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Há 40 anos, Clarice Lispector (1920-1977) publicava A Hora da Estrela. A história apresentava ao leitor Macabéa, moça alagoana que migra para o Rio de Janeiro, encontra uma cidade toda feita contra ela, recebe previsões de futuro feliz e termina atropelada por uma Mercedes. Poucos meses depois do lançamento do livro e um dia antes de completar 57 anos, a escritora morria em decorrência de um câncer no ovário.
Para lembrar os dois acontecimentos, o Centro Universitário Maria Antonia (Ceuma) da USP sedia o evento Clarice Lispector: Os Mistérios da Estrela, de 22 a 24 de novembro. A homenagem é organizada pelo Grupo de Pesquisas Produções Literárias e Culturais para Crianças e Jovens e integra a programação de seu 4º Encontro Nacional.
Clarice Lispector nasceu na Ucrânia, filha de judeus russos. Veio para o Brasil em 1922, morando primeiro em Maceió, depois no Recife e finalmente no Rio de Janeiro, onde cursou a Faculdade de Direito da atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Seu primeiro livro, Perto do Coração Selvagem, foi publicado em 1943 e recebido com entusiasmo pela crítica.
Dentre suas obras, destacam-se o romance A Paixão Segundo G. H. (1964) e os livros de contos Laços de Família (1960) e A Legião Estrangeira (1964). Escreveu também livros para o público infantil, como O Mistério do Coelho Pensante (1967) e A Mulher que Matou os Peixes (1968).
Paralelamente à literatura, Clarice atuou na imprensa carioca. Trabalhou como repórter na Agência Nacional e como redatora no jornal A Noite. Assinou a coluna “Correio Feminino – Feira de Utilidades”, no jornal Correio da Manhã, com o pseudônimo Helen Palmer, e, como ghost writer, escreveu a coluna “Só para Mulheres”, do Diário da Noite.
A hora da estrela
“É uma obra que retrata a condição humana, que é sempre o que a Clarice fez, e em particular de uma nordestina sem lugar”, comenta sobre A Hora da Estrela o professor do Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários de Literaturas de Língua Portuguesa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP Ricardo Iannace. “A Clarice analisa com extrema profundidade essa dor e essa forma como a Macabéa se vê no mundo.”
Além da situação vivida pela protagonista do romance, Iannace acredita que a forma de narrar usada pela autora contribui para fazer de A Hora da Estrela uma obra-prima relevante até hoje. Clarice lança mão de um narrador, Rodrigo S. M., que se expõe ao leitor ao mesmo tempo em que conta a história da migrante.
“Essa forma mais próxima de o narrador trazer para nós, leitores, o conflito dele como produtor de um texto e o lugar que ele ocupa na sociedade. Ele a todo momento se questiona, afinal, é uma sociedade em que não há valorização do intelectual, não há valorização do escritor. E, ao mesmo tempo, há a necessidade de expôr aquela personagem, porque ela o incomoda. Essa tensão e essa veemência da Clarice, no modo de trazer à baila essa condição sempre periclitante da vida, acho que A Hora da Estrela é exemplar nesse sentido.”
Clarice para crianças
A homenagem à escritora contará com mesas temáticas e sessões de comunicação que abordarão múltiplas faces de Clarice. Recebe destaque sua produção dedicada ao público infantil.
“A Clarice sempre salientou que a escrita de obras para crianças aconteceu muito casualmente. Ela acabou escrevendo uma história para o filho e a partir daí escreveu as obras para crianças” explica Iannace.
Para o professor, autor de dois livros sobre a escritora – A Leitora Clarice Lispector, da Editora da USP (Edusp), e Retratos em Clarice Lispector: Literatura, Pintura e Fotografia, da Editora da Universidade Federal de Minas Gerais -, as obras infantis trazem o mesmo estilo que Clarice apresenta em seus outros textos.
“Temas que aparecem na obra adulta, como o universo dos animais e dos insetos, a morte, as tensões, conflitos humanos, tudo isso aparece nessa versão para crianças. A Clarice que escreve para crianças não tem um discurso ingênuo, não existe ausência de reflexão. E há, claro, uma habilidade que ela tem na obra adulta, com uma nova roupagem, no modo de contar. A capacidade que a Clarice tem, cativante, de seduzir o leitor.”
A programação abordará também a presença do insólito nos livros da autora, pelos olhares da estética e da psicanálise. Outra mesa enfocará sua relação com o jornalismo. Haverá ainda contação de histórias e performances.
O evento exibirá ainda dois filmes baseados em obras de Clarice, com a presença das diretoras: A Hora da Estrela (1985), de Suzana Amaral, e Ruído de Passos (1995), de Denise Gonçalves.
Clarice Lispector: Os Mistérios da Estrela acontece nos dias 22, 23 e 24 de novembro no Centro Universitário Maria Antonia (Ceuma) da USP (Rua Maria Antonia, 294, na Vila Buarque, em São Paulo). A programação completa está disponível em http://celp.fflch.usp.br/claricelispectorosmisteriosdaestrela. As inscrições já estão encerradas.
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