMS). A coprodução é de Ferraz Junior e edição da Rádio USP Ribeirão. Você pode sintonizar a Rádio USP Ribeirão Preto em FM 107,9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo no celular para Android e iOS.

 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.