Crianças afetadas por crises climáticas enfrentam atraso escolar e dificuldades no retorno à escola

No Brasil existem mais de 2.000 escolas em áreas de risco geológico e hidrológico, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden)

 Publicado: 11/11/2024 às 11:11
Por
Imagem de uma escola onde aparecem mesas e cadeiras caídas no chão como consequência de chuvas e inundações
Escolas do Rio Grande do Sul foram afetadas pelas enchentes – Foto: Rafa Neddermeyer / Agência Brasil
Logo da Rádio USP

Os conflitos e desastres climáticos têm impactado profundamente a educação das crianças ao redor do mundo. De acordo com o Fundo Global Education Cannot Wait (ECW), da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 222 milhões de crianças em idade escolar viram sua educação interrompida por essas crises. Esse cenário torna ainda mais grave o fato de que, segundo o ECW, apenas 120 milhões dessas crianças, ou uma em cada dez, atendem aos requisitos de proficiência em matemática e leitura.

Rosto de homem branco, de cabelos curtos e grisalhos, de óculos quadrados
Marcelo Tadeu Motokane – FFCLRP

Segundo o professor Marcelo Tadeu Motokane, do Departamento de Biologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, o principal desafio enfrentado pelas crianças afetadas é lidar com o atraso escolar. O professor, que é especialista em educação, com ênfase no ensino de Ciências, explica que essa questão é “multidimensional”, pois interfere em diferentes aspectos do desenvolvimento infantil. “Por exemplo, na dimensão cognitiva, ficar longe da escola por muito tempo interrompe processos de aprendizagem, conceitos, procedimentos e atitudes que são encadeados e sequenciados.”

Além das questões acadêmicas, Motokane destaca que o retorno à escola é geralmente lento e cheio de dificuldades para essas crianças. “Toda vez que uma criança é afastada da escola, ela enfrenta barreiras no retorno, e, ao não aprender o que foi planejado, sente-se desmotivada, o que diminui seu engajamento”, afirma. Ele também alerta que o distanciamento prolongado pode desencadear problemas de saúde mental e física, como fome e desnutrição, agravando ainda mais o impacto das crises.

Para o professor Danilo Seithi Kato, do Departamento de Educação, Informação e Comunicação da FFCLRP, as crianças, principalmente das comunidades tradicionais, estão sendo atingidas por um fenômeno que é fruto da ação de uma geração anterior. “Essas comunidades são as mais atingidas por desastres climáticos e têm sido esquecidas pelo Estado e pelo poder público. Hoje há uma discussão dos riscos socioambientais e das crises climáticas, e os primeiros atingidos são essas populações que vivem em zonas de conflito. Os conflitos socioambientais marcam a realidade não só brasileira, mas latino-americana, e deveriam ser trazidos para o cerne do debate sobre os processos educativos.”

Áreas de risco 

De acordo com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), existem mais de 2.000 escolas em áreas de risco, sendo 729 escolas em área de risco hidrológico, como enchentes, inundações, alagamentos e secas e 1.714 escolas em área de risco geológico, como deslizamentos de terra, terremotos e erosões.

Rosto de homem branco, com cabelos pretos lisos, sorrindo e de camiseta marrom
Danilo Seithi Kato – FFCLRP

Motokane relembra as enchentes que ocorreram no Estado do Rio Grande do Sul no começo deste ano. “Muitas cidades foram devastadas e levaram escolas inteiras com a força das águas. Milhares de crianças ficaram sem aula, moradia, escola, colegas, professores, a rotina de estudo e um ambiente adequado para aprender.” Para o professor, as escolas têm um papel fundamental em adotar medidas preventivas para reduzir os impactos dos desastres climáticos. “As escolas podem ter acesso aos materiais que o Cemaden produz e aos programas de formação de educadores que ensinam a prevenir deslizamentos e as causas das mudanças climáticas. O Cemaden não só trabalha com informação e formação para os professores, mas também faz uma série de campanhas e tem vários materiais para os alunos.”

Para Kato, é necessário que existam “políticas públicas e uma conscientização geral da população sobre a questão climática; para as novas gerações, também é importante se mobilizar quanto ao tema e retomar uma educação ambiental que recoloque essa tomada de consciência quanto ao meio ambiente”.

*Estagiária sob supervisão de Rose Talamone e Ferraz Junior


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar no ar veiculado pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 14h, 15h, 16h40 e às 18h. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.