Faculdade de Direito da USP - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Projeto de apoio financeiro amplia potencial de universitários vindos de escolas públicas

Ex-formandos da Faculdade de Direito da USP investem em ajuda financeira e mentoria para que os estudantes com dificuldades socioeconômicas aproveitem todas as oportunidades oferecidas na Universidade

25/02/2021

Crisley Santana

Fundada alguns anos depois da independência do Brasil, em 1827, a Academia de Direito de São Paulo tornou-se o local ideal para a elite formar os futuros advogados e magistrados brasileiros. Ao tornar-se parte da USP, em 1934, a Faculdade de Direito (FD) permaneceu tendo essa função. Após 190 anos da criação da faculdade, o perfil de seus estudantes começou a mudar com as ações afirmativas implantadas pela Universidade, em 2017. Agora, no mesmo local onde se formaram 13 ex-presidentes do Brasil, há alunos que vieram de escolas públicas e aqueles autodeclarados pretos, pardos ou indígenas também do ensino público. A Universidade mais inclusiva trouxe variadas situações socioeconômicas.

Ainda que os cursos de graduação da USP sejam totalmente gratuitos, ou seja, sem pagamento de mensalidades ou matrículas, muitos estudantes não residem próximo às unidades da Universidade. Eles precisam de apoio com moradia, alimentação e transporte. E aí entra o Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE), oferecido pela Superintendência de Assistência Social (SAS) aos alunos com dificuldades socioeconômicas, seguindo alguns critérios.

Mas para além das necessidades básicas e para que os estudantes possam aproveitar todas as oportunidades oferecidas na USP, um grupo de ex-formandos da São Francisco — como também é conhecida a FD — se reuniu para criar o Projeto de Promoção à Dedicação Acadêmica (PPDA).

A ideia partiu da advogada Marcela Mattiuzzo e do procurador do Estado Caio Gentil Ribeiro, que, com recursos próprios e ajuda dos pais de Marcela, abriram o edital para o primeiro processo seletivo do programa, no fim de 2019.

Marcela Mattiuzzo

Além da bolsa financeira, o projeto conta com atividades de mentoria oferecidas por ex-alunos para os bolsistas. Cada um dos estudantes é orientado por dois mentores mensalmente sobre atividades acadêmicas, formas de organização e outros conselhos universitários. “A nossa razão de propor essa mentoria é que a faculdade tem muitas oportunidades e é difícil se situar dentro desse ambiente, então os ajudamos a não deixar de aproveitar a Universidade por falha de comunicação”, detalhou Caio Ribeiro.

Marcela Mattiuzzo e Caio Gentil Ribeiro, ex-alunos da Faculdade de Direito da USP, idealizadores do Projeto de Promoção à Dedicação Acadêmica - Fotos: Arquivo pessoal

Outro pilar do programa é o ensino da língua inglesa, essencial para a formação. A experiência, que se iniciou de maneira improvisada no ano passado, será permanente. Segundo Marcela, “praticamente todas as disciplinas da FD passam literatura em língua inglesa. Então é algo difícil para o aluno, porque ele se sente sem uma ferramenta que ele precisaria. A ideia do curso de inglês é ajudar a suprir essa lacuna”.

Este ano o projeto ampliou o oferecimento de bolsas para dez, além da nova categoria: a Bolsa de Pesquisa Diogo Sant’Ana, criada em homenagem ao ex-estudante da FD e também membro do projeto, falecido no fim do ano passado. Esse auxílio possui duas vagas e é focado em alunos veteranos, pretos, de baixa renda, que queiram realizar pesquisas na área de direito, superação da pobreza e desigualdades sociais.

Permanência e igualdade de oportunidades

Um dos estudantes que participam do projeto é André Cozer dos Santos, natural da cidade de João Neiva, no Espírito Santo. Ele sempre estudou em escolas públicas e só soube da possibilidade de estudar no Largo São Francisco — como é conhecida a Faculdade de Direito — em 2018, após prestar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) pela primeira vez. “Nunca tive o sonho de entrar na USP porque estar em uma universidade como ela parecia tão inalcançável que eu nem sonhava com isso. Vi que era uma possibilidade depois de me inscrever no Sisu e me classificar.”

Apesar da aprovação, André precisava concluir o último ano do ensino médio, então decidiu estudar mais no ano seguinte. Com o dinheiro que recebia do seu trabalho como violinista em casamentos, ele comprou o material necessário para se preparar, já que realizar um curso pré-vestibular estava fora de suas possibilidades. “Minha rotina era acordar, tomar café e estudar para o Enem. De tarde, eu ia para o Instituto Federal, à noite,  estudava mais um pouquinho para o Enem, também violino, e depois ia dormir. Era assim todos os dias.” Todo o esforço gerou a aprovação definitiva na Faculdade de Direito, em São Paulo. 

“Quando cheguei, meu pai iria me ajudar a pagar um lugar para morar e comer, mas ele ficou desempregado logo em seguida. Então  participei do processo seletivo da Casa do Estudante e passei. Foi o que me salvou”, relatou André, citando a moradia que acolhe alunos de baixa renda da faculdade, local no qual reside. 

Ele também foi selecionado para receber auxílios do PAPFE, oferecido pela SAS da USP, e a Bolsa PPE, oferecida pela FD a estudantes do primeiro ano. 

Passado o período de calouro, André desejava continuar aprimorando sua formação. Foi então que ficou sabendo do PPDA, voltado a alunos veteranos de baixa renda.

O projeto auxiliou André a participar de diversas atividades, como coordenar o Grupo de Estudos Étnico-Raciais do Quilombo Oxê, coordenado pela professora Eunice Prudente; dirigir a Casa do Estudante, resolvendo questões burocráticas, e se dedicar às disciplinas obrigatórias e optativas, além de estudar inglês e francês. 

André Cozer dos Santos, estudante da Faculdade de Direito da USP e participante do Projeto PPDA - Foto: Arquivo pessoal

“Vou começar a participar de um programa de intercâmbio entre universidades, além da iniciação científica e outro projeto de pesquisa. Tudo isso é fruto do ano passado”, destaca André. Este ano ele também irá concorrer à Bolsa Diogo Sant’ana para permanecer se dedicando à pesquisa.

André Cozer dos Santos

Página do projeto na internet - Foto: Reprodução/ppda.com.br

Este ano o projeto ampliou o oferecimento de bolsas para dez, além da nova categoria: a Bolsa de Pesquisa Diogo Sant’Ana, criada em homenagem ao ex-estudante da FD e também membro do projeto, falecido no fim do ano passado. Esse auxílio possui duas vagas e é focado em alunos veteranos, pretos, de baixa renda, que queiram realizar pesquisas na área de direito, superação da pobreza e desigualdades sociais.

Para ajudar o projeto, é possível realizar doações diretamente à conta bancária da Associação PPDA ou pela plataforma Benfeitoria

Mais informações: Site e página do Facebook.

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