Na França, docente da USP fala sobre a recepção de Guizot no Brasil

Ideias do historiador francês, que questionava o sufrágio universal, foram abordadas pela professora Marisa Midori em Paris

 13/02/2017 - Publicado há 7 anos
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Jornal O Brasil, que publicou textos de Justiniano José da Rocha sobre Guizot – Foto: Reprodução • Clique na imagem para ampliar

Em seu livro De la Démocratie en France – publicado em 1849 –, o historiador, político e professor francês François Guizot (1787-1874) condena o que chama de “idolatria da democracia”, questiona o sufrágio universal, sugere o banimento dos comunistas ateus e pede a conciliação de todos os setores da sociedade, em favor da “ordem social”. Essas ideias foram adotadas pelo jornalista carioca Justiniano José da Rocha (1812-1862), que se inspirou em Guizot para combater o pensamento liberal no Brasil e, através de sua militância na imprensa, fortalecer o poder do Império.

Essa influência de Guizot na política brasileira do século 19 foi um dos temas abordados pela professora Marisa Midori Deaecto, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, nas quatro palestras que proferiu na École Normale Supérieure (ENS), em Paris, na França, em janeiro e fevereiro deste ano. Nelas, a professora Marisa abordou a recepção das ideias do historiador francês no Brasil. Marisa ainda proferiu duas palestras em outra tradicional instituição de ensino superior francesa, a École Pratique des Hautes Études (EPHE).

“O livro de Guizot sobre a democracia é uma espécie de plataforma política”, afirma Marisa, lembrando que a obra foi escrita pouco depois da Revolução de 1848, na França, que garantiu o sufrágio universal. Segundo a professora, De la Démocratie en France constitui um libelo contra a democracia, porque, para o historiador, esse regime é uma maneira de colocar em primeiro plano o povo, e não a política do Estado e a ordem social. “É interessante notar que, no ano passado, não foram poucos os artigos e até livros que questionaram a democracia atual nos mesmos termos”, destaca Marisa, apontando a atualidade do pensamento de Guizot.
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A École Normale Supérieure (ENS), em Paris – Foto: Reprodução

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Marisa sublinha o termo “idolatria”, com que Guizot criticava o apego ao regime. “É preciso prestar atenção nessa palavra, porque, para um protestante, como era Guizot, a idolatria é um pecado terrível”, nota a professora. “E ele coloca a idolatria da democracia como o maior dos pecados.”
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François Guizot: expressão do pensamento conservador francês do século 19 - Foto: Reprodução
François Guizot: expressão do pensamento conservador francês do século 19 – Foto: Reprodução

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Publicado na França em janeiro de 1849, em junho do mesmo ano o livro de Guizot já era lançado no Brasil, com o título de A Democracia na França. O jornalista Justiniano José da Rocha – formado pela Faculdade de Direito de São Paulo, hoje ligada à USP – foi um dos maiores entusiastas da obra, que divulgou em artigos publicados em jornais cariocas da época, como O Brasil. “Ele foi um dos grandes publicistas de Guizot no Brasil”, explica Marisa.
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A professora Marisa Midori Deaecto na França – Foto: Marcos Santos/USP Imagem

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As palestras de Marisa foram acompanhadas pelo biógrafo de Guizot, o historiador francês Laurent Theis, autor de François Guizot – lançado em 2008 pela Editora Fayard e ganhador do Grande Prêmio de Biografia Histórica da Academia Francesa – e de Histoire de la Révolution d’Angleterre de François Guizot (1997), entre outras obras. “Theis ficou muito interessado porque ele não sabia nada a respeito da recepção das ideias de Guizot fora da Europa”, informa Marisa. “Pudemos trocar muitas informações valiosas.”

Outro ouvinte de Marisa foi o historiador Frédéric Barbier, diretor da Cátedra História e Civilização do Livro da École Pratique des Hautes Études e um dos maiores especialistas em história do livro na atualidade. “As conferências da senhora Deaecto sobre ‘Guizot e o Brasil’ nos convidam a lembrar uma figura incompreendida da historiografia francesa: trata-se de Guizot, um dos historiadores e autores mais lidos do século 19, tanto na França como no exterior, e dos mais esquecidos desde então”, escreveu Barbier em seu blog (http://histoire-du-livre.blogspot.com.br/2017/02/une-excursion-sous-la-monarchie-de.html).

A professora Marisa é colunista da Rádio USP (93,7 MHz), onde apresenta a coluna “Bibliomania”, sempre às sextas-feiras, às 10 horas.

 

 

 

 


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