Em agosto, a Exchange Bitfinex – uma plataforma digital que permite que usuários comprem e vendam uma extensa variedade de criptomoedas – relatou uma saída de capital no valor de US$ 55 bilhões. Essa é uma empresa consideravelmente relevante por negociar um volume elevado de ativos e por sua trajetória, já que atua no mercado desde 2012 em operações dessa natureza. Mas como uma drenagem bilionária como essa impacta os investidores, o mercado digital e o tradicional?
Drenagem bilionária de recursos
Segundo Leandro dos Santos Maciel, professor de Finanças da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP, essa drenagem bilionária de capital significa que, naquele mês, a oferta de criptomoedas superou a demanda – ou seja, os agentes que operam esses ativos estavam interessados em vender suas criptomoedas. “Como há uma pressão de oferta, naturalmente os preços caem como resposta, ocasionando desvalorizações, e assim drenando os recursos desse mercado”, pontua.
Essa grande saída não afetou apenas o bitcoin, uma criptomoeda descentralizada, também impactou a liquidez do ether, uma criptomoeda criada pela plataforma Ethereum, e das stable coins, ativos conhecidos como moedas estáveis. De acordo com Maciel, esse movimento mostra que os operadores não apresentam boas expectativas quanto ao movimento futuro do preço das criptomoedas e por isso não desejam mais manter os ativos nas carteiras.
Influência no mercado tradicional
O mercado de criptomoedas possui algumas particularidades em relação ao mercado tradicional de investimentos. Entretanto, grandes saídas de capital, como a divulgada pelo relatório da Bitfinex, podem impactar direta e indiretamente o mercado tradicional e seus investidores. De acordo com Maciel, uma das possíveis consequências dessa drenagem é um aumento na variação de preços nos mercados financeiros. Grandes movimentos podem criar volatilidade no mercado tradicional de investimento. “Os investidores que têm posições em criptomoedas também têm exposições em ativos tradicionais. Então, quando há uma desvalorização no mercado de criptomoedas, esses investidores podem reagir vendendo seus ativos tanto em ações quanto em criptomoedas”, aponta. Essa reação dos investidores acontece para compensar perdas nos mercados ou para possibilitar que eles invistam em outras áreas.
Outra consequência dessa movimentação é um refúgio dos investidores em ativos de menor risco. Quando há uma incerteza no mercado de criptomoedas, os operadores podem buscar ativos tradicionais considerados mais seguros, como aplicações em ouro e títulos do governo, por exemplo. Essa realocação, como explica Maciel, gera um impacto de aumento nos preços, já que mais pessoas passam a buscá-lo.
A “psicologia do mercado” também pode ser afetada pela drenagem de capital. Como a denominação expõe, as mudanças nos preços das criptomoedas podem afetar a psicologia dos investidores. “Se há um aumento significativo nos preços, isso pode criar um sentimento de euforia, ou seja, os agentes buscarem mais aplicações em criptomoedas”, pontua Maciel. O contrário também é válido: quedas acentuadas nos valores provocam maior aversão ao risco, e esse sentimento pode se espalhar para outros ativos.
A diversificação dos ativos é outro ponto consequente dessa movimentação. Muitos investidores possuem carteiras diversificadas – em criptomoedas e ativos tradicionais, por exemplo. Quando há uma movimentação significativa, os operadores podem desejar repensar seus investimentos, para evitar perdas financeiras, o que afeta a locação dos seus recursos de ativos.
O Brasil e ativos digitais
O Brasil verificou um crescimento significativo de investidores em criptomoedas. De acordo com dados divulgados pela Receita Federal, em setembro de 2023, 4,1 milhões de pessoas físicas alegaram operações com ativos digitais em julho do mesmo ano. Esse número é 22 vezes maior que o valor registrado em agosto de 2019, ano em que o órgão começou a contabilizar esse tipo de operação.
O número de investimentos realizados por pessoas jurídicas também alcançou recordes: cerca de 92 mil, registrados em julho de 2023. No Brasil, o bitcoin ainda lidera em relação ao número de operações, o que pode ser explicado tanto pelo crescimento dos investidores quanto pela implementação dessa moeda digital em operações e pagamentos.
Investimento em criptomoedas
O mercado de criptomoedas é marcado pela alta volatilidade de preços, e por isso investimentos nesse ativo podem ser considerados de alto risco. Essa volatilidade, segundo o professor, é decorrente de uma série de fatores, como notícias, eventos econômicos, mudanças na tecnologia e na regulamentação desses mercados, por exemplo.
É importante que os operadores em potencial tenham em mente quais são os riscos associados a esse tipo de investimento e quais são os ganhos e perdas envolvidos nas transações.
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
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