O Senado Federal aprovou, na última quarta-feira (27/09), por 43 votos a 21, o Projeto de Lei (PL) do Marco Temporal para a demarcação de terras indígenas — decisão que vai contra o posicionamento marcado pelo STF, que havia avaliado o projeto como inconstitucional na quinta passada (21).
Pedro Luiz Côrtes, professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP, explica que o Marco Temporal é uma tese jurídica que avalia que diferentes povos indígenas só poderiam ter as suas terras demarcadas caso estas já estivessem sob sua posse ou sendo disputadas até o dia 5 de outubro de 1988 — data de promulgação da Constituição Federal.
Ramificações
As questões que envolvem esse debate se ampliam para outras discussões, uma vez que, por exemplo, nem todos os povos tinham uma documentação de permanência em suas terras de forma burocrática. Além disso, muitos deles são nômades — se deslocando por diferentes regiões e, durante muito tempo, a atuação dos militares fazia o remanejamento de aldeias para a construção de rodovias e outras obras.
Assim, é possível observar que existe uma dinâmica complexa, que precisa ser considerada para a demarcação de terras. Apesar desses pontos, nota-se que a Frente Parlamentar Agropecuária vem marcando uma posição ao redor dessa discussão. “Embora seja uma tese que certamente será vetada pela presidência da República, eles fizeram questão de aprovar. Ela vai ser rejeitada não só por uma questão conceitual, mas também porque não é possível mudar o entendimento do Plenário e do Supremo por meio de um Projeto de Lei”, explica Côrtes.
Atualmente, também existem alguns senadores que estão articulando uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que poderia ser utilizada para que o Marco Temporal prevalecesse. Portella também avalia que o texto do Marco Temporal aprovado pelo Senado foi considerado turbinado, já que, além da tese da data, também prevê a retomada de terras em caso de mudanças culturais e a plantação de transgênicos nas áreas demarcadas.
Proteção ambiental
Um ponto central para esse debate concentra-se também no fato de que os territórios indígenas são as áreas mais preservadas no bioma amazônico — fator que enfatiza a necessidade de demarcação e preservação dessas terras. O professor também reflete que há uma tese errônea, que foi criada durante a gestão do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, de que os territórios indígenas seriam repositórios muito ricos de bens minerais, mas não há estudos geológicos que corroborem essas informações.
As grandes empresas de mineração também não teriam interesse em atuar nesses territórios, já que há uma latente preocupação com a imagem que será transmitida para fora do País. “Às vezes, se uma empresa for acusada de entrar em territórios indígenas, isso poderá prejudicar muito o comércio de seus produtos para o exterior”, adiciona Côrtes.
Apesar de ter marcado uma posição que avalia a inconstitucionalidade do projeto, é também possível observar que o STF vem tentando remediar os diferentes conflitos da discussão. “Eu sinceramente não vejo a necessidade do Supremo de descer a essas especificidades, porque, na verdade, nós já temos um arcabouço legal que vem dando conta da demarcação dos territórios indígenas e do ressarcimentos dos agricultores que ocupam essas áreas”, avalia o professor.
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