A Câmara dos Deputados poderá apreciar os destaques com sugestões de mudanças ao texto-base da nova Lei de Licitações, após semana conturbada pela votação da reforma da Previdência. Aprovado no dia 25 de junho, o projeto define um novo marco legal para União, Estados e municípios para execução de obras e para a aquisição de bens e serviços e estabelece a criação do Portal Nacional de Contratações Públicas . O texto substitui a Lei 8.666, de 21 de junho de 1993, que trata de licitações e contratos da administração pública.
O novo portal, que deverá ser instituído pelo Executivo federal e terá abrangência em todos os entes da Federação, pretende contribuir para a diminuição de custos de transação e aumentar a competitividade dos processos licitatórios. A medida pretende garantir a conclusão do contrato em caso de dificuldades enfrentadas pela empresa. O texto também define a obrigatoriedade de autoridades e agentes públicos do órgão licitante atuarem para coibir irregularidades, com apoio dos setores jurídico e de controle interno. Mas para o professor Vitor Rhein Schirato, do Departamento de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da USP, a nova lei apenas consolida o sistema de contratação pública vigente no Brasil.
Em entrevista ao Jornal da USP no Ar ele alega que apesar de boas iniciativas, como o portal único para anunciar editais e processos, garantindo maior transparência, não há muito de novo. As jurisprudências e leis subsequentes, a exemplo da do Pregão (Lei 10.520/2002), e a referente ao Regime Diferenciado de Contratação (RDC) (Lei 12.462/2011), já garantiam a aplicação da Lei 8.666 com resultados parecidos com o proposto pelo novo texto. “Me parece uma lei extremamente burocratizante. Não mudaram os pontos essenciais, a meu ver”, aponta.
“Uma alteração extremamente importante seria a necessidade de um atestado de competência por um órgão fiscalizador brasileiro. A partir disso, não se consegue trazer empresas estrangeiras, então o mercado continua fechado. Se eu limito o número de competidores, não haverá competição”, explica Schirato. O jurista diz que um dos erros básicos da legislação é engessar o administrador, pela premissa que a discricionariedade (liberdade de atuação do agente público) é a fonte da corrupção. Em vista disso, surgem implicações perniciosas como o inciso 1 do artigo 65 da Lei 8.666, que foi mantido no novo texto. “Permite a mudança do contrato para melhor adequação do projeto. Parte das explicações do grande fenômeno de aliciação visto no Brasil nos últimos anos, que passaram incólumes em agências reguladoras”, descreve.
Outro ponto importante seria esclarecer e flexibilizar as formas de contrato, diz o professor. “A lei prevê um formato para cada situação, isso confunde e impede a criação de novos instrumentos. O direito civil, há 100 anos, previa uma categoria para cada negociação diferente. Evoluir para ser um bom referencial”, exemplifica Schirato. Para ele, estamos presos ao modelo francês, no qual o Estado tem mais poderes que a iniciativa privada em acordos. Isso encarece a prestação de serviço, em razão da insegurança de quem faz a proposta. Na Europa, berço do sistema adotado aqui, esse modelo só é aplicado em contratos de alto interesse público, como grandes obras, ou em procedimentos envolvendo prestação de serviços públicos.
“A União Europeia, por sinal, adequou seu regime contratual público quatro vezes durante o tempo de vigência da Lei 8.666. A última alteração, em 2013, já é desmembrada por setores e muito mais flexibilizada. Inclusive acabou com a figura do tal do contrato público, o que gerou uma resistência enorme”, argumenta o jurista. Ele justifica as poucas mudanças com a manutenção das formas contratuais, a exemplo do consolidado pregão (licitação na qual o melhor preço ganha). São mantidos também a concorrência, o concurso e o leilão.
O pregão, polêmico quando envolve grandes empreitadas, já que não garante capacidade de execução e foi proibido em projetos de engenharia e arquitetura.
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