Inflação, desemprego e falta de projeto de País devem continuar no ano novo

Pandemia, erros do atual governo e populismo vislumbrado nas próximas eleições tecem pano de fundo desolador para a retomada econômica em 2022

 20/12/2021 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 22/12/2021 às 20:14
Foto: Freepik

O bolso do consumidor brasileiro sentiu o impacto da inflação no dia a dia. Gás de cozinha, arroz, feijão, carne, combustíveis, conta de luz, uma série de itens do orçamento doméstico dispararam em 2021 em escalada inflacionária que deve perdurar no próximo ano. 

A disparada da inflação, para além da pandemia, contou com outra disparada, a do dólar, que chegou a valor de câmbio inédito, e também a dos juros da Selic (taxa básica de juros) que aumentaram por sete meses consecutivos. Como resultado, a inflação ultrapassou a casa dos 10% ao ano, chegando aos dois dígitos pela primeira vez em 27 anos do Plano Real.

Segundo avaliação de especialistas da USP, a economia brasileira em 2021 não esteve para brincadeiras e não deve gerar boas expectativas para 2022. Esse é o resumo do segundo episódio do balanço de 2021, uma série especial de final de ano produzida pelo Jornal da USP no Ar – Edição Regional que segue até 23 de dezembro abordando ainda o meio ambiente, a educação e a política.

Inflação aponta para um cenário desolador

Paulo Feldmann – Foto: FEA-USP

Segundo o professor Paulo Feldmann, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, “o grande problema é que o diagnóstico feito pelo governo para as causas da inflação está errado”. Feldmann explica que existem dois tipos de inflação, a de demanda e a de oferta; a de demanda é causada pelo consumo muito alto e a de oferta, quando alguns preços importantes da economia sobem e repercutem em todos os outros demais produtos e serviços.

Como o País vem atacando a inflação com aumento das taxas de juros, o professor alerta que “a situação, provocando uma diminuição da atividade econômica” só deve piorar.

Para o professor Alex Ferreira, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP em Ribeirão Preto, com a inflação 6,45% acima da meta estabelecida e a taxa de juros com um aumento precificado de 1,5%, o Brasil não deve esperar muito para 2022. Mesmo com a pequena recuperação do PIB em 2021, com “crescimento projetado de 4.7%, o desempenho esperado para 2022 é pífio”, afirma.

E as previsões de crescimento devem continuar ruins até 2024, continua Ferreira, já que “as taxas de crescimento esperadas para o biênio 2023 e 2024 também são baixas, de 2% ao ano”. Nessa velocidade, estima o professor, “iria demorar 35 anos para dobrar a nossa renda total. É um cenário desolador”.

Atacar desemprego investindo em infraestrutura

Problema brasileiro que só foi agravado pela pandemia, o desemprego é uma das questões mais importantes para qualquer país, mas é “principalmente para o Brasil que possui uma das maiores taxas de desemprego do mundo”, avalia o professor Feldmann. E, para justificar, cita números do IBGE para mostrar que são 13 milhões de desempregados, outros 6 milhões de desalentados (cansaram de procurar emprego) e cerca de 20 milhões de trabalhadores informais, que usam apenas 20% de seu tempo útil, obtendo renda muito baixa.

“É muito difícil um país crescer com uma taxa de desemprego tão alta como a nossa. O rendimento do brasileiro está muito baixo, e caindo”, expõe o professor que acredita no investimento em infraestrutura como uma boa saída para o Brasil hoje. 

Feldmann afirma que o País sofre com falta de ferrovias, portos, estradas e hidrelétricas, exemplos de obras que geram empregos de baixa qualificação e que podem abrir muitas vagas de trabalho. Para o professor, nem a falta de recursos seria problema já que “diversos países teriam interesse em investir no Brasil em obras de infraestrutura”, adianta, lembrando de “países menores que recebem investimentos das potências mundiais, como China, Estados Unidos e Alemanha”.

Planejamento é a chave da mudança

“Não costumamos planejar o futuro. E é por isso que estamos em uma situação de atraso muito grande”, afirma Feldmann. O crescimento da América do Sul nos últimos 25 anos, conta o professor, foi de apenas 18% enquanto os países asiáticos cresceram 85% no mesmo período.

O segredo para o desenvolvimento exponencial de um país, ensina Feldmann, é o planejamento, independente da área, mas principalmente na econômica. ”Sem plano, um país carente como o nosso não conseguirá ir para a frente. Esse é o problema brasileiro, a falta de planos a médio e longo prazo”.

Eleições desacreditam futuro com populismo e ausência de projetos

Saber separar populismo de propostas sérias e conscientes é essencial para o eleitor votar com sabedoria, conta o professor Alex Ferreira. “Um debate equilibrado, informado, sobre projetos de desenvolvimento a longo prazo no Brasil. O eleitor precisa entender que as escolhas de prioridade de um governo devem se basear em um processo contínuo de avaliação de políticas públicas, ao invés de populismo”.

Um exemplo de proposta populista, para Feldmann, foi a criação do Auxílio Brasil, que substituiu o Auxílio Emergencial, criado em função da pandemia. “Muita gente foi beneficiada pelo auxílio emergencial, quase 40 milhões de pessoas”, conta o professor, defendendo que o auxílio deveria ter sido estendido para 2022, por conta do alto desemprego.

Com o encerramento do auxílio emergencial e criação do Bolsa Brasil – que é um novo bolsa família, mas só vai atingir um número bem menor de brasileiros, “por mais que nós tenhamos eleições em 2022, o número de pessoas com dificuldade aumentará. Não se pode dizer que o ano de 2022 será um ano positivo para o Brasil”, enfatiza Feldmann. 

Ferreira também concorda que, a persistir o atual embate eleitoral, as eleições presidenciais de 2022 não devem trazer o que o Brasil precisa: um projeto de desenvolvimento a longo prazo. Para o professor Ferreira, o ideal seria o eleitor escolher as prioridades de um governo através de um processo contínuo de avaliação de suas políticas públicas ao invés de soluções populistas e políticas ideológicas.  

E, quanto às expectativas para o próximo ano, Ferreira lembra que a pandemia trouxe uma aceleração no processo de adaptação de novas tecnologias, com uma revolução que pode trazer um futuro mais positivo para a economia. “Existem mudanças forçadas pela pandemia que poderão se revelar como positivas. Redução de burocracia de processos, uso de tecnologia a distância. Durante a pandemia, ocorreu uma revolução em poucas semanas que provavelmente não ocorreria em décadas. A questão importante é saber o quanto nós vamos melhorar depois desse choque e qual será o efeito sobre a produtividade. Na minha opinião, nós aprendemos o caminho para a utilização desses recursos”. 

A entrevista completa deste episódio pode ser ouvida no áudio abaixo, produzido pelo Jornal da USP no Ar – Edição Regional. Ouça aqui o primeiro episódio da série 

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Por: Ferraz Junior e Vinícius Botelho


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