Dados governamentais relativos à Lei de Acesso à Informação ainda são de difícil alcance ao cidadão

O professor Marcos Augusto Perez fala sobre o ranking de transparência elaborado pela Faculdade de Direito da USP, que considerou abaixo da média 24 dos 54 portais, no que tange a tópicos como ampla disponibilidade, praticidade e facilidade dos registros

 14/12/2022 - Publicado há 2 anos
O levantamento constatou contrastes entre as administrações que se dedicaram a dar transparência e aquelas que não cumprem a lei ou a cumprem de forma ineficaz – Foto: Pixabay – Fotomontagem Jornal da USP
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O acesso à informação é direito fundamental do cidadão brasileiro e é dever do Estado, de acordo com o artigo 5° da Lei nº 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação (LAI). Em vigor há 11 anos, ela ainda tem dificuldades em ser implementada pelos governos nas suas três instâncias: municipal, estadual e federal. Sem a devida aplicação, as atividades executadas pela administração pública não têm completo grau de transparência, no que diz respeito à ampla disponibilidade, praticidade e facilidade dos dados governamentais.

Em números, 24 dos 54 portais de transparência estão abaixo da média no ranking de transparência elaborado pelo Núcleo de Estudos da Transparência Administrativa e da Comunicação de Interesse Público (Netacip) da Faculdade de Direito da USP. Com base em 39 quesitos com pontuações de 1 a 10, o levantamento avalia critérios relevantes na execução da LAI, como os valores aplicados em determinados programas, períodos específicos para análise do gasto orçamentário, quantidade de cliques para acessar a informação desejada, entre outros. Além disso, ferramentas de design e layout, o fácil acesso e compreensão da informação, a atualidade dos dados, a possibilidade de download do material em diferentes formatos e a integração com as redes sociais são outros fatores relevantes na efetividade da LAI.

“A gente não enxergou só o cumprimento estrito da lei. Para nós, é importante que o cidadão ache algumas rubricas orçamentárias bem claramente sistematizadas no portal”, explica Marcos Augusto Perez, professor da Faculdade de Direito (FD) da USP e um dos coordenadores da pesquisa. Segundo a legislação, os portais não devem se restringir apenas a disponibilizar o acesso aos gastos, como também facilitar a localização de dados e destrinchar os programas. A execução eficaz da LAI implica acessibilidade, clareza e simplicidade da informação.

Sobre o ranking

O levantamento constatou contrastes entre as administrações que se dedicaram a dar transparência e aquelas que não cumprem a lei ou a cumprem de forma ineficaz. Os dados coletados entre 2021 e o primeiro semestre de 2022 são uma fotografia do quadro de transparência durante esse período, elucida Perez. Ele complementa que a intenção não é de criar comparações entre os Estados, mas de “colocar os temas a partir de uma visão dos estudos que foram feitos”, para indicar os quesitos a serem melhorados no acesso aos dados e levantar o debate da transparência.

Marcos Augusto Perez – Foto: Marcos Santos / USP Imagens

O Portal de Transparência do governo federal, “que costumava ser referência, acabou ficando na 12ª posição do ranking”, aponta o relatório da pesquisa. Apesar dos pontos positivos – fácil utilização em dispositivos móveis, detalhamento de remuneração dos servidores públicos e geração automática de gráficos – o  Netacip considera a necessidade de atualização e adequação do portal da transparência do governo federal. Como exemplo, a pesquisa destaca as instabilidades nas consultas e a ausência de informações relativas à dívida pública, por exemplo.

O Estado de São Paulo atingiu apenas a 46ª colocação, figurando entre os quatro piores na avaliação. O núcleo de pesquisa o classifica como “satisfatório”, tendo em vista a disponibilização dos dados sobre os gastos da administração estadual e informações com servidores públicos. Os critérios a melhorar mencionados foram a falta de destaque dos gastos com previdência e dívida pública e a aglomeração de informação nas páginas.

Já a capital paulista ficou em 17°, sendo a décima entre as capitais. A organização limpa, a navegação rápida e as informações georreferenciadas sobre serviços públicos contribuíram para uma boa avaliação do portal da cidade. Em contrapartida, os gastos com segurança pública, repasses e transferências não foram encontrados pela equipe do Netacip.

Como destaques positivos, estão os Estados do Paraná, Bahia e Santa Catarina, além das capitais Fortaleza (CE) e Rio de Janeiro (RJ). Os 94,39% da nota do Estado paranaense lideram o ranking geral. Por outro lado, Tocantins emplacou a pior colocação entre os Estados, enquanto Aracaju (SE) esteve na última posição geral, com nota 53,74%.

Na prática

Quase 50 anos após a sanção do Ato de Liberdade de Informação (Freedom of Information Act – FOIA) dos Estados Unidos, a LAI foi colocada em prática. Perez justifica que o atraso na transparência do governo brasileiro se dá pela configuração do Estado durante sua história: “A administração brasileira tem um histórico de apego ao autoritarismo, vivemos envoltos ou em regimes pouco democráticos ou mesmo ditatoriais”.

A Lei de Acesso à Informação “tem uma obrigação principal de ser acessível na perspectiva do cidadão”, afirma Perez. O compromisso de transparência e a publicidade de informações públicas são pilares na efetividade da lei, de acordo com o relatório. A vigoração da lei é resultado da manifestação e participação civil por clareza na conduta dos governos, para o professor. “É uma conquista da sociedade e a sociedade precisa, além de colocar isso na Constituição, se mobilizar e exigir transparência dos governos”, aponta.


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