Bloco da Dona Yayá celebra 25 anos com desfile neste domingo

Grupo feminista formado pela União de Mulheres de São Paulo aproveita o carnaval para reivindicar direitos

 Publicado: 20/02/2025 às 14:45
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Boneco gigante em forma de uma mulher.

A boneca de Olinda de Dona Yayá se tornou o símbolo do bloco – Foto: Reprodução/Acervo CPC-USP

Desde o ano 2000, no tradicional bairro do Bixiga, em São Paulo, o domingo pré-carnaval é marcado pelas marchinhas humanitárias do Bloco Carnavalesco Casa de Dona Yayá, organizado pela União de Mulheres de São Paulo. Neste domingo, dia 23, o bloco celebra seu 25º aniversário e leva às ruas pela primeira vez a sua própria bateria. A concentração do desfile começa às 9 horas na sede da União de Mulheres de São Paulo (Rua Coração da Europa, 1.395) e a dispersão está prevista para as 11 horas, na Casa de Dona Yayá (Rua Major Diogo, 353), o casarão onde está instalado o Centro de Preservação Cultural (CPC) da USP. O evento é aberto ao público em geral.

Até o ano passado, o bloco sempre tinha saído às ruas com baterias e carros de som emprestados de outros blocos do bairro. Agora, o grupo vai desfilar com equipamento carnavalesco próprio. Outra novidade é que as integrantes do bloco tiveram aulas de musicalização dadas pela musicoterapeuta Kézia Luz, que é aluna de mestrado da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.

Entre a folia e a revolta

Nos desfiles do bloco, as ativistas-foliãs da União de Mulheres de São Paulo estão entre a alegria carnavalesca e a revolta política. Laryssa Andrade, atual presidente do movimento, revela ao Jornal da USP que a intenção é aproveitar o carnaval para fazer reivindicações. “Nosso compromisso é passar o nosso recado e fazer as pessoas olharem para o que é importante pra gente”, ela diz.

Sempre no período do carnaval, elas alcançam uma maior visibilidade nas ruas, e aproveitam isso para espalhar suas mensagens. Ao longo do ano, a União de Mulheres de São Paulo promove encontros para compor marchinhas sobre assuntos latentes na cidade – a saúde pública, a violência contra a mulher, a educação sexual – para serem depois cantadas pelas ruas do Bixiga. Neste ano, as mulheres do grupo destacam a legalização do aborto.

O domingo pré-carnaval é apenas uma das atividades sociais da União de Mulheres de São Paulo, cujo calendário aberto inclui cursos, encontros, workshops e rodas de conversas, entre outros. No cortejo até a Casa de Dona Yayá, no carnaval, as mulheres protestam por avanços humanitários, ao mesmo tempo em que celebram a trajetória já percorrida. “É lutar sem perder a ternura”, diz Laryssa, referindo-se à famosa frase atribuída ao revolucionário argentino Che Guevara (1928-1967).

Mulher sorrindo brincando o carnaval numa rua.

Laryssa Andrade, presidente da União de Mulheres de São Paulo, entidade organizadora do Bloco da Dona Yayá, durante desfile no ano passado – Foto: Acervo Pessoal/Laryssa Andrade

"Mulheres, cadê Yayá? Yayá foi passear"

No primeiro cortejo do Bloco da Dona Yayá, em 2000, as ativistas da União de Mulheres de São Paulo reivindicaram o acesso público à Casa de Dona Yayá, um terreno histórico doado à USP em 1968. O casarão no Bixiga foi onde a Dona Yayá (Sebastiana de Mello Freire) viveu presa por décadas até sua morte, devido a problemas psiquiátricos. Ela é tema de uma das marchinhas do bloco, em que as ativistas cantam “Mulheres, cadê Yayá? Yayá foi passear”, em apoio à causa antimanicomial.

O Bloco da Dona Yayá já faz parte da história do tradicional bairro paulistano, que resiste à pressão da especulação imobiliária desde os anos 1970. A professora Flávia Brito do Nascimento, docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e de Design (FAU) da USP e diretora do CPC, explica que o bloco é um exemplo de apropriação do espaço urbano pela sociedade civil. “A resistência à especulação imobiliária tem uma relação muito direta com os grupos sociais que se apropriaram desse espaço e usam intensamente o bairro. Eles têm relação com o movimento negro e também com os debates feministas, com o direito à cidade e com a constituição de uma imagem do bairro”.

Desenho que mostra a figura de uma mulher.
Clique aqui para fazer download do livreto de marchinhas - Arte: União de Mulheres de São Paulo

Flávia destaca que os próprios moradores do bairro atuam na defesa de seu patrimônio. Além disso, defendem a memória de sua origem, muito atrelada ao carnaval de rua. “O bairro tem a Escola de Samba Vai-Vai, que está relacionada à ancestralidade, e inúmeras rodas de samba, e o Bloco da Dona Yayá faz parte dessa história”, diz a professora.

 

Em defesa dos direitos das mulheres

Entre as ativistas que contribuíram para a história do bairro estão Criméia Almeida, Amelinha Teles, Terezinha Gonzaga, Lurdinha Rodrigues e Kátia Antunes, esta mãe de Laryssa Andrade. Suas trajetórias se encontraram em eventos feministas nas décadas de 1960 e 1970, quando a dificuldade de articulação política levou à necessidade de criar uma organização independente para a defesa dos direitos das mulheres. Por isso, em 1981, elas fundaram a União de Mulheres de São Paulo.

Desfile de um bloco de carnaval numa rua.
Desfile de um bloco de carnaval numa rua.
Desfile de um bloco de carnaval numa rua.

O desfile do Bloco da Dona Yayá no carnaval de 2024 – Fotos: Acervo do CPC-USP

As fundadoras da União de Mulheres de São Paulo estão na faixa dos 80 anos, e continuam ativas no movimento. Hoje elas veem o que começou com um “trabalho de formiguinha” se consolidar como uma organização essencial na proteção dos direitos das mulheres na cidade. Suas descendentes continuam o legado, como conta Laryssa: “Praticamente cresci e fui criada dentro da União, e agora assumi a presidência. Já somos três gerações no movimento: minha mãe, eu, e as minhas filhas e sobrinhas”.

O desfile do Bloco da Dona Yayá acontece neste domingo, dia 23, a partir das 9 horas, no Bixiga, em São Paulo. O trajeto será: Rua Coração da Europa (sede da União de Mulheres de São Paulo), Avenida Conselheiro Carrão, Rua Treze de Maio, Rua Manoel Dutra, Rua Rui Barbosa, Rua Manoel Dutra, Professor Laerte Ramos de Carvalho e Rua Major Diogo (na Casa de Dona Yayá). A dispersão está prevista para as 13 horas. Acompanhe atualizações nas redes sociais do Bloco Dona Yayá (instagram.com/blocodonayaya/) e da União de Mulheres de São Paulo (instagram.com/uniaodemulheresdesaopaulo/).

*Estagiária sob supervisão de Roberto C. G. Castro


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