Saúde deixa 2021 com vitória parcial e preocupação com final ainda incerto da guerra contra a covid

Novas variantes, aumento da fome e das desigualdades sociais e o subfinanciamento federal para o SUS criam cenário pouco otimista para o ano que se aproxima

 17/12/2021 - Publicado há 2 anos     Atualizado: 22/12/2021 as 20:13

Este é o primeiro episódio de uma série especial de final de ano produzida pelo Jornal da USP no Ar – Edição Regional. Pela gravidade da pandemia, o balanço da saúde nacional abre a série que será apresentada de 17 a 23 de dezembro, abordando ainda a economia, o meio ambiente, a educação e a política.

A pandemia da covid-19 no Brasil vem retrocedendo enquanto cada vez mais avança a vacinação, que atualmente já corresponde a 70% da população com duas doses ou dose única da proteção contra o coronavírus. Mas, mesmo sendo dados positivos, a avaliação de especialistas não é otimista quanto à saúde em 2022.

Gonzalo Vecina Neto – Foto: Reprodução/FGV EAESP Pesquisa

O ano de 2021 termina contabilizando cerca de 620 mil mortes pela doença e a incerteza quanto ao perigo de novas cepas, como a ômicron. Festas de final de ano e carnaval estão sendo canceladas pelo País como medidas para frear o avanço da nova variante.

Mas as dificuldades enfrentadas em 2021 podem representar sementes para novos aprendizados que, bem cultivados, devem criar para 2022 cenários melhores.

Saúde pública se faz com ciência

Além dos problemas sanitários, a pandemia deixou exposta também as desigualdades sociais do País. Segundo o professor Domingos Alves, do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, “os cientistas da área da saúde fizeram toda a diferença no combate à pandemia”, mostrando que “saúde pública se faz com ciência, e não com política”.

Para Alves, “o aparecimento de novas cepas e o avanço da pandemia como um todo ressaltaram diferenças sociais que existem no Brasil e em todo o mundo”, já que grande parte dessa realidade existe em função da falta de presença do governo em amparar “pessoas que não tiveram apoio do Estado”.

As desigualdades sociais também chamaram a atenção do professor Gonzalo Vecina Neto, da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP em São Paulo. Para o professor, a desigualdade mata mais que o vírus e destaca que “o Brasil, segundo maior produtor de alimentos do mundo, está tendo fome crônica, aguda na população, por falta de um Estado que promova segurança alimentar”.

Cenários como o de Manaus servem de exemplo para a falta de atitude do Estado, aponta Vecina. “Nós vimos acabar o oxigênio em Manaus, nós vimos faltar os cilindros de oxigênio no Sul e Sudeste. Está na hora de aprender com tudo o que nós fizemos de errado. Debaixo da poeira existe incompetência e morte.”

Negacionismo e inação do Estado

Vecina afirma que, no Brasil, o negacionismo não possui tanta força como nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo. O principal problema do País, acrescenta, é a falta de ação do Estado. “É fruto da inação do Estado em convocar as pessoas para serem vacinadas. Os recursos para fazer marketing e propaganda estão escassos. As pessoas não aparecem porque não se sentem convocadas. As pessoas que apareceram, quem convocou? A imprensa. Não o Estado.”

Por outro lado, Domingos Alves acredita que o negacionismo é uma realidade não só nos Estados Unidos e na Europa, mas também no Brasil. “O negacionismo da vacina, que traz junto fake news bem produzidas, falando do quão ruim pode ser uma vacina, isso deve continuar em 2022. Pessoas contaminadas nessas novas ondas são pessoas que não se vacinaram, e não se vacinaram porque não quiseram se vacinar”, sentencia.

Perspectivas para 2022 não são boas, mesmo sem pandemia

O professor Domingos Alves, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP – Foto: Divulgação FMRP/USP

As perspectivas para o próximo ano podem ser boas ou temerárias, dependendo intimamente dos índices de vacinação em todo o mundo, acredita Alves. As desigualdades entre países que podem vacinar sua população – e não olham para os outros países – os que “não conseguem vacinar sua população trazem uma perspectiva a despeito do avanço da vacinação do mundo, uma perspectiva sombria com relação a 2022″.

Alves acredita que a falta de vacinação pode levar ao surgimento de novas cepas e que a coletividade é a chave para a mudança de pensamento e a virada desse cenário. As perspectivas para 2022, segundo o professor, estão relacionadas ao fato da população mundial entender adequadamente o processo de vacinação e proteção, que “é um processo coletivo, e não individual”.

Já o professor Vecina enxerga um futuro pandêmico mais positivo, com menor incidência da covid-19 em 2022, mas alerta para problemas em outros setores da saúde. “Ao que tudo indica, 2022 será o ano com menor atividade da pandemia. O aumento da cobertura vacinal caminha para uma situação melhor.” Contudo, do ponto de vista da saúde em geral, Vecina acredita que “será um desastre, porque nós temos um problema de financiamento muito grave; o subfinanciamento federal vai impactar pesadamente as ações da saúde em 2022. Isso aponta para um ano muito, muito ruim”. 

As entrevistas completas podem ser ouvidas no áudio abaixo, produzido pelo Jornal da USP no Ar – Edição Regional.

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Por: Ferraz Junior e Vinícius Botelho


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