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Foto: Agência Brasil
Centro de Estudos de Carbono da USP vai propor soluções inovadoras e sustentáveis para a agricultura brasileira
Recém-criado pela Universidade, o centro vai integrar propostas multidisciplinares para mitigar as mudanças climáticas e melhorar a qualidade de vida da população
“O objetivo do novo centro é prover soluções inovadoras e sustentáveis para que o Brasil continue produzindo alimentos, fibra e energia, mas com uma menor emissão de gases do efeito estufa e maior sequestro de carbono.” Essa frase é do professor Carlos Eduardo Cerri, coordenador do Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical (Ccarbon), um dos quatro novos centros criados no início de março pela Reitoria da USP. Os outros três são: Centro de Estudos e Tecnologias Convergentes para Oncologia de Precisão, Centro de Estudos Amazônia Sustentável e Centro de Agricultura Tropical Sustentável, todos com a proposta de trabalho interdisciplinar e transdisciplinar em temas relevantes para a sociedade.
O novo centro pretende desenvolver soluções e estratégias inovadoras em agricultura tropical sustentável, baseada em carbono, para mitigar as mudanças climáticas e melhorar os padrões e condições de vida, como está descrito no documento de criação do Ccarbon, que ficará sediado na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP em Piracicaba. Segundo o professor Cerri, o carbono tem função primordial no meio ambiente.
“Nossas atividades na agricultura e na indústria, mas, principalmente, a queima de combustível fóssil, em todos os setores, emitem gases de efeito estufa para a atmosfera, causando o que chamamos de aquecimento global”, explica. “Como se sabe, 70% das emissões globais desses gases são do setor de queima de combustível, da gasolina, do diesel e do carvão mineral. Globalmente falando, ainda, 20% vêm da agricultura, da pecuária e dos desmatamentos”, enumera. Para o professor, é preciso diminuir essa produção de carbono para a atmosfera, onde ele está em excesso, com maior sequestro de carbono para o solo, onde ficará na forma de matéria orgânica, com benefícios para as plantas e o meio ambiente.
Centro quer diminuir emissão de gases do efeito estufa que vem da agricultura - Foto: CC0 Creative Commons
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Ainda segundo o documento, o desafio para os próximos anos será fazer face ao aumento da frequência de eventos climáticos extremos, como secas, cheias e outras adversidades naturais face à baixa resiliência dos sistemas naturais e agrícolas, ao mesmo tempo que se promove a transição para novas tecnologias agrícolas e processos de produção. Como está descrito, esse novo sistema agrícola deve ser pautado na descarbonização, baseado na economia circular, e visar a reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e o descarte de resíduos; aumentar o sequestro de carbono (C); desenvolver novas culturas com maior biomassa e rendimento e mais resilientes às adversidades naturais; e melhorar as condições de vida do ser humano em termos de comunidades social e culturalmente diversas.
Como vai funcionar o Ccarbon
“Esse centro vai promover novas técnicas para ajudar na sustentabilidade, e essa é a palavra-chave”, afirma o professor, acrescentando que a sustentabilidade está focada em três pilares: social, econômico e ambiental. “Sustentabilidade econômica porque o produtor não depende de um único produto, o que impacta na vertente social, dando melhores condições de vida, e na vertente ambiental, com menor emissão de gases e maior sequestro de carbono”, reitera.
Para propor novas soluções, o Ccarbon vai contar, segundo Cerri, especialmente com pesquisadores brasileiros. “É um orgulho dizer que a grande parte dos pesquisadores é nacional porque já temos um nível avançado de tecnologia e conhecimento”, afirma, lembrando que sempre há espaço para avançar mais. Com um planejamento para os próximos cinco anos, o centro foi criado pensando a longo prazo. “Já temos um plano e atividades organizadas, mas à medida que os desafios e as tecnologias mudam, vamos reorganizando o nosso planejamento.”
O Ccarbon tem 12 linhas de pesquisa bem estruturadas, que vão cobrir cinco programas principais: Solo, Planta, Animal, Atmosfera e Ferramentas Digitais. Sua missão é ser reconhecido como um centro de classe mundial, líder em sistemas agrícolas tropicais de baixo C e qualificação de recursos humanos por meio de três frentes: pesquisa, inovação e difusão do conhecimento, como enumera Cerri. Entre as várias técnicas de pesquisa, estão atributos físicos, químicos e biológicos de solos associados à dinâmica do carbono; restauração ecológica, agricultura digital, balanço energético, melhoramento molecular de plantas integrando as tecnologias ômicas; saúde do solo, indexação de serviços ecossistêmicos; análise do impacto socioeconômico nas escalas local, regional e global; e desenvolvimento de técnicas ecologicamente corretas para substituir a tecnologia existente para extrair e fracionar os principais componentes dos alimentos e compostos bioativos. Além disso, o centro vai fornecer avaliações precisas, não apenas do solo e do sequestro biológico de carbono, mas também das emissões de GEE, e também informações relevantes sobre o orçamento de carbono nos trópicos.
Como estabelece o documento, o Ccarbon terá componentes multidisciplinares, incluindo solo, colheita, alimentos, ciências ambientais, biossistemas, melhoramento molecular e biotecnologia, engenharia, climatologia, geologia, economia, geografia, ciências sociais, governança e políticas públicas, e comunicação, interagindo principalmente com o Centro de Pesquisas para Inovação em Gás, também localizado na USP. O centro de pesquisa de classe mundial identificará os principais desafios e implementará soluções para aumentar a produção agroalimentar sustentável dos Sistemas Agrícolas Tropicais (com foco em culturas anuais, ou seja, soja, milho, algodão, culturas de cobertura, cana-de-açúcar, pastagens, além dos sistemas integrados, já citados pelo professor) por meio de práticas de gestão climaticamente inteligentes.
Para descarbonizar a agricultura
Já existem tecnologias que são utilizadas na agricultura, na pecuária e na silvicultura para que se continue produzindo esses bens, porém com menor emissão de gases, garante o professor. Ele cita práticas de manejo, como o plantio direto, informando que o Brasil é líder dessa tecnologia. Como ele diz, o plantio direto é uma técnica em que não se perturba o solo, ou seja, não se usa implementos ou se revolve o solo intensamente. O professor exemplifica: “Quando se usa o arado revolvendo o solo, acabamos transformando aquele carbono que estava trazendo benefícios para o solo, e levando ele de volta à atmosfera, onde piora o problema do efeito estufa”.
O professor dá outro exemplo: os sistemas integrados de produção, como lavoura-pecuária-floresta, onde essas três formas de produção são concomitantes. “Numa mesma área, se tem uma floresta plantada, diferente de uma floresta de conservação, em que se pode usar, por exemplo, o eucalipto para a indústria, o pasto para o gado, que vai se beneficiar da sombra da floresta, e uma plantação de milho, por exemplo, que além de servir para colheita, pode ter suas espigas como alimento para o gado.” Com isso, garante, se resolve um outro problema: o produtor terá uma diversidade maior de produtos, não dependendo do valor das commodities de uma única produção.
Como destaca o coordenador, é preciso conciliar a crescente demanda por alimentos, fibra e energia com sustentabilidade, ambiental, econômica e social. Segundo ele, a disseminação do conhecimento vai para além da publicação de artigos científicos, buscando a interlocução com tomadores de decisão, seja na escala municipal, estadual ou federal, para a criação de políticas públicas que vão garantir a adoção de medidas necessárias para que “possamos emitir menos gases para a atmosfera e sequestrar mais carbono”, melhorando assim a vida da população brasileira.
Dados estatísticos sobre as mudanças climáticas
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, 2021) relatou um aumento de 1,53ºC na temperatura do ar na superfície terrestre, segundo dados reunidos no documento do Ccarbon. Esse aquecimento resultou em um aumento na frequência, intensidade e duração dos eventos relacionados ao calor, incluindo ondas de calor na maioria dos ecossistemas terrestres, ou seja, a frequência e intensidade das secas aumentaram em algumas regiões, e houve um aumento na intensidade de eventos de chuvas fortes em larga escala (IPCC, 2021). É inequívoco que a ação humana tem aquecido a atmosfera, oceano e terra, devido ao aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) provenientes de atividades antrópicas; reconhecidamente a principal causa do aquecimento global (IPCC, 2021).
“Enquanto na perspectiva global a queima de combustíveis fósseis é responsável por cerca de ⅔ das emissões de GEE, no Brasil, o uso da terra e a agricultura são os maiores emissores”, relata o documento. Segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG, 2020), uma iniciativa do Observatório do Clima, o uso da terra (93% da atividade de desmatamento) foi responsável por 46% das emissões brasileiras de GEE em 2020, enquanto a agricultura foi responsável por 27% das emissões nacionais de GEE – no setor agrícola, 65% vieram de fermentação entérica e 29% de solos agrícolas (relacionados ao uso de fertilizantes nitrogenados, operações de preparo do solo e resíduos de culturas).
Embora o Brasil seja um dos maiores produtores e exportadores mundiais de alimentos, fibras e energia, as estimativas indicam que o País precisará aumentar sua produção de alimentos em 40% para atender à demanda global até 2050, como destaca o documento, revelando que os efeitos das mudanças climáticas podem diminuir as áreas aptas para o cultivo e a produtividade das lavouras, ameaçando a segurança alimentar do Brasil e o alcance da meta de auxiliar na alimentação da crescente população mundial.
Nesse contexto, o Brasil (juntamente com mais de 190 países) aderiu ao Acordo de Paris em 2015, e apresentou suas intenções de redução de emissões à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), denominada iNDC – Contribuições Nacionalmente Determinadas Pretendidas, que foram ratificadas em 2016 pela UNFCCC, então chamada exclusivamente de NDC (Contribuição Nacional Determinada). A NDC brasileira é reduzir as emissões em 37% e 43% até 2025 e 2030, respectivamente, em relação às emissões de 2005 (Brasil, 2015).
Além disso, conforme relata o documento, em 2021, o Brasil foi um dos signatários do Pacto Climático de Glasgow, atualizando sua NDC para reduzir as emissões nacionais em 50% até 2030. “Para atingir essa meta, o Brasil estabeleceu uma série de ações, entre as quais zerar o desmatamento ilegal por 2028 (Declaração dos Líderes de Glasgow sobre Florestas e Uso da Terra), restaurar 18 milhões de hectares de florestas, recuperar 30 milhões de hectares de pastagens degradadas, reduzir 30% das emissões de metano (Global Methane Pledge) e aumentar a participação de energias renováveis (incluindo expansão do consumo de etanol) para 45-50% na matriz energética nacional até 2030. Para apoiar essas ações, o Brasil fortaleceu o Plano de Adaptação e Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC+) que incentiva e apoia práticas e/ou baixas emissões resilientes – agricultura de carbono, e também criar a Política Brasileira de Biocombustíveis (RenovaBio) para promover a expansão adequada da produção e uso de biocombustíveis na matriz energética brasileira. Adicionalmente, o Estado de São Paulo assumiu compromissos com a Corrida ao Zero (Plano de Ação Climática do Estado de São Paulo – Net Zero 2050), que exigirá a proposição e implementação de diversas iniciativas no território e no exterior.”
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