Ao falar sobre o resultado do pleito deste domingo para a edição especial do Jornal da USP no Ar, sobre a repercussão das eleições, o cientista político e colunista da Rádio USP, José Álvaro Moisés, foi enfático ao afirmar ser preciso clareza e consciência de que estamos entrando em um novo ciclo da política nacional, o qual deverá ser marcado por uma posição muito conservadora do novo presidente e do Congresso Nacional e que, em um certo sentido, estabelecerá o fim da polarização PT/PSDB. Álvaro Moisés disse concordar com o editorial publicado nesta segunda-feira (29), pelo jornal O Estado de S. Paulo, segundo o qual o eleitor brasileiro deu um salto no escuro, uma vez que desconhece as políticas a serem implementadas pelo novo governo, embora Álvaro Moisés considere um sinal positivo a promessa feita pelo novo presidente de cumprir a Constituição.
Para ele, serão precisos cautela e disposição para acompanhar as mudanças que, se vierem como estão sendo prometidas, serão positivas. Ao observar que governar é uma tarefa complexa, que vai muito além dos discursos políticos de campanha, o cientista político afirma que Bolsonaro terá pela frente a missão de coordenar a base que o novo governo pretende ter no Congresso Nacional. “Temos que observar realmente o que haverá de novo na relação do presidente com o Congresso e com o Parlamento”, diz Álvaro Moisés, lembrando que se trata tanto de uma relação com a instituição – à qual se pretende terá sua autonomia e independência garantidas, “inclusive para fiscalizar o novo governo” – quanto com os parlamentares e as respectivas bancadas que formam o Congresso. “Eu acho que nós temos um teste em relação à questão da governabilidade, que vai ser em grande parte verificada através das ações que o novo presidente tomar na constituição de seu ministério, na constituição do governo e na relação com o Congresso.” Na opinião do cientista político, é preciso observar, pois só assim será possível entender o enigma desse governo, que não se deu a conhecer inteiramente durante a campanha, sobretudo dada a recusa de Jair Bolsonaro em participar dos debates públicos.
Álvaro Moisés diz ainda que o recado dos eleitores, nessas eleições, foi dado em alto e bom som: queremos mudanças. E o primeiro personagem que apareceu acenando nessa direção acabou recebendo os votos dos eleitores. Deve ficar claro que o novo presidente teve 58 milhões de votos, enquanto o petista Fernando Haddad recebeu 47 milhões, o que significa que o candidato do PSL teve um pouco mais de 1/3 do total de votos. O que salta aos olhos, no entanto, é que quase 2/3 dos eleitores não o escolheram como presidente, uma vez que os votos brancos e nulos, somados com a abstenção, totalizaram 44 milhões. Diante desses números, resta saber como o governo respeitará essa diferença e essa pluralidade, “que não é exatamente a unanimidade que talvez o candidato Jair Bolsonaro esperasse”, mas que, ao mesmo tempo, “é um recado para a oposição, que, se quiser crescer, será obrigada a se refundar”. Para Álvaro Moisés, está muito claro que, se PSDB e PT não quiserem desaparecer, terão de fazer uma autocrítica muito séria de seus erros, e inclusive pedir desculpas publicamente, para todos os eleitores, dos erros que cometeram, principalmente aqueles ligados ao envolvimento com a corrupção.
Por fim, o cientista político faz um alerta: “A democracia brasileira tem alguns riscos que precisam ser cuidados, há uma mentalidade autoritária no novo governo, que nós precisamos olhar com muito cuidado e acompanhar, para impedir que se transforme em negação de direitos fundamentais”.