O futuro dos olhos pode estar condicionado à chamada Síndrome Visual do Computador, um fenômeno novo na oftalmologia causado pelo uso constante da visão de perto. Esse problema, alavancado na pandemia com a diminuição de circulação ao ar livre e recebimento da luz natural, tem causado algumas mudanças no comportamento visual, principalmente em crianças.
São três aspectos principais que envolvem essa síndrome: o cansaço dos olhos, causado pela sobrecarga muscular no ato de “olhar de perto”, ressecamento do olho, principalmente pela falta do piscar constante e, também, a própria radiação luminosa emitida pelos aparelhos eletrônicos, como smartphones e computadores.
O uso intenso da visão de perto é tido, pela Organização Mundial da Saúde, como um fator de risco no início e progressão do quadro de miopia — doença relacionada à dificuldade de enxergar a distância. Em 2019, o primeiro relatório mundial sobre a visão da instituição estima que o número de casos saltará dos 1,95 bilhão atuais para 3,36 bilhões em 2030.
Aumento de miopia nas crianças
No caso das crianças, há uma preocupação a mais em relação a essa acomodação prolongada, porque seus olhos ainda estão em processo de desenvolvimento. Quando elas focam em uma distância curta por muito tempo, como durante o uso das telas, o globo ocular — que se desenvolve nessa faixa etária — é estimulado. Esse contexto pode evoluir para uma miopia progressiva, causando também outras complicações.
“Quando a miopia é alta, ela pode levar a um risco aumentado de doenças oftalmológicas mais graves quando adultas, dentre elas, glaucoma e algumas doenças retinianas, inclusive o descolamento de retina”, diz Verônica Bresciani, oftalmologista pela Faculdade de Medicina da USP.
Em um estudo publicado em janeiro deste ano, pesquisadores chineses analisaram 120 mil crianças e a conclusão foi a de que o confinamento em casa, durante a pandemia de covid-19, pareceu estar associado a uma mudança significativa de miopia para crianças de 6 a 8 anos de idade. Houve aumento de quase três vezes no número de casos nesse público, em relação aos anos anteriores, principalmente pela ausência de contato com a luz externa.
Como evitar o efeito cumulativo
Ainda que não existam estudos populacionais que possam dizer de maneira precisa as consequências do uso excessivo das telas, segundo o professor e oftalmologista Mário Camargo da Faculdade de Saúde Pública da USP, a longo prazo pode haver um efeito cumulativo com tendência de envelhecimento precoce do olho.
“O efeito maior que há — isso já está mais bem estabelecido — é o fato de que o olho, além de servir para a gente enxergar, é um importante marcador termômetro para o nosso ritmo biológico”, diz. Quando a luz incide nos olhos, ela estimula a produção ou inibição do hormônio melatonina, responsável por induzir as pessoas ao sono.
“Se ficarmos trabalhando nas telas até a hora de dormir, isso vai nos estimular a ficar acordados, levando à insônia e a uma diminuição da qualidade do sono, que podem, inclusive, a longo prazo, acarretar danos cognitivos nas crianças e danos psicológicos nos adultos”, alerta o professor. “Se não tomarmos algumas medidas preventivas, quando começarmos a ver os efeitos não dará mais para reverter.”
Segundo a OMS, ter pelo menos 60 minutos de exercício diário foi associado a uma menor prevalência de miopia. As recomendações, que valem a todos os públicos, especialmente às crianças, vão desde diminuir o tempo de uso das telas a piscar de maneira mais consciente e manter o ambiente umidificado.
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