“O Rio de Janeiro continua lindo…
O Rio de Janeiro continua sendo
O Rio de Janeiro, fevereiro e março
Alô, alô, Realengo – aquele abraço!”
Aquele abraço, a música tropicalista de Gilberto Gil, estava no disco que a professora emérita Paula Beiguelman deu para a sua sobrinha ainda pequena. O presente está na lembrança de Giselle Beiguelman, artista que também trilha os caminhos da tia na Universidade de São Paulo. Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, fez questão, nesta segunda, que a música fosse tocada em sua coluna Ouvir Imagens (clique no player acima).
“Foi o primeiro disco que ganhei. Paula Beiguelman, já falecida, foi uma das vítimas das cassações da ditadura”, conta a colunista. “Com Aquele abraço eu presto essa homenagem a ela e a todos os outros 218 professores e pesquisadores que foram aposentados pelos atos complementares ao AI 5.”
Giselle Beiguelman comenta a luta política e a arte dos anos de chumbo. Lembra que é “impossível falar de 1968 e não associar ao Movimento de Maio de 68, na França, levante estudantil que levou mais de 20 mil jovens às ruas de Paris. Não dá também para ignorar o assassinato de Martin Luther King nos Estados Unidos, além de difícil esquecer todo o espectro do Cinema Novo que acontecia nessa época.”
Beiguelman explica que, para os brasileiros, 1968 ficou diretamente relacionado à promulgação do AI-5, que suprimiu uma série de garantias individuais e inaugurou o período mais duro da repressão na ditadura, marcando boa parte dos anos 1970. Na avaliação da professora, é preciso considerar o sentido ampliado de 1968, marcado por uma série de lutas por direitos civis, como a dos negros nos EUA, das reivindicações feministas e de intensas revoluções estéticas e comportamentais, que acontecem um pouco antes e reverberam muitas décadas depois. “Nesse sentido, é preciso pensar 1968 de forma processual e não como um ano em si”, observa. “No Brasil, eu destacaria a obra Tropicália, de Helio Oiticica, de 1967, que levou a arquitetura das favelas para dentro do prédio modernista do MAM do Rio de Janeiro, Terra em Transe, também de 1967, de Glauber Rocha.”
Giselle Beiguelman encerra a coluna desta segunda, dia 19, com a música Aquele Abraço de Gilberto Gil. Mas cita também composição, Panis et Circencis, de Caetano Veloso e Gilberto Gil, intepretada pelos Mutantes e, como destaca a professora, “uma crítica mordaz aos valores morais de 1968”.
Eu quis cantar
Minha canção iluminada de sol
Soltei os panos sobre os mastros no ar
Soltei os tigres e os leões nos quintais
Mas as pessoas na sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer…
Quem quiser ouvir as músicas citadas e saber mais sobre 1968, acesse: